Guilherme Voitch, Gazeta do Povo
Em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo, o candidato à Presidência pelo PSDB, Aécio Neves, diz que o Paraná é prejudicado pela União e defende uma revisão do pacto federativo. “Hoje somos um federação de ente único.” Apostando em um discurso descentralizador, o tucano garantiu que irá beneficiar estados e municípios, caso seja eleito. Aécio conversou com a reportagem no último sábado, após visitar Curitiba. A entrevista foi concedida no avião da campanha, durante o trajeto entre a capital paranaense e Porto Alegre.
Aécio fez críticas à política econômica do governo Dilma Rousseff e explicou a acusação de favorecimento a um tio na construção do aeroporto no município de Cláudio, no interior de Minas Gerais. O senador falou ainda sobre o mensalão mineiro, dizendo que o aliado Eduardo Azeredo não terá solidariedade do partido se for condenado pela Justiça.
A manchete da Gazeta do Povo deste domingo mostra que, entre as 27 unidades federativas, o Paraná foi 24.º colocado na relação dos tributos federais arrecadados e investimentos da União entre 2002 e o ano passado. Desde o último ano de governo FHC e 2013 não houve grande mudança dessa situação. Qual sua avaliação desse cenário?
O que vem acontecendo com o Paraná nos últimos anos é inaceitável. O Paraná é um estado que arrecada muito e um dos últimos no retorno desses tributos. Eu não quero comparar governos, mas, uma explicação tem de ser dada. O governo Fernando Henrique Cardoso foi um período de baixo investimento em todo Brasil porque havia uma prioridade em detrimento de todas as outras, que era enfrentar a inflação. Ela foi vencida com o Plano Real. Era uma etapa necessária para que o Brasil voltasse a crescer. Eram outras circunstâncias macroeconômicas. Hoje, o que nós estamos assistindo são dificuldades sucessivas colocadas sobre o Paraná. O governo federal ofereceu a alguns estados um financiamento. Ofereceu em larga escala, mas, no caso do Paraná, houve a necessidade de o estado recorrer ao Supremo Tribunal Federal. Eu tenho dito que a base do nosso projeto é a refundação da federação do Brasil. Nós precisamos que os estados e municípios readquiram condições mínimas para enfrentarem suas demandas. Existe uma agenda federativa no Congresso. O mais relevante desses temas é a renegociação da dívida dos estados, o que possibilitaria um espaço para que as unidades federativas pudessem transformar essa diferença em investimento. Eu próprio tenho um projeto que impede que o governo federal faça desonerações sobre parcelas de tributos dos estados e municípios. A União pode continuar fazendo isenção do IPI (Imposto Sobre Produtos Industrializados), mas na parcela dela. Não é lógico buscar uma solução para crises setoriais comprometendo orçamento de estados e municípios. Essa é uma proposta que o PT não permitiu que fosse votada. A tributação entre entes federativos, o Pasep (Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público), por exemplo. Hoje paga município, estado e União. Não tem sentido isso. Existe uma agenda da federação paralisada e obstruída pelo Congresso Nacional pela ação da maioria governista, levando o Brasil a se transformar num estado federativo de ente único. Eu quero resgatar a parceria com os estados e com o Paraná, em especial, porque vem sendo o mais prejudicado. Quero resgatar a federação.
A carta do banco Santander a correntistas com perspectivas ruins sobre a economia brasileira foi muito criticada pelo governo. O que o senhor achou da carta e da reação do governo?
