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Por uma Boca Maldita livre e democrática

Por uma Boca Maldita livre e democrática

Luiz Cláudio Romanelli

 Fui surpreendido no último final de semana pela portaria do juiz Benjamin Acácio de Moura e Costa, da 178ª Zona Eleitoral, acerca de como os partidos poderão conduzir suas campanhas eleitorais deste ano nos espaços públicos de Curitiba. Aliás, como não deverão conduzi-las, tantas são as restrições contidas na portaria.

 A portaria proíbe distribuição de panfletos, bandeiras, faixas, showmícios, alto-falantes e sabe-se lá mais o quê. O juiz cita nominalmente a Boca Maldita, o Largo da Ordem, a Avenida Manoel Ribas e a Via Vêneto, assim como os terminais de ônibus, como locais onde a fiscalização será mais rigorosa e as campanhas, por conseguinte, praticamente impossíveis.

 Sem querer posar de porta-voz da consciência democrática de nosso povo, estou convencido de que não foi para isso que lutamos durante anos para conquistar as liberdades democráticas, o direito de livre expressão e manifestação. Que a ditadura militar empregasse a Lei Falcão, de triste memória, pode-se entender, mas que o regime democrático procure esterilizar as eleições nesse nível, não dá para aceitar. Não concordamos, não aceitamos e entraremos com recurso contra essa decisão.

 Argumenta-se, por exemplo, que a concentração de candidatos de partidos diferentes num mesmo ponto pode ocasionar disputas mais ou menos calorosas. Afirma-se que os comerciantes do Largo da Ordem reclamaram desses encontros na campanha anterior. Insinua-se que o barulho eleitoral pode atrapalhar hospitais e escolas.

Ora, é uma questão de vivência democrática o aprendizado necessário de como se evitar os excessos, mas não me parece que esses eventuais episódios tenham tido qualquer peso significativo e negativo na vida de Curitiba, assim como de qualquer outra cidade do país.

Desde que retomamos o ciclo democrático, em 1985, já ocorreram 12 processos eleitorais em nosso país, vários deles memoráveis. São momentos de civismo, de festa democrática, de desenvolvimento da consciência política da população.

Quanto mais livre de amarras for uma campanha eleitoral (salvo aquelas restrições que tenham por objetivo garantir a lisura e a transparência do processo), mais ela estará reafirmando seu caráter de propriedade pública, de instrumento do povo.

É o povo que precisa ser informado sobre as propostas e os programas de seus candidatos. Se não fosse o povo, não haveria campanha, como era nos tempos em que a imensa maioria da população era excluída sumariamente da escolha de seus governantes e representantes. Hoje, os espaços públicos devem estar abertos para as campanhas eleitorais.

 Parece-me claro que a citada portaria vai ao encontro do interesse daqueles que pretendem tornar as eleições municipais deste ano um processo frio, desapaixonado, dormente, amortecedor. Alguns partidos e muitos políticos, com meios de fazer campanhas milionárias, costumam fazer do povo um mero coadjuvante das eleições.

Nós, democratas de muitos partidos, preferimos o calor da disputa, do confronto de idéias, as bandeiras, os panfletos, o colorido eleitoral. É muito preferível um pouco de sujeira e de barulho democráticos à assepsia ditatorial.

 Para encerrar, não posso deixar de me referir à proibição que a portaria faz pesar sobre a histórica Boca Maldita de Curitiba. A Boca não merece isso. A Boca dos grandes comícios, da campanha das Diretas-já, do impeachment de Collor de Mello; a Boca dos panfletos, das faixas, das bandeiras, do coreto; a Boca por onde todo morador de Curitiba passa muitas vezes em sua vida. Nós não vamos deixar que extingam a vida e a alegria da Boca Maldita.

Luiz Cláudio Romanelli, deputado estadual e vice-presidente do PMDB do Paraná