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Redes de pornografia infantil é similar aos modelos adotados por terroristas

Fearful shadows scaring a child.

Com base no resultado de três anos de operações de combate à pornografia infantil, três policiais federais brasileiros publicaram, na segunda semana de janeiro, artigo na revista Nature com uma radiografia das entranhas de organizações criminosas que atuam na chamada dark web para compartilhar e disseminar pornografia infantil. Com as informações coletadas pela Polícia Federal entre 2014 e 2016, Bruno Requião da Cunha, Luiz Walmocyr dos Santos Júnior e Jean Fernando Passold, em parceria com pesquisadores da Universidade de Limerick, na Irlanda, fizeram uma análise profunda dos bancos de dados anônimos da operação Darknet da Polícia Federal. As informações são de Roger Pereira na Gazeta do Povo.

O estudo foi publicado com o título “Assessing police topological efficiency in a major sting operation on the dark web” (“Avaliando a eficiência topológica policial em uma grande operação de infiltração na dark web”, em tradução livre), na edição especial de física social do periódico Scientific Reports da Nature.

Os pesquisadores adotaram como base de dados o monitoramento, entre 2014 e 2016, de 182 usuários de um fórum de pornografia infantil, que reunia cerca de 10 mil pessoas. O objetivo do estudo era traçar critérios para melhorar o combate de crimes online contra crianças e dificultar a criação de outras estruturas similares na web e na chamada deep web.

Eles descobriram que a estrutura das redes que interligam pessoas que se dedicam à pornografia infantil é similar aos modelos adotados por terroristas. Isso significa que as dificuldades para desmontar as duas redes criminosas são parecidas. Os policiais acreditam ainda que os métodos desenvolvidos a partir desse estudo podem ser utilizados para aumentar ainda mais a eficiência de futuras operações nesses dois campos.

“Geralmente, quando se fala em crime organizado, as pessoas precisam transmitir dinheiro, ordens, de cabeças, para ponta dos membros. Quando se fala em células terroristas é diferente. Geralmente, a relação é mais homogênea, as ordens são mais difusas, não tem um centro operando. E as redes de pedofilia são parecidas neste sentido. As pessoas ali não estão preocupadas em passar orientação, informação, ordem. Elas querem consumir aquela vontade doentia delas de ter acesso à pornografia infantil. Isso faz com que todas as pessoas passam a ter um relacionamento homogêneo, buscando aquelas imagens. Assim como os terroristas têm relacionamento homogêneo buscando realizar o ato de ódio com uma compulsão parecida àquela de quem consome pornografia infantil”, aponta Cunha.

“Desenvolvemos, então, ferramentas matemáticas para chegar aos elos fracos destas cadeias para, numa analogia com o castelo de cartas, derrubá-las tirando as peças corretas”, prossegue.

O policial federal lembra que o mercado ilegal de pornografia infantil na internet movimenta US$ 3 bilhões, o que pode despertar interesse de criminosos que não possuem nenhum distúrbio de saúde em explorar essa vulnerabilidade dos pedófilos.

“Mas, para explorar comercialmente a pornografia infantil, por si só, a pessoa deve ter algum distúrbio. Para qualquer pessoa comum, simplesmente ver uma imagem de uma criança sendo explorada sexualmente é repugnante. Então, por mais que gere retorno financeiro, é uma coisa que mexe com sensações primitivas, de proteger nossas crianças”, comenta.

O submundo da internet
Cunha compara a internet a um iceberg. “A parcela que conhecemos, utilizamos em nosso cotidiano e pode ser encontrada utilizando qualquer canal de busca é a superfície. A deep [web] é composta por sites não indexados, mas que podem ser encontrados. Normalmente, é onde ficam os dados sigilosos”.

A dark web, explica, é uma parte mais “sombria” da deep web. A quase totalidade dos domínios nesta parte da web é voltada para práticas criminosas de todo o tipo, como sites associados a tráfico de drogas, exploração infantil, serviços de assassinos de aluguel, sites com vídeos reais de pessoas sendo torturadas até a morte, domínios voltados a tráfico humano e comportamentos bizarros.

“Dentro da dark web, tem um software que se chama Tork. Criado pela Marinha americana, ele popularizou e era muito utilizado por pessoas que queriam driblar regimes autoritários e denunciar a violação de direitos. Mas, como tem anonimato, acabou sendo usado para cometer crimes, inclusive o compartilhamento de pornografia infantil”, explica.

A maioria dos domínios da dark web são compostos por strings (cadeia de caracteres, geralmente utilizada para representar palavras, frases ou textos de um programa) de letras e números sem o menor sentido. Apenas quem tem os domínios e credenciais completos é autorizado a entrar nesses sites. Ou seja, o acesso a esse “pântano” da web exige o uso de ferramentas poderosas de criptografia e proteção dos dados.

“As polícias de todo o mundo estão monitorando essas redes profundas. Há diversos organismos não governamentais que ajudam todos os órgãos de investigação do mundo, que filtram mídias com pornografia infantil. O comportamento criminal apresenta alguns padrões. Pode-se comparar a um serial killer. É um doente, sociopata, psicopata que comete um crime. A polícia não combate a pedofilia, que é o distúrbio, mas os crimes a ela associados, como o compartilhamento, o abuso, o aliciamento”, explica.