Numa decisão capaz de trazer importantes consequências para o futuro das delações premiadas, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, determinou a revisão do acordo que beneficiava um publicitário do Rio de Janeiro, suspeito de irregularidades na campanha do governador Luiz Fernando Pezão em 2014.
O marqueteiro Renato Pereira obtivera da Procuradoria-Geral da República diversas vantagens, em troca das revelações feitas sobre o esquema de que participou.
Para o ministro, não se justificaria deixar de lado sete dos oito casos delituosos em que estava envolvido o colaborador, assim como prever condições especiais no cumprimento da pena de quatro anos que lhe restasse a cumprir.
A medida de Lewandowski reflete as polêmicas surgidas no STF, quando se discutiu a validade do acordo que, com aberrante generosidade, beneficiou os irmãos Joesley e Wesley Batista, da JBS.
Do ponto de vista teórico, duas teses se confrontaram, com bons argumentos, no interior da corte.
Não há como admitir, ponderava parte dos ministros, que o Ministério Público detenha a última palavra sobre a sorte de um acusado. A instituição deixaria de ser a parte acusadora para se tornar juiz, estipulando penas e garantindo liberdades, sem que um magistrado pudesse alterar o decidido.
Para a outra corrente de opinião, alterar os termos de um acordo abalaria a própria credibilidade do Estado. Como assegurar o auxílio dos colaboradores, se estes não têm certeza de obter os benefícios prometidos?
Em tese, pode-se considerar que o Ministério Público decide somente quanto a solicitar ou não à Justiça penas contra um suspeito.
Foi este o caso, aliás, do acordo com Renato Pereira, no qual a Procuradoria não extrapolou seu papel para “perdoar” o acusado; comprometeu-se, apenas, a propô-lo nas próximas etapas do processo, cabendo como sempre ao juiz decidir sobre sua aceitação.
Na prática, todavia, o risco de impunidade e acertos generosos em excesso subsiste —e a correta dosagem das vantagens oferecidas só poderia ser avaliada caso se auditassem todas as idas e vindas de uma longa negociação.
Do uso ao abuso, as fronteiras são incertas. Uma atitude mais ativa e rigorosa do magistrado no momento da homologação —afastando-se o risco de confundi-la com uma chancela automática— é de todo modo justificável.
Só na prática será possível verificar se, com isso e com as inseguranças que decorrem das visões distintas em curso no Supremo Tribunal Federal, o estímulo à colaboração sofrerá real arrefecimento.
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