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PF indicia Miller e aponta que PGR sabia de sua atuação para J&F

PF indicia Miller e aponta que PGR sabia de sua atuação para J&F

A Polícia Federal (PF) indiciou o ex-procurador da República Marcelo Miller por corrupção passiva e o empresário Joesley Batista por corrupção ativa no âmbito das tratativas do acordo de delação premiada dos executivos do Grupo JBS com a Procuradoria-Geral da República (PGR) durante a gestão Rodrigo Janot, no ano passado. A informação foi antecipada pelo blog da jornalista Andréia Sadi e confirmada pelo GLOBO. Além de pedir o indiciamento, a PF aponta que os membros da PGR já tinham conhecimento da atuação de Miller para a JBS desde o começo das negociações, em março do ano passado e que nenhum procedimento administrativo interno foi instaurado pela PGR no período. As informações são de Mateus Coutinho n’O Globo.

Também foram indiciados o ex-diretor jurídico da J&F Francisco de Assis e as advogadas Fernanda Lara Tórtima e Esther Flesch. Não foram indiciados, porém, o ex-diretor da J&F Ricardo Saud e Wesley Batista, que também eram investigados no inquérito. O relatório final da investigação, conduzida pelo delegado Cleyber Malta Lopes e com 342 páginas, foi encaminhado nesta noite à presidente do STF Cármen Lúcia e ao ministro Edson Fachin, relator do caso na Corte.

A investigação foi determinada pela presidente do STF no ano passado após vir à tona uma gravação de Joesley Batista com Ricardo Saud no qual eles falam sobre contatos e favores recebidos de Miller no período de pré-tratativas do acordo. Diante do episódio, o então procurador-geral da República Rodrigo Janot pediu ao STF a rescisão dos benefícios dos delatores e a prisão deles, que acabou sendo decretada pelo ministro Fachin. Os irmãos Batista foram soltos neste ano e seguem colaborando com as investigações para tentar garantir benefícios. O STF ainda não decidiu sobre o rompimento do acordo deles, que na prática segue com os benefícios suspensos.

Para o delegado Cleyber, há indícios de que Joesley, Francisco e as advogadas Fernanda Lara Tórtima e Esther Flesch omitiram, no acordo de delação, a “real extensão dos atos” de Miller para ajudar os executivos do grupo empresarial em sua colaboração.

Apesar de apontar que há indícios suficientes de corrupção envolvendo a atuação de Miller enquanto ainda era procurador da República, o delegado entendeu que não houve orientação do ex-procurador nos grampos feitos por Joesley nos diálogos com o presidente Michel Temer (MDB) e com o senador Aécio Neves (PSDB) que deram origem à Operação Patmos. Para o delegado, não há nenhum indício de que Miller atuou na produção das provas e, por isso, elas devem ser preservadas. Oficialmente, Miller ainda não havia se desligado da PGR logo no começo das tratativas da J&F com a PGR.

O delegado também pondera em seu relatório que os delatores colaboraram para esclarecer os episódios apurados no inquérito. “É necessário reconhecer que os investigados (executivos da IBS/l&F) cooperaram com as investigações abrangidas neste inquérito, quanto aos fatos relacionados a Marcelo Miller, juntando documentos quando solicitados e respondendo a todas as perguntas formuladas por esta autoridade policial, o que colaborou de forma efetiva para o esclarecimento de tais fatos”, segue o documento.

No relatório, o delegado dedica um capítulo específico para os membros do Ministério Público Federal no episódio e aponta que tanto o diretor jurídico da empresa Francisco de Assis e Silva quanto o promotor Sérgio Bruno, do Grupo de Trabalho da Lava Jato na gestão Janot “afirmaram que tiveram conhecimento na primeira reunião na PGR, no início de março de 2017 sobre ingresso de Marcelo Miller no TRW (Trech Rossi e Watanabe, escritório contratado para a delação dos executivos da J&F) e inclusive que ele passaria atuar nos interesses da JBS”, diz trecho do relatório.

“Somente quando da divulgação do áudio, quase seis meses após a ciência e participação pública naqueles procedimentos é que Marcelo Miller passou a ser investigado pelos seus atos”, segue o delegado lembrando que não foi instaurado nenhum procedimento administrativo interno durante a gestão Janot para apurar a eventual infração de Miller enquanto ainda tinha cargo na PGR. Os áudios que levaram à instauração do inquérito vieram à tona no prazo final previsto no acordo para os delatores apresentarem as provas. As gravações teriam sido feitas por acidente no mesmo gravador utilizado nos diálogos de Joesley com Temer e Aécio.

Apesar de citar que um membro da PGR tinha conhecimento do envolvimento de Miller, o delegado não faz nenhuma acusação à outros membros da equipe de Janot no período, pois não pode investigar membros do MPF. Ele, contudo, pede que o material do inquérito seja encaminhado à PGR, a quem cabe decidir sobre eventual investigação envolvendo. procuradores da República.

Já a investigação envolvendo Miller, que não é mais procurador da República, deverá ser encaminhada ao MPF em primeira instância, que vai analisar o caso e decidir se denuncia ou não o ex-procurador.

Por meio de nota, a J&F informou que Joesley Batista e Francisco de Assis “jamais contrataram, ofereceram ou autorizaram que fosse oferecida qualquer vantagem indevida ao senhor Marcello Miller”.

“A J&F contratou dois escritórios de advocacia reconhecidos por sua reputação em suas respectivas áreas de atuação: TRW (Trench Rossi Watanabe), na área de compliance e investigação interna, e Tortima Tavares Borges, na área criminal. Marcelo Miller era sócio do TRW, o escritório de advocacia mais renomado no mundo em compliance, não havendo motivos para desconfiar de qualquer irregularidade.”, segue o texto que aponta ainda que a empresa está processando o escritório por “má –prática profissional” no episódio.

“Apesar do minucioso trabalho feito pela Polícia Federal, causa indignação a suspeita por atos que sequer eram de conhecimento ou controle dos colaboradores e cuja responsabilidade deve ser assumida pelos escritórios respectivos”, conclui a nota.

Por meio de nota, a defesa de Miller informou quesua atuação no escritório Trench Rossi e Watanabe foi de caráter privado, “usando apenas seu conhecimento jurídico e sua experiência profissional, sem envolver nenhum aspecto da função pública que ainda exercia” e que ele “exercia a função pública em caráter apenas residual, pois já tinha pedido exoneração e esteve em férias na maior parte do período”.

Ainda segundo a defesa, Miller “nunca autorizou quem quer que fosse a sequer mencionar sua função pública para obter vantagem” e nunca recebeu valor pelas tratativas das quais participou no pré-acordo de colaboração enquanto ainda estava na PGR.