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Um fôlego para as Santas Casas

Medida Provisória tira rede filantrópica da sala de emergências

Editorial, Estadão

Um passo importante foi dado para pelo menos aliviar as graves dificuldades enfrentadas pelas Santas Casas e os hospitais filantrópicos – que desempenham papel fundamental na rede pública de saúde – com a Medida Provisória (MP) assinada quinta-feira passada pelo presidente Michel Temer, autorizando o uso de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para operações de crédito a essas entidades, a juros mais baixos que os do mercado. Essa está longe de ser a solução do problema, mas serve, como disse o presidente, para “tirar a rede filantrópica da sala de emergência”.

Essa rede poderá utilizar 5% dos recursos do FGTS. Como em 2018 tais recursos chegam a R$ 83 bilhões, as Santas Casas e os hospitais filantrópicos devem ter à disposição, em média, R$ 4 bilhões por ano, segundo estima o ministro da Saúde, Gilberto Occhi.

Hoje, explica ele, as taxas de juros do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) – das mais baixas que eles pagam – estão em torno de 18%. A linha de crédito do FGTS, operada pela Caixa Econômica Federal, o Banco do Brasil e o BNDES, terá juros muito menores, de 8,66%.

Outro ponto que merece destaque na medida adotada pelo governo para socorrer as Santas Casas e o restante da rede filantrópica, da qual elas são o elemento essencial, é a ampla gama de possibilidades oferecida para a utilização dos recursos: despesas de custeio, pagamento de fornecedores, compra de equipamentos e até mesmo para rolar dívidas anteriores. Essa última é de grande importância, porque aquelas instituições foram forçadas a contrair empréstimos no mercado pagando juros elevadíssimos.

A longa crise por que passam fez com que suas dívidas, acumuladas nos últimos 15 anos, chegassem a R$ 21 bilhões e as obrigasse a fechar 11 mil leitos. A Santa Casa de São Paulo, a maior delas, chegou a fechar seu pronto-socorro em 2014. Essa não é a primeira vez que o poder público tem de socorrer as entidades filantrópicas. No ano passado, dentro do programa Pró-Santas Casas, o governo federal decidiu ajudá-las com a liberação anual de R$ 2 bilhões, consignados no Orçamento da União, a partir de 2018.

A MP traz um reforço. Por mais importante que a iniciativa seja, não se pode perder de vista que tanto a MP como o Pró-Santas Casas são medidas paliativas. Isso é reconhecido pelo próprio presidente Temer, com sua referência à “sala de emergência” da qual elas estão saindo, e pelo ministro Occhi, quando afirma: “Esperamos dar um fôlego a essas entidades”.

Mais direto e contundente, o presidente da Confederação das Santas Casas, Edson Rogatti, afirmou: “Isso aqui (a MP) é só um respiro, um fôlego para que as Santas Casas possam manter as portas abertas”. A principal e mais antiga reivindicação da rede filantrópica é a revisão da tabela de procedimentos do Sistema Único de Saúde (SUS), que ao longo de sucessivos governos ficou tão defasada que cobre apenas 60% dos custos. Como os 40% restantes não caem do céu, esse é o ponto central da crise da rede, que a obriga a se endividar continuamente para cobrir essa diferença.

Infelizmente, ainda não se vislumbra no horizonte a solução do problema. O ministro Occhi acaba de deixar isso claro mais uma vez, descartando, justamente ao comentar os benefícios da MP, a revisão da tabela de procedimentos do SUS. Em outras palavras, o governo se mostra decidido – o que não deixa de ser mérito seu – a evitar o pior. Também não poderia ser de outra forma, pois as Santas Casas e os hospitais filantrópicos respondem por mais de 50% dos atendimentos do SUS, como fez questão de assinalar o presidente Temer. Se eles entrarem em colapso, leva junto toda a rede pública de saúde, da qual depende a imensa população carente.

Mas em algum momento – e ele não demora – não haverá mais como o governo limitar-se a medidas paliativas. É preciso começar a pensar numa maneira de fazer a revisão da tabela do SUS.