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Umberto Eco (1932/2016)

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Maria Helena Rubinato Rodrigues de Souza

Perdemos ontem, 19 de fevereiro, o maior escritor dos últimos cinquenta anos. Exagero? Pode até ser, mas, em minha opinião, Umberto Eco foi o mais completo intelectual a se valer da palavra escrita desde 1962.

Eco foi talvez o último dos polímatas – um estudioso cuja produção intelectual aborda diversos campos do conhecimento.

O raio de alcance de seus interesses e investigações abrangia desde a semiótica à filosofia medieval passando pela lógica matemática, filosofia da linguagem, indústria cultural, simbolismo francês, literatura de folhetim, etc.

No âmbito dos últimos 100 ou 150 anos talvez só Paul Valery tenha abordado uma gama tão ampla de campos de saber em sua obra.

É impressionante notar que Eco se caracterizava não só pela solidez de sua erudição como pela abordagem criativa que o caracterizou em todas as esferas.

No campo da semiótica é notável a sua classificação que divide os intelectuais entre apocalípticos e integrados no que tange a cultura de massas e a indústria de entretenimento.

Apocalípticos seriam aqueles que reagem de forma negativa à própria massificação da cultura considerando-a empobrecedora e alienante; ao passo que os integrados colhem e celebram o caráter democrático da indústria cultural como difusora de conhecimento e matriz de novas possibilidades de expressão.

Outro de seus conceitos que exerceria grande influência, sobretudo no campo da semiótica e dos estudos literários, é a noção de ‘Obra Aberta’, que se caracteriza pelo seu caráter polifênico e polifônico, tanto em termos de estrutura formal quanto de conteúdo. Assim sendo, não existiria mais a ditadura do autor como único porta-voz legítimo de sua obra, como único intérprete válido já que a mesma comporta as diversas interpretações que seus leitores lhe possam atribuir.

Os romances de Eco encarnam esse conceito, pois são passíveis de múltiplos níveis de leitura e exegese.

Suas duas obras mais conhecidas no âmbito da literatura de ficção são ‘O Nome da Rosa’ e ‘O Pêndulo de Foucault’.

O autor acreditava que ‘O Nome da Rosa’ interessaria apenas a meia dúzia de cardeais da Cúria Romana ou a dois ou três medievalistas. Enganou-se: o livro foi um dos maiores sucessos de bilheteria que se conhece.

O arco de questões abrangido nele é realmente impressionante. Envolvendo desde tópicos capitais da filosofia, como a Questão dos Universais, até a controvérsia entre teólogos imperiais e papistas sobre a natureza do poder secular e do poder espiritual, tudo isso sob uma amálgama de gêneros onde se mesclam o romance policial, o romance gótico e a ficção histórica, ‘O Nome da Rosa’ é leitura apaixonante.

Em ‘O Pêndulo de Foucault’ temos uma imensa e tortuosa paródia sobre os desígnios ocultos das sociedades secretas ao longo da História. É um jogo fascinante onde Eco se vale de uma série de teorias conspiratórias sobre a influência de tais cenáculos na cultura e na política do mundo ocidental.

A grande ironia do ‘O Pêndulo de Foucault’ é a conclusão um tanto ou quanto patética de que no fundo nada há por trás de uma grande conspiração: seria, ao fim e ao cabo, uma espécie de mecanismo vazio e sem sentido a girar em torno de seu eixo.

No ano passado Eco lançou ‘Numero Zero’. A história se passa em 1992 e gira em torno de um ghostwriter que se envolve com o submundo da política e das conspirações de assassinatos, onde sugere que Mussolini não morreu em 1945, mas viveu nas sombras por décadas. É uma pequena novela que muitos podem interpretar como mera diversão se comparada com suas outras obras de cunho épico, mas é plena de energia e ideias.

Umberto Eco foi um pensador como poucos e creio que o mundo vai demorar muito a ver outro igual.

Foto: Roberto Serra/Iguana Press