A Câmara dos Deputados vai abrir, nos próximos dias, os debates sobre os vetos da presidente Dilma Rousseff, ao projeto aprovado pelo Senado, que regulamenta a profissão do médico no Brasil. A proposta, que tramitou por mais de uma década na Casa, é polêmica porque estabelece como atividades privativas do médico a formulação do diagnóstico das doenças e a prescrição terapêutica.
O Ato Médico, como ficou conhecida a proposta, “impediria a continuidade de inúmeros programas do SUS que funcionam a partir da atuação integrada dos profissionais de saúde (…) Poderia comprometer as políticas públicas da área da saúde, além de introduzir elevado risco de judicialização da matéria”, disse a presidente Dilma, na justificativa dos vetos.
“Se for para manter o projeto mandado pelo Senado, o melhor a fazer é mudar toda a grade superior de Medicina”, avalia o deputado federal João Arruda, que na última semana estudou o Ato Médico com representantes dos conselhos de Fonoaudiologia, Psicologia e Fisioterapia. “Se derrubar os vetos da presidente Dilma, teremos que criar cursos para médicos com especializações em todas as áreas”.
João Arruda disse que irá levar a questão para debater com a bancada do PMDB. “Sei que existem muitos interesses, mas o momento é de garantir a continuidade do trabalho dos profissionais da saúde”, frisou o deputado. E completou: “Vou defender a valorização destes profissionais, que são fundamentais para agilizar o atendimento daquelas pessoas que dependem do SUS”.
Interpretação dúbia
A questão, segundo o presidente do Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (Crefito), Abdo Augusto Zeghbi, é que a proposta regulamenta o exercício da medicina, “mas não deixa claro que a competência do médico deve se limitar somente à sua área de atuação”, disse.
E completa: “A gente acredita que ele [médico] não pode fornecer prescrição terapêutica em áreas nas quais não possui habilitação, o que pode prejudicar o acesso da população à saúde”.
De acordo com Isabela Álvares dos Santos, conselheira efetiva do Crefito, se a Câmara derrubar os vetos do Ato Médico, vai acabar “com a saúde da população. Vai ficar terrível. Os médicos poderão se intrometer nas outras profissões e isto vai atravancar (o SUS)”.
“Para que a população consiga ir, em algum profissional, vai ter que passar pelo médico se o médico achar que é preciso. Vai ser mais moroso, porque a gente já não tem médico”, completou. Na avaliação de Isabela, se manter o Ato Médico como aprovado no Senado, o paciente será o maior prejudicado, “porque ficará restrito neste atendimento”.
Principais vetos ao projeto do Ato Médico
– São atividades privativas do médico: formulação do diagnóstico nosológico [referente à classificação das doenças] e respectiva prescrição terapêutica; indicação do uso de órteses e próteses, exceto as órteses de uso temporário; e prescrição de órteses e próteses oftalmológicas (Art. 4º, incisos 8 e 9)
– Não são privativos do médico os diagnósticos funcional, cinésio-funcional, psicológico, nutricional e ambiental, e as avaliações comportamental e das capacidades mental, sensorial e perceptocognitiva ( Art. 4º, parág. 2º)
– Procedimentos invasivos, para os efeitos da Lei, incluem: invasão da epiderme e derme com o uso de produtos químicos ou abrasivos; e invasão da pele atingindo o tecido subcutâneo para injeção, sucção, punção, insuflação, drenagem, instilação ou enxertia, com ou sem o uso de agentes químicos ou físicos (Art. 4º, parág. 4º)
– Excetuam-se do rol de atividades privativas do médico: aplicação de injeções subcutâneas, intradérmicas, intramusculares e intravenosas, de acordo com a prescrição médica; cateterização nasofaringeana, orotraqueal, esofágica, gástrica, enteral, anal, vesical e venosa periférica, de acordo com a prescrição médica; e punções venosa e arterial periféricas, de acordo com a prescrição médica (Art. 4º, parág. 5º)
– São privativos de médico: direção e chefia de serviços médicos (Art. 5º, inciso 1º)