Carmel Croukamp
A promessa do governador Carlos Massa Ratinho Júnior (PSD) de levar adiante a duplicação da Rodovia das Cataratas (BR-469), no trecho de 8 quilômetros entre o trevo da Argentina e o Parque Nacional do Iguaçu (PNI), é uma iniciativa que pode ser positiva e visa trazer benefícios para a região. A duplicação é um pleito antigo da comunidade da Tríplice Fronteira e deve agilizar o fluxo turístico. Entretanto, as obras precisam respeitar as 29 exigências do Instituto Água e Terra (IAT) que buscam evitar danos que não poderão ser mitigados e compensados à fauna e flora do local.
A região tem o maior remanescente de Mata Atlântica do interior do Brasil e deve ser protegido. Historicamente, o Paraná é um dos estados que mais destruiu a Mata Atlântica e nos últimos 30 anos foi a região que mais desmatou no país, segundo dados da Fundação SOS Mata Atlântica e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Essa é a oportunidade de mudarmos essa triste vocação.
As exigências de controle ambiental são realísticas, mínimas, alcançáveis e baseadas em realidades nitidamente claras e comprovadas. Há exemplos no Brasil de rodovias construídas com grande grau de observância da legislação e das condicionantes das licenças ambientais.
É um fato que, no Brasil, boa parte do parque rodoviário passou por intenso processo de deterioração devido à falta de investimentos em manutenção, demandando vultosas obras de recuperação. No caso da Rodovia das Cataratas, a duplicação faz parte de uma agenda que resultará no aumento da capacidade de tráfego da rodovia e na segurança de veículos e pedestres, sendo de importância para Foz do Iguaçu e região.
A região é um destino ecoturístico importante e esta estrada leva turistas ao principal magneto da região, as Cataratas do Iguaçu. Por outro lado, existem populações de animais silvestres, como onças, tamanduás e muitos outros ocupando áreas beirando a BR-469, ao longo do trecho a ser duplicado fora do Parque Nacional do Iguaçu. Este é um fato feliz para a indústria de turismo de Foz, pois não é possível nem desejável restringir animais apenas à área protegida.
A visibilidade de onças dentro do Parque Nacional do Iguaçu significa que outras existem fora dele. E isso infelizmente só adiciona ao número de atropelamentos de fauna na BR-469, que já é alto. Populações de animais silvestres grandes, como as antas, estão crescendo e a colisão de um carro com um mamífero desse porte pode causar graves acidentes. As exigências cumprem principalmente a função de compensar os possíveis impactos causados no canteiro. De maneira mais específica: visam oferecer proteção à fauna que transita por ali e recuperar a flora que será suprimida.
A preservação e a recuperação da floresta e de seus habitantes são exigências alcançáveis no contexto da obra. O sucesso desse empreendimento só pode ser alcançado se as obras não destruírem a floresta e se a duplicação, que melhora o acesso a um destino ecoturístico importante para o Paraná, preservar a flora e fauna que contribuem para a marca de Foz do Iguaçu.
Além da exigência referente ao canteiro de obras, o IAT tem especificado a não destruição de espécies ameaçadas de extinção pelo empreendimento. Quando uma espécie de árvore ou animal é definida como “ameaçada de extinção”, significa “quase não tem mais, tem cada vez menos, e precisamos evitar uma destruição desnecessária para não perdê-lo de vez, pois é irrecuperável”. A araucária, árvore frequentemente encontrada às margens da BR-469, é considerada criticamente ameaçada de extinção. Também conhecida como pinheiro-do-Paraná, a araucária é um símbolo do estado. Tínhamos as maiores florestas de araucária do mundo, mas hoje o Paraná destruiu 99% delas. Temos o menor número de araucárias entre os estados do Sul do Brasil, os últimos bastiões significativos da espécie. Outros estados estão fazendo o trabalho do Paraná. Se a araucária desaparecer, outras espécies que dependem dela se tornarão extintas, como o papagaio-charão, e outras podem desaparecer também, como o papagaio-de-peito-roxo, e assim vai o ciclo, em efeito exponencial, de extinção de espécies causadas pelo homem.
Essa é uma obra grande, com orçamento previsto acima de R$ 460 milhões. A gestão da construção é do governo do Paraná, em parceria com o DER e Dnit, com recursos da Itaipu Binacional. Considerando a magnitude e complexidade de uma obra desse porte, há de se entender a importância de normas técnicas que mitiguem os impactos produzidos.
É uma falácia achar que a pauta ambiental seja um impeditivo para o desenvolvimento econômico da região. Ao contrário, não há conflito, pois elas são codependentes e o Paraná pode ganhar muito se utilizar seu potencial ecoturístico, alinhando o desenvolvimento regional com a conservação ambiental. Foz do Iguaçu é um exemplo de como alavancar o meio ambiente em favor do desenvolvimento socioeconômico da região. O turismo, sendo o atrativo principal do famoso Parque Nacional do Iguaçu, com suas belezas geológicas, suas florestas e animais, é a principal indústria da região. E precisamos tratar como região, pois a experiência do turista é íntegra desde a chegada até a partida. Cada ano fica mais evidente que o quanto Foz tem preservado é único, especial e valioso para vidas e para uma economia local, estadual e nacional.
Foz do Iguaçu é o segundo destino mais visitado do Brasil. Foz não é São Paulo, não é Las Vegas, é Foz do Iguaçu. Essa obra de duplicação tem como único objetivo o fortalecimento do turismo pela amplificação da via que leva ao Parque Nacional do Iguaçu. E ela vai ser muito significativa para o destino. Muito além disso, o que Foz tem é valioso de uma perspectiva de ética, inclusive quando pensarmos no longo prazo, para o bem de todos.
Carmel Croukamp é diretora-geral do Parque das Aves.
Deixe um comentário