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UMA VISÃO DE ESQUERDA SOBRE A CRISE FINANCEIRA

O blog Boca Maldita publica uma análise da crise financeira divulgada pela Attac (Associação pela Tributação das Transações Financeiras para Ajuda aos Cidadãos), uma entidade criada na França e que hoje se espalha pelos principais países do mundo, inclusive no Brasil.

A Attac possui, nos diversos países, grupos dos mais destacados economistas de esquerda que analisam a economia e propõem alternativas ao pensamento único neoliberal, com base na solidariedade. A entidade é uma das principais organizadoras do Fórum Social Mundial, contraponto à cúpula de Davos, que realizará sua edição 2009  a partir do dia 27 de janeiro próximo em Belém, no Pará.

O encontro prevê a participação de mais de 80 mil participantes do mundo inteiro. Confira a íntegra da análise sobre a crise financeira clicando no

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Uma visão de esquerda sobre a crise financeira

Uma visão de esquerda sobre a crise financeira

O blog Boca Maldita publica uma análise da crise financeira divulgada pela Attac (Associação pela Tributação das Transações Financeiras para Ajuda aos Cidadãos), uma entidade criada na França e que hoje se espalha pelos principais países do mundo, inclusive no Brasil.

A Attac possui, nos diversos países, grupos dos mais destacados economistas de esquerda que analisam a economia e propõem alternativas ao pensamento único neoliberal, com base na solidariedade. A entidade é uma das principais organizadoras do Fórum Social Mundial, contraponto à cúpula de Davos, que realizará sua edição 2009  a partir do dia 27 de janeiro próximo em Belém, no Pará. O encontro prevê a participação de mais de 80 mil participantes do mundo inteiro.

Chegou a hora: Vamos sair da economia cassino

Artigo publicado em www.attac.org

Declaração comum das Attac da Europa sobre a crise financeira e as alternativas democráticas.

“É preciso desarmar os mercados.” Quando a Attac foi fundada, em 1998, este slogan se destacava tendo como pano de fundo a quebra financeira no continente asiático. Depois, vivemos outras crises provocadas pelos mercados financeiros: na Rússia, no Brasil, na Turquia, na Argentina, o estouro da bolha da “nova economia” em 2001.

O mundo rico está no meio da crise mais grave desde a Grande Depressão de 1929. A quebradeira de Wall Street, em setembro de 2008, marca o fim de uma era: o sistema do capitalismo financeiro, um sistema movido pela busca do lucro máximo, desmoronou. Destruiu-se movido por suas próprias contradições. As ondas de choque estão atingindo a economia real. Os Estados Unidos entraram em recessão, seguidos pela União Européia. No final das contas, é a economia mundial que sofrerá as conseqüências.

A contração da atividade econômica vai ocasionar mais desemprego e desigualdade. Novas pressões serão feitas sobre os assalariados para que aceitem mais “flexibilidade no mercado de trabalho”, uma diminuição dos salários e da previdência social. A diminuição da demanda global proveniente dos países ricos terá repercussões sobre as economias vulneráveis dos países em desenvolvimento e aumentará a pobreza. Os Objetivos do Milênio, assim como os objetivos de um desenvolvimento planetário que seja durável e respeite as condições sociais e a proteção do ambiente, tornam-se impossíveis de atingir.

Crise financeira e recessão coincidem com variações brutais do preço do petróleo e dos alimentos, que levaram a uma grave crise social e ao crescimento da fome em vários países do Sul. As variações de preços das matérias-primas e dos alimentos têm diversas causas. Mas outra vez, como nas diferentes crises financeiras, a especulação dos fundos de investimento e de outros investidores institucionais contribuiu amplamente para a instabilidade dos preços.

O detonador da crise foram os empréstimos hipotecários excessivos consentidos para a aquisição de casas em situação precária nos Estados Unidos e processos facilitadores que permitiram vender esses créditos duvidosos a instituições financeiras e a grupos familiares, nos Estados Unidos e em outras partes do mundo. A onda de inadimplência teve conseqüências dramáticas para as instituições financeiras (bancos de negócios e de investimento, hedge funds (fundos privados de investimento), e agora os grandes bancos tradicionais). Também o setor não financeiro é afetado. A perspectiva econômica, social e ambiental para 2009 é sombria para a maior parte do planeta.

Não foi por falta de aviso. Infelizmente, a quebra financeira confirma as previsões de economistas heterodoxos como o prêmio Nobel Joseph Stiglitz, a Attac, os movimentos sociais e outras vozes críticas. Mesmo os altos dirigentes políticos e econômicos sabiam que o sistema estava à beira da falência, mas faltava a eles vontade de agir por causa da crença dominante nas capacidades auto-reguladoras do mercado.