O processo de desindustrialização é dramático. A indústria automobilística perdeu mais de 30% da sua capacidade de produção do ano passado para cá. A indústria como um todo, 7%. O governo deixará ao próximo presidente um estado de ‘estagflação’ no Brasil. Teremos estagnação com inflação no Brasil. Vamos crescer menos que nossos vizinhos na América do Sul. As principais agências já reduzem a previsão de crescimento do Brasil para menos de 1%. A inflação, mesmo tendo preços represados, está ultrapassando o teto da meta. O governo da presidente Dilma perdeu a capacidade de gerar ambientes adequados para os investimentos no Brasil. As sinalizações que o governo dá são sempre opacas. Não se sabe o que acontecerá com setor elétrico se o PT vencer as eleições. Não se sabe qual será o papel do BNDES na condução da economia brasileira. E tem a inflação que pune quem menos tem, a classe trabalhadora…
O governo se defende e diz que há outros indicadores a serem analisados, como a baixa taxa de desemprego…
O próprio Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) já mostra que [a taxa de empregabilidade] já deixou de crescer. Nós tivemos o pior junho em quinze anos de carteira assinada. A fotografia pode estar satisfatória para o governo, mas o filme está muito ruim. O governo da presidente Dilma fracassou na condução da política econômica, fracassou na gestão do estado e fracassou na melhoria dos indicadores sociais. Temos uma educação de péssima qualidade. Os principais rankings internacionais, como o Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes), por exemplo, mostra isso. A saúde pública no Brasil é uma tragédia, agravada pela omissão do governo. Quando o governo do PT assumiu, a União era responsável por 54% de tudo que se gastava em saúde. Onze anos se passaram e hoje participa com 45%. Mais uma vez sobra para os municípios. Na segurança há uma omissão criminosa. Deveria ser o governo federal o grande responsável pelo controle das fronteiras. Não é. A execução do Fundo Penitenciário não passou de 10,5%. A presidente Dilma disse que ia colocar 14 Vants (Veículos Aéreos Não-tripulados) nas nossas fronteiras. Quatro anos se passaram e tem dois, mais ou menos, funcionando. Há um descompasso entre o que se propõe e o que se faz. A Carta do Santander, nesse sentido, é muito mais branda que várias outras análises de outras instituições. E aí sempre tem reação autoritária do governo. Querem demissões. Querem retaliação.
Como o senhor viu a posição da diplomacia do Brasil sobre o conflito entre Israel e Palestina em Gaza?
A nossa posição sempre foi de muito equilíbrio. Eu pessoalmente condeno o uso excessivo de força por Israel, mas condeno o Hamas pelo lançamento aleatório de foguetes sobre território de Israel. A posição tinha que ser sempre pelo cessar-fogo.
O senhor escreveu um artigo no jornal Folha de S. Paulo para explicar a construção do aeroporto em Cláudio (em uma fazenda que pertencia ao seu tio) falando em equívoco com a Anac. Qual foi o equívoco?
Todo o homem público precisa estar pronto para responder acusações com absoluta serenidade. É natural que surjam ataques e acusações. Quem está no governo não vai querer largar esse osso com facilidade. Em Minas Gerais, eu fiz um governo que é referência. É referência para o Banco Mundial. Temos a melhor educação fundamental do Brasil. A melhor saúde da região sudeste. Somos exemplos em parcerias público-privadas. Essa obra que é objeto dessas críticas é justificável para quem conhece o estado de Minas Gerais. Na verdade, nós asfaltamos 225 cidades sob responsabilidade do estado que não tinham asfalto. Ligamos 450 cidades que não tinham sinal de telefonia. Fizemos 30 investimentos em aeródromos para aproximar as diferentes regiões do estado. Foi isso que fizemos, com a acusação de que isso poderia ter beneficiado um parente meu. O estado depositou em juízo R$ 1 milhão pela desapropriação de uma área em que ele queria R$ 9 milhões e agora ele quer o dobro disso. Agora ele quer R$ 20 milhões, mas não recebeu um centavo. Fiz isso em desfavor a um parente meu. Fiz um investimento para uma região em que há 150 pequenas e médias indústrias. Passei minha vida pública em questionamentos, inclusive do PT local. Agora é o momento que começam a aparecer essas denúncias. Estarei pronto a responder a qualquer ataque que for feito contra mim.
O senhor imagina uma campanha marcada por acusações?
Figuras ilustres do governo chegaram a dizer que nas eleições se faz o diabo. Já começaram a fazer. Não tenho dúvida que será uma eleição judicializada…
… E pretende usar essa discussão ética na eleição ao tratar de temas como o mensalão, Petrobras?
Vamos nos defender. Há uma rede na internet a serviço da candidatura do PT com ataques brutais e pessoais. Vamos nos defender, mas farei candidatura propositiva.
O senhor deu uma declaração dizendo que, se alguém do seu partido fosse condenado na Justiça, não viraria herói. Era uma referência ao ex-senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) e ao mensalão mineiro?
A pergunta foi em relação a ele. E eu respondi que conheço o Eduardo há muitos anos e ele é um homem de bem, mas o processo dele está sendo julgado pela Justiça. Espero que ele possa se defender, mas se ele for condenado nós não vamos transformá-lo em herói nacional. Não vamos deseducar a população brasileira. Falo isso como presidente nacional do PSDB. Nunca torci pela condenação de A ou B, mas quem for condenado pela mais alta corte do Brasil, tem que cumprir a pena e respeitar. É um tema que nos dá alegria? Não. Mas ele terá a oportunidade de se defender na Justiça.
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