Editorial, Estadão
É compreensível que o PMDB esteja preocupado com a falência do governo do qual é o principal aliado e em função disso pretenda desassociar-se do PT e partir para a eleição presidencial de 2018 com candidato próprio. Inadmissível, porém, é líderes importantes do PMDB, como os presidentes do Senado, Renan Calheiros (AL), e da Câmara, Eduardo Cunha (RJ), tentarem colocar as Casas que comandam a serviço de seus próprios interesses políticos, usando-as, a pretexto de garantir a autonomia dos Poderes, para retaliar e chantagear o Palácio do Planalto, a quem responsabilizam por estarem sendo investigados no âmbito da Operação Lava Jato. Independentemente de qualquer outra consideração sobre o desempenho do poder central, o comportamento de Calheiros e de Cunha atenta gravemente – ao contrário do que eles alegam perseguir – contra o equilíbrio institucional e o interesse nacional, na medida em que dificulta ao governo aquilo que ele já mal consegue cumprir com um mínimo de eficiência: governar.
Quem conhece o partido do governo sabe que os petistas não são confiáveis como aliados e adorariam ver os principais líderes peemedebistas arderem na fogueira da Lava Jato. Mas, ao se associar ao PT, colocando seu presidente de honra, Michel Temer, na Vice-Presidência da República, e assumindo o comando de seis Ministérios e muitas outras posições de mando na administração pública, o PMDB comprometeu-se com a tarefa de ajudar Dilma Rousseff a governar e não a sabotá-la. Não se trata, aqui, de defender o governo Dilma, a respeito do qual as opiniões expressas neste espaço são muito claras. Trata-se de repudiar o comportamento dos dois principais líderes peemedebistas no Congresso, que não se limitam a chantagear o Planalto por razões que nada têm a ver com a relação entre os Poderes, mas se prevalecem da situação para fortalecer seu cacife político-eleitoral, aliando-se a quem quer que se disponha a fazer esse jogo madraço.
As ações de Calheiros e de Cunha conflitam com – e colocam em xeque – a posição do vice-presidente Michel Temer, que certamente acolhe in petto os diagnósticos pessimistas sobre o desempenho do governo, mas tem feito o possível para honrar seu compromisso com Dilma, especialmente no que diz respeito à articulação política da qual foi encarregado pela presidente, apesar do nem sempre sutil boicote de forças petistas dentro do governo.
De qualquer modo, a tendência do PMDB de formalizar a ruptura de sua aliança com o PT parece ser irreversível. A questão é fazê-la com correção – pois até na política isso se exige – e no tempo certo. Com esses cuidados, o próprio vice-presidente da República anunciou na quarta-feira, após ato oficial do PMDB do qual participou a cúpula do partido: “Estamos abertos a todas as alianças com todos os partidos. Apenas o que está sendo estabelecido é que o PMDB quer ser cabeça de chapa em 2018”.
Está, portanto, claramente enunciado o projeto político do PMDB daqui para a frente. E tal projeto não deve ser confundido com os objetivos imediatos de Renan Calheiros e de Eduardo Cunha. O presidente do Senado vinha mantendo uma relação de natural entendimento institucional com o Planalto até o momento em que seu nome surgiu nas listas de investigados da Lava Jato. O retrospecto de Cunha é diferente. Elegeu-se para a presidência da Câmara enfrentando forte articulação do Planalto em favor do candidato petista Arlindo Chinaglia. E o posterior surgimento de seu nome na Lava Jato só fez azedar ainda mais as relações com o governo. Tanto Calheiros quanto Cunha acreditam que por detrás de seu envolvimento nas investigações tem o dedo do PT. E daí?
Vale para ambos a opinião do historiador José Murilo de Carvalho colhida pelo Estado a propósito das reações à Operação Politeia, que leva as investigações sobre o escândalo da Petrobrás aos políticos com foro privilegiado: “Quem não deve não teme. (…) As buscas da PF foram autorizadas por três ministros do STF. Onde a violência, onde o arbítrio, onde a intimidação?”.
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