Líderes partidários recuaram e passaram a aceitar um valor menor para o fundo de financiamento das eleições de 2020, que deve ficar em R$ 2 bilhões. As informações são de Thiago Resende e Danielle Brant na Folha de S. Paulo.
Congressistas querem evitar o constrangimento de um possível veto do presidente Jair Bolsonaro.
O Palácio do Planalto se posicionou contra o aumento do fundo eleitoral para R$ 3,8 bilhões, articulado há duas semanas por partidos que representam a maioria do Congresso.
Sob pressão, o relator da proposta do Orçamento de 2020, deputado Domingos Neto (PSD-CE), buscou um acordo para que o fundo voltasse a ser de R$ 2 bilhões.
Até o fechamento do relatório final também foi cogitada a possibilidade de o fundo ser de R$ 2,5 bilhões.
Na semana passada, interlocutores de Bolsonaro tentaram um consenso em relação a esse patamar. Mas o próprio presidente desautorizou a articulação de líderes aliados e insistiu em um teto de R$ 2 bilhões.
Uma ala do centrão ainda defendia a ampliação para R$ 2,5 bilhões, mas Neto diz ter conseguido um consenso com partidos em favor de um financiamento mais enxuto.
O deputado só deve divulgar o relatório final do Orçamento, que inclui o novo patamar do financiamento de campanha, nesta terça-feira (17), pouco antes da votação do projeto no Congresso.
Deputados do centrão —grupo de partidos independentes ao governo e que, juntos, representam a maioria da Câmara— foram escalados para negociar com interlocutores do Planalto.
Essa não foi a primeira vez que o presidente e o Congresso entraram numa queda de braço.
Líderes já articulavam, em julho, o aumento do fundo para R$ 3,7 bilhões na votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), fase que antecede a proposta de Orçamento.
Diante de críticas, o relator da LDO, deputado Cacá Leão (PP-BA), desistiu, em agosto, de inflar a verba.
Mas o assunto voltou à articulação do Congresso na reta final do projeto de Orçamento.
Presidentes e líderes de partidos enviaram um documento a Neto pedindo que o valor do fundo chegasse a R$ 4 bilhões.
A pressão era sob o argumento de que o número de candidatos de uma eleição municipal é bem maior do que o número de candidatos das eleições para presidente, governos estaduais, Congresso e Assembleias.
Assinaram o ofício representantes do PP, MDB, PTB, PT, PSL, PL, PSD, PSB, Republicanos, PSDB, PDT, DEM e Solidariedade. Eles representam 430 dos 513 deputados e 62 dos 81 senadores.
Neto, então, elevou de R$ 2 bilhões para R$ 3,8 bilhões o tamanho do fundo. A Comissão Mista de Orçamento autorizou esse aumento na verba há duas semanas.
Podemos, Cidadania, PSOL e Novo foram contra. Mas essas legendas, mesmo juntas, não tinham força política para barrar a investida.
Para conseguir espaço no Orçamento, o relator teve de ampliar a estimativa de arrecadação nos cofres públicos e cortar recursos de ministérios.
O governo está pressionado pelo teto de gastos —limitação aprovada em 2016 pelo Congresso ao crescimento das despesas públicas.
O recuo no valor do financiamento de campanha deixa, portanto, um alívio no Orçamento, que pode ser realocado em outras ações.
Ameaçados por Bolsonaro, que declarou a intenção de vetar um fundo eleitoral inflado, líderes do Congresso reavaliaram a estratégia.
O veto, segundo eles, tem potencial de prejudicar a imagem dos congressistas e partidos políticos. Além disso, o ato de Bolsonaro poderia deixar a classe política sem verba para o pleito.
O fundão eleitoral é o principal mecanismo de financiamento público dos candidatos.
Até 2015, grandes empresas, como bancos e empreiteiras, eram as principais responsáveis pelo financiamento dos candidatos.
Naquele ano, o STF (Supremo Tribunal Federal) proibiu a doação empresarial sob o argumento de que o poder econômico desequilibra o jogo democrático.
Num cálculo político, líderes da Câmara dizem acreditar que o desgaste para aumentar o fundo poderá recair, em maior peso, sobre os deputados.
