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Richa acusa Gleisi de perseguir sua administração

César Felício, Valor Econômico

O governador do Paraná, Beto Richa (PSDB), afirmou que a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), ex-ministra da Casa Civil da presidente Dilma Rousseff, é responsável por uma perseguição política contra sua administração. Segundo Richa, Gleisi, que concorre contra ele ao governo paranaense, teria montado um cerco econômico ao Estado para forçá-lo a atrasar o décimo terceiro salário do funcionalismo e o pagamento a fornecedores.

Essa seria a razão pela qual a Secretaria do Tesouro Nacional não havia liberado até anteontem os R$ 817 milhões solicitados pelo Paraná no programa Proinveste, criado pelo governo federal para ressarcir Estados por perdas em repasses obrigatórios e arrecadação própria nos últimos anos. Na terça-feira, a Procuradoria-Geral do Paraná pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a prisão do secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, por desobediência a liminares anteriores. O dinheiro foi liberado apenas ontem à tarde pelo governo federal. Richa afirma que tratou o assunto diretamente com a presidente Dilma Rousseff no fim do ano passado, sem resultado. A presidente visitou ontem o Paraná, onde participou de um encontro do PT com Gleisi e com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O governador admitiu problemas econômicos em sua administração, que atribui ao suposto cerco de Brasília. Mas ressalvou que o Estado teria investido menos que o piso legal de 12% em saúde no ano passado, em razão do que chamou de “excesso de zelo” de sua administração, que não teria contabilizado como gasto na área despesas relacionadas ao tema.

Segundo Richa, a pendência com o governo federal já é o principal tema eleitoral do Paraná. O governador paranaense deu a seguinte entrevista exclusiva ao Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor:

Valor: A falta de liberação dos recursos do Proinveste está relacionada com o processo eleitoral?
Beto Richa: Intimamente. É a única explicação que encontro para uma perseguição política tão forte, sem precedentes e implacável. Todos os Estados receberam recursos do Proinveste e só o Paraná não. Todo o tempo vem com desculpas esfarrapadas, que falta uma certidão, que o Estado está no limite prudencial de gastos com a folha de pagamento, que o Estado não está cumprindo o piso para gastos da saúde, só que eu estou há dois anos brigando por este empréstimo, de apenas R$ 800 milhões. Santa Catarina está com um pacote de empréstimos de R$ 12 bilhões, com a metade da população do Paraná. Além destas desculpas esfarrapadas, todas elas vencidas, um órgão empurra para o outro com a barriga. Por diversas vezes eu comemorei a liberação deste dinheiro. Desde novembro do ano passado, quando finalmente depois de um ano consegui uma audiência com a presidente. Ela foi enérgica na minha frente com o secretário do Tesouro, Arno Augustin. O Arno disse que a documentação estava em ordem, mas que o programa estava vencido. Ela mandou prorrogar de novo. Ele disse que dependia de uma autorização do Conselho Monetário Nacional. ‘Então interceda junto ao Conselho e libere este recurso’. Estas foram as palavras dela, em novembro do ano passado. E de lá para cá, nada. Confesso que demorei para perceber. Agi de boa fé. Recorremos ao Supremo Tribunal Federal na hora que vimos que era perseguição política mesmo. Não tem mais o que fazer.

Valor: O senhor não é o único governador de oposição. Por que esta suposta perseguição só é feita ao Paraná?
Richa: Os outros Estados não tiveram a infelicidade de ter à frente da chefia da Casa Civil uma adversária política ferrenha como eu tive, que é a Gleisi Hoffmann (ministra entre 2011 e 2014, atual senadora). É lá que as decisões são tomadas. Eles apostaram que eu ia atrasar o 13º salário e aí seria meu fim. Conforme eu soube, porque deixaram escapar isso em conversas, que é determinação política do governo federal. É lamentável este tipo de tratamento. Nas relações pessoais não tenho o que reclamar da presidente Dilma. No trato pessoal, ela sempre convida para ir no carro dela nos deslocamentos, eu coloco as coisas com jeito, ela diz que vai ver e depois não acontece.

