Editorial Estadão
Depois de muitas idas e vindas, aparentemente formou-se um consenso no governo em torno da necessidade de incluir os militares na reforma da Previdência. A informação de que os militares vão “entrar no processo”, por determinação do presidente Jair Bolsonaro, foi dada pelo secretário da Previdência, Rogério Marinho, em encontro com alguns dos novos parlamentares, que tomam posse hoje no Congresso. A prefeitos com quem se reuniu em Brasília, o ministro da Economia, Paulo Guedes, também declarou que as mudanças incluirão todos os sistemas previdenciários. Ainda não se sabe se as propostas serão enviadas em conjunto ou separadamente, mas, segundo o vice-presidente Hamilton Mourão, tudo será encaminhado no primeiro semestre.
Os números não deixam margem a dúvidas sobre o imperativo de reformar também a Previdência dos militares, cujo déficit chegou a quase R$ 44 bilhões no ano passado, cerca de 13% superior ao rombo registrado em 2017. A expansão do déficit da Previdência dos funcionários públicos civis foi de 3,8% no mesmo período, enquanto no sistema do setor privado a alta foi de 6,7%.
Além disso, a despesa com as aposentadorias de militares já representa metade do Orçamento da área de defesa e, portanto, precisa ser rapidamente contida.
Como tudo que diz respeito à reforma da Previdência, a mudança nas aposentadorias dos militares não é um debate fácil. Encontra resistência inclusive dentro do governo, cujos integrantes militares costumam ressaltar que esse setor tem “características especiais, que têm de ser consideradas e discutidas”, como lembrou o ministro-chefe da Secretaria de Governo, general Carlos Alberto dos Santos Cruz.
É provável que a proposta de reforma não elimine o sistema especial de benefícios para os militares, pois esse setor profissional tem, de fato, perfil bastante distinto dos demais. Não se pode exigir, por exemplo, que um militar idoso ainda esteja na ativa, pois a sua profissão exige condições físicas que levam à aposentadoria precoce em relação aos demais trabalhadores. É preciso levar em conta também que militares não podem fazer greve, não recebem hora extra nem adicionais noturno ou de periculosidade e não recolhem Fundo de Garantia.
O problema é que ao se aposentarem, em geral entre 45 e 50 anos de idade, os militares têm garantidos pelas décadas seguintes salário integral – o que não acontece nos Estados Unidos e no Reino Unido, por exemplo – e gratificações cujo acúmulo pode até dobrar seus benefícios. Trata-se de um modelo insustentável.
A questão da Previdência do setor militar é central no esforço do governo para obter o apoio dos Estados à proposta de reforma. Em encontro com o secretário Rogério Marinho, governadores pediram que a emenda incluísse novas regras para a aposentadoria de policiais militares, que tem grande peso no déficit previdenciário de vários Estados. Está claro que os governadores querem dividir com o governo federal o ônus do esperado desgaste político de promover mudanças num setor tão sensível.
Por esse mesmo motivo, os governadores também querem que, em troca de mobilização de deputados pela reforma, o governo federal encampe mudanças nas aposentadorias do funcionalismo estadual. Pedido semelhante, em relação ao funcionalismo municipal, foi feito pela Frente Nacional de Prefeitos no encontro com o ministro Paulo Guedes.
A julgar pelo discurso do secretário da Previdência, Rogério Marinho, o governo está mesmo disposto a abraçar a causa. “Todos têm que contribuir. Esse é o esforço de salvarmos o sistema previdenciário e apresentarmos uma nova Previdência ao Brasil. Então a responsabilidade é de todos. Todos os segmentos têm que dar sua contribuição nesse processo. Ninguém vai ficar de fora. O governo vai apresentar um projeto que vai levar em consideração todos os segmentos da sociedade brasileira”, declarou Marinho. É realmente o que se espera. Um sistema previdenciário que ignora as mudanças demográficas e de mercado de trabalho e se notabiliza pela concessão de privilégios, gerando um déficit de mais de R$ 290 bilhões em 2018 – 8% maior que o de 2017 –, é obviamente inviável.
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