por João Batista Natali
Edith Piaf (1915-1963), na verdade, não morreu. Há as gravações que guardaram seu timbre belíssimo e o conteúdo de suas letras, centradas no amor infeliz.
Mas sobrevive o que ela ainda representa como uma espécie de bandeira musical de uma França emotiva. A cantora redigiu duas autobiografias, e sobre ela foram publicados 27 livros. Que, aparentemente, não contaram o suficiente. “Piaf – Uma Vida”, da australiana Carolyn Burke, é uma nova tentativa bem-sucedida de entrar a fundo na história dessa mulher feiosa, pequenina e que se agigantava com suas canções.
Burke faz um bom retrato da infância de Piaf. Nascida no bairro parisiense de Belleville, seu pai era um contorcionista que se exibia pelas calçadas, e sua mãe, cantora de modestos cabarés. Edith passou seus primeiros anos com a avó paterna, gerente de um bordel na Normandia.
Juntou-se depois ao pai: rotina nômade e sem tomar pé com as sucessivas namoradas que ele arrumava. Começou a cantar nas ruas, em troca de moedas atiradas por passantes. Aos 16 anos engravidou do namorado. A pequena Cécelle morreria dois anos depois. Piaf não tinha dinheiro para enterrá-la e teria se prostituído para obter os dez francos de que precisava. Segue-se um período de profissionalização precária em cabarés do bairro de Pigalle, onde a cantora submeteu-se à proteção do mafioso Henri Valette.
Seus protetores seguintes foram menos controvertidos. Eram empresários de casas noturnas. Com pouco mais de 20 anos ela ficara famosa. O livro não cai na tentação moralista de criticar Piaf por sua coleção de amantes. Por alguns deles ela se apaixonou, como o provam as cartas que lhes escreveu.
Cada um viveu ao lado dela um ciclo de alguns meses. Se eram cantores, ela os protegia e os lançava na carreira, como foi o caso de Yves Montand (1921-1991).
Piaf não foi um fenômeno apenas francês. Ela se tornou um grande sucesso comercial nos Estados Unidos. Cantava e gravava em inglês, mesmo se as traduções levassem à perda de seu delicioso charme, como a vibração dos “rr” e do sotaque proletário das ruas de Paris. A biógrafa não procura diagnosticar os problemas psicológicos da biografada, o que seria complicado e temerário. Contenta-se em narrar suas internações em clínicas de desintoxicação. Piaf bebia muito e, para piorar, viciou-se em morfina.
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