Hoje, sob a pressão da crise, até a comunidade financeira reclama reformas. Mas as reformas propostas não vão muito longe, pois não atacam os problemas sistêmicos que explicam a crise. Restringem-se, sobretudo, ao setor financeiro e visam a estabilidade. Não é suficiente. O capitalismo financeiro também tem conseqüências desastrosas na distribuição da riqueza e na democracia.

Quando os banqueiros pedem a intervenção do Estado, querem socializar as perdas e colocar os ganhos em seus próprios bolsos. A operação de salvamento realizada pelo governo dos Estados Unidos com a disponibilização de 700 bilhões de dólares (a maior até hoje), as intervenções no Reino Unido, na Alemanha e em outros países europeus resultam dessa lógica. Quando a comunidade financeira fala em reforma, trata-se no máximo de uma (re)regulamentação pontual e de gestão de crise a curto prazo, só para salvar o neoliberalismo e voltar aos bons (para eles) velhos hábitos assim que o perigo passar.

Hoje precisamos, no interesse da grande maioria da população, de mudanças verdadeiras que adotem outro paradigma, em que as finanças sejam um instrumento a serviço da justiça social, da estabilidade econômica e do desenvolvimento durável. Não devemos aceitar a volta ao statu quo nos próximos anos.

A crise não é resultado de uma coincidência infeliz de circunstâncias, assim como não pode ser reduzida a alguma falha do sistema de controle, das agências de notação ou a erros de agentes individuais. Suas raízes são sistêmicas e, portanto, a estrutura e os mecanismos do próprio sistema é que estão em xeque.

Os mercados financeiros representam o centro e o motor da globalização neoliberal. A dominação do setor financeiro sobre a economia real teve início com a introdução de taxas de câmbio flutuantes entre as principais divisas em 1973, ao mesmo tempo que foi abolido todo controle sobre os movimentos de capitais e foram liberalizados e desregulamentados os mercados financeiros, incluindo empresas de auditoria supostamente independentes, mas na realidade diretamente sujeitas à pressão do setor financeiro.

Em seguida, as instituições financeiras e os mecanismos que elas estabeleceram tiveram uma expansão rápida; a massa dos ativos financeiros, as inadimplências e a busca de lucros se desenvolvem em conjunto. É importante ter em conta a aceleração violenta desse processo depois de 2001, quando a economia dos Estados Unidos se restabelecia da crise das novas tecnologias, em especial do aumento espetacular da dívida interna dos Estados Unidos (sobretudo da inadimplência dos grupos familiares) e de seu déficit externo, financiado pelo resto do mundo.

Essas tendências combinadas levaram ao desenvolvimento de um novo modelo econômico, uma nova forma de capitalismo, que alguns chamam globalização, outros capitalismo financeiro e outros ainda capitalismo acionário. Pouco importa o nome, um fato é evidente: quando, antes, os mercados financeiros tinham um papel subordinado à economia real, essa relação foi invertida.

A prioridade dada aos “juros financeiros” sobre a economia “real” faz com que todas as atividades econômicas sirvam para criar lucros nos mercados financeiros e instrumentos financeiros sejam inventados para dar lucros apenas aos mercados financeiros, sem se preocupar em preservar uma produção e uma agricultura duráveis nem dar a menor importância à poupança dos clientes “normais”. A lógica e a dinâmica de maximização dos lucros imediatos penetram em todos os poros da vida econômica e social.

A mobilidade perfeita do capital financeiro, resultado das políticas neoliberais, desempenha um papel crucial na economia mundial atual. Cria uma concorrência planetária não só entre empresas multinacionais, mas entre Estados, entre seus sistemas sociais e fiscais, e entre os trabalhadores de diferentes partes do mundo. Ao criar uma relação de poder favorável aos patrões e desfavorável aos trabalhadores, essa dominação do capital causou desigualdades cada vez maiores, uma diminuição das normas sociais e ambientais assim como das condições de trabalho, e a privatização dos bens fundamentais e dos serviços públicos.

Em suma, a “liberdade” dos agentes financeiros se ampliou em detrimento da grande maioria das pessoas e desenvolveu atividades econômicas que deterioram o ambiente. O fracasso desse modelo nunca foi tão evidente quanto hoje, como demonstram a crise de alimentos, a crise de energia e as mudanças climáticas. Esse modelo, que recebeu a adesão dos governos do mundo inteiro, está totalmente desacreditado. É preciso, portanto, tirar as conseqüências desse fato para que os dirigentes políticos e econômicos invertam completamente esse sistema financeiro injusto e incompatível com um desenvolvimento durável, para colocar a economia a serviço da igualdade de direitos, do desenvolvimento durável e das necessidades da população.

Uma oportunidade histórica surgiu. Da pressão da opinião pública dependerá a sua transformação numa política radicalmente diferente.

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Tradução de Casemiro Linarth