Valor: O senhor chegou a tratar deste assunto diretamente com Gleisi Hoffmann no ministério?
Richa: Várias vezes, e também com o atual ministro Aloizio Mercadante. Fui também requerer um delegado da Polícia Federal para ser o nosso secretário de Segurança Pública, conforme outros 12 Estados têm. Já tínhamos a data marcada para anunciar a posse. Para minha surpresa, foi negada a disposição dele para mim. Ele chamava-se José Iegas.

Valor: O governo federal está asfixiando economicamente o Paraná?
Richa: A dificuldade financeira que nos trouxe isso foi a seguinte. O Proinveste foi criado para compensar a queda das transferências obrigatórias da União, para investimentos em infraestrutura. Temos 46 projetos de infraestrutura para ser financiados com os recursos deste programa. Eu iniciei estas obras colocando dinheiro na frente e o recurso não vinha. Tivemos que reduzir o ritmo. Algumas obras ficaram um, dois meses paralisadas. A maior obra, de R$ 97 milhões, uma rodovia que corta a cidade de Londrina, está com 50% executado. Vai ficar pronta no fim do ano, mas eu atrasei o pagamento desta obra alguns meses.

Valor: Destes 46 projetos, quantos estão parados?
Richa: Nenhum. A maioria não foi iniciada, para minha sorte. Eu iniciei os principais.

Valor: O senhor chegou a acumular atrasos de R$ 270 milhões a fornecedores?
Richa: Pode ser. Aconteceu por uma série de dificuldades. Isso já se agravou em função de outro problema, o bloqueio de empréstimos internacionais. O que depende de decisão política para o Paraná é bloqueado.

Valor: Qual o comprometimento atual da receita corrente líquida com a folha de pagamentos?
Richa: O valor exato não sei dizer no momento, mas nunca ultrapassamos o limite prudencial de 46,55% que estabelece a Lei de Responsabilidade Fiscal. Chegamos a atingir este limite porque contratamos muitos servidores. Houve a contratação de 10 mil policiais e estamos aumentando o quadro de servidores. Somado a isso as receitas caíram. Aí aumentou o comprometimento. Houve uma queda de R$ 2 bilhões na receita e tive que pagar compromisso da ordem de R$ 4 bilhões do governo passado.

Valor: Então o cenário que se desenha para o Paraná é de uma crise fiscal, caso o senhor seja reeleito.
Richa: Não, porque nós estamos saindo da crise, apesar de toda a discriminação, que espero que melhore porque se trata de uma determinação que veio da Casa Civil que espero que passe depois da eleição. Tudo acontece para me prejudicar eleitoralmente, não tenha dúvida, porque a [ex-]chefe da Casa Civil hoje é candidata, é a minha adversária. Qualquer brasileiro medianamente informado sabe que o Paraná não tem no Brasil a pior situação fiscal, estamos bem acima da média nacional.

Valor: O senhor responsabiliza Gleisi Hoffmann diretamente por esta situação?
Richa: Eu a responsabilizo diretamente. Não há dúvida. Nunca um governador de oposição foi tratado assim.

Valor: O senhor acha que esta questão vai dar o tom da campanha no Paraná?
Richa: Acho que sim, isto é inevitável. Já está dando. Quando estiveram aqui, tanto o Aécio Neves (PSDB) quanto o Eduardo Campos (PSB) disseram que se forem presidentes vão tratar o Paraná como o Estado merece.

Valor: O Estado não atingiu o índice mínimo de aplicação na saúde. Por que?
Richa: Porque minha equipe errou. Houve excesso de zelo. Ficaram em dúvida se lançavam uma despesa como saúde, ou como de área social, ou agrícola. Fomos fechar a conta, deu menos. Já pedimos para refazer as contas. Já estamos em 11,3%, com as suplementações orçamentárias referentes ao exercício de 2013.