Senadores têm menor interesse em disputas municipais e, por isso, não demonstravam empenho para enfrentar a opinião pública para elevar os recursos do Orçamento para o financiamento de campanhas.
Além do dinheiro para o fundo eleitoral, há uma verba de R$ 1 bilhão para o fundo partidário, de assistência financeira às siglas.
Pelas regras eleitorais, as maiores fatias das verbas públicas de campanha (fundos eleitoral e partidário) serão distribuídas aos candidatos do PSL (antiga legenda de Bolsonaro) e do PT do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Um dos principais critérios para o rateio é o número de cadeiras na Câmara. PSL e PT são as maiores bancadas.
Os candidatos que receberão os recursos, e os valores destinados a cada um, são decididos pelas cúpulas partidárias.
A cúpula do Congresso evitou entrar em confronto com líderes que articulavam o aumento do fundo eleitoral para R$ 3,8 bilhões.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), defendem a volta do financiamento privado de campanha, mas o tema ainda não foi discutido no Legislativo.
A previsão é de que o relatório final do Orçamento seja votado na manhã desta terça-feira pela Comissão Mista de Orçamento. À tarde, a proposta seguiria para o plenário do Congresso.
Para aprovar o texto, é necessário apoio da maioria simples dos congressistas que estarão na sessão.
Alcolumbre quer concluir a votação do Orçamento na noite desta terça para que, então, o Congresso entre em recesso.
No Orçamento do próximo ano, parlamentares terão mais poder, pois as emendas apresentadas por bancadas estaduais não podem ser alvo de contingenciamento do governo.
PARA QUE SERVE O FUNDO ELEITORAL
O que é?
É uma verba pública que os partidos recebem em ano eleitoral para financiar campanhas. Passou a valer em 2018, quando distribuiu cerca de R$ 1,7 bilhão.
Ele é a única fonte de verba pública para as campanhas?
Não. Os partidos também podem usar recursos do fundo partidário (verba pública para subsidiar o funcionamento das legendas, distribuída mensalmente). Em 2018, foram repassados R$ 889 milhões. Neste ano, total gira em torno dos R$ 928 milhões.
Quais são as outras formas de financiamento possíveis?
Os candidatos podem recolher doações de pessoas físicas e podem financiar as próprias campanhas. O autofinanciamento é limitado a 10% do teto de gastos, que varia de acordo com o cargo disputado.
As doações empresariais são proibidas desde 2015.
Qual o valor previsto para o fundo eleitoral em 2020?
O valor final está sendo discutido na comissão do Congresso que debate o Orçamento de 2020. Relatório preliminar aprovado no dia 4 previa R$ 3,8 bilhões, mas, após pressões, a quantia final deve ser reduzida para R$ 2 bilhões.
Como é possível aumentar o valor do fundo eleitoral?
A Lei do Teto de Gastos limita o crescimento das despesas públicas. Segundo técnicos, cortes em outras áreas permitiram que os congressistas sugerissem o aumento do fundo eleitoral.
De quanto é o corte proposto?
São previstos cortes de R$ 1,7 bilhão no orçamento de mais de 15 ministérios. Do total, são R$ 500 milhões em saúde (dos quais R$ 70 milhões iriam para o Farmácia Popular, que oferece remédios gratuitos à população), R$ 380 milhões em infraestrutura e desenvolvimento (que inclui obras de saneamento e corte de R$ 70 milhões do Minha Casa Minha Vida) e R$ 280 milhões em educação.
Como o fundo é distribuído?
A distribuição do fundo público para campanha entre os partidos acontecerá da seguinte forma nas próximas eleições:
2% distribuídos igualmente entre todas as legendas registradas
35% consideram a votação de cada partido que teve ao menos um deputado eleito na última eleição para a Câmara
48% consideram o número de deputados eleitos por cada partido na última eleição, sem levar em conta mudanças ao longo da legislatura
15% consideram o número de senadores eleitos e os que estavam na metade do mandato no dia da última eleição
Houve uma mudança recente da divisão do fundo. Antes, o que valia era o tamanho das bancadas na última sessão legislativa do ano anterior à eleição (o que contou em 2018 foi a bancada no fim de 2017). Agora, conta o resultado da eleição.
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