Editorial, Folha de S. Paulo
Enquanto o país titubeia diante de inadiáveis reformas econômicas, grupos organizados apressam-se a preservar —ou até ampliar— seu quinhão de benesses estatais.
Exemplo inquietante se acha na comissão especial instituída na Câmara dos Deputados para “estudar e apresentar propostas com relação ao financiamento da atividade sindical”, cujo relatório final está prestes a ser aprovado.
Os termos do ato de criação do colegiado mal disfarçam que está em ação um lobby que busca dilatar a tributação destinada ao sustento das entidades de representação dos trabalhadores.
Orientado por parlamentares ligados ao sindicalismo, o projeto da comissão eleva o imposto a ser pago por patrões, autônomos e empregados rurais, enquanto assalariados urbanos permaneceriam onerados no montante equivalente a um dia de trabalho por ano.
Esse não é, contudo, o pior da derrama. Profissionais e empresas terão de arcar, segundo o texto, com outra taxação compulsória, chamada contribuição negocial, correspondente a até 1% da remuneração do funcionário ou a três vezes o tributo patronal.
Se levadas adiante, tais ideias agravarão as distorções e a complexidade da legislação nacional, que já dedica 33 artigos da labiríntica CLT —do art. 578º ao 610º— a regulamentar o imposto sindical.
Sua arrecadação carreia cerca de R$ 3 bilhões anuais às mais de 11 mil organizações laborais existentes no país. A carga, no entanto, é menos nociva que sua obrigatoriedade –da qual nem mesmo os empregados sem filiação a sindicato estão poupados.
A regra esdrúxula torna negócio rentável a abertura de entidades de fachada ou de representatividade duvidosa, em que dirigentes eleitos por minorias desfrutam de receita assegurada.
O estímulo às sinecuras acentua-se com o princípio da unicidade, segundo o qual só pode haver uma associação por categoria e base geográfica. Dito de outra maneira, ao trabalhador não é dado o direito a alternativas.
Conforme noticiou esta Folha, há sinais de que o governo Michel Temer (PMDB) poderia encampar os pleitos sindicais, em troca do apoio a uma reforma trabalhista capaz de facilitar os acordos coletivos para redução de salários e preservação de empregos.
Seria um erro. A desejável negociação entre capital e trabalho demanda, justamente, sindicatos mais legítimos, mantidos por livre escolha de seus representados.
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