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Os pedágios são lesivos

‘Os pedágios são lesivos’

 

Especialista diz que o serviço é caro, ineficiente e que não corresponde ao valor desembolsado pelos motoristas

 

ROBERTO CARLOS DIAS

 

Caxias do Sul O 2º Fórum Nacional de Usuários de Rodovias Pedagiadas, que ocorre entre hoje e amanhã na Câmara de Vereadores, promete munição extra para incentivar a comunidade e entidades a fazer valer seus direitos, cobrando das concessionárias a execução de obras previstas nos contratos.

 

Essa será a linha defendida pelo primeiro painelista, o engenheiro Cloraldino Severo, 68 anos, ex-ministro dos Transportes e consultor da área de transportes. O palestrante, que não tem filiação partidária, abre a conferência, às 9h30min de hoje. Os organizadores esperam a participação de 200 pessoas nos debates e painéis. No encerramento, programado para as 12h30min de amanhã, será apresentada uma carta aberta que será encaminhada às autoridades. A seguir, os principais trechos da entrevista com Severo.

 

Pioneiro: Qual a avaliação que o senhor faz dos pedágios no Brasil?

Cloraldino Severo: É uma questão complexa porque existem diferenças entre os pedágios de auto-estrada e de pista simples. Nesse último, o Rio Grande do Sul e Paraná são exemplos típicos. A experiência nesses dois estados não pode ser pior e é altamente lesiva ao consumidor. Os pedágios são caros, ineficientes e o que se faz de serviços é nada em relação ao que se cobra. Não há nenhuma relação entre serviços prestados e o valor da tarifa. Se fosse feito de outra forma, como os pedágios comunitários, os custos seriam bem mais baixos, como ocorre hoje em Portão. A cobrança de pedágios em pista simples e sem alternativa é uma coisa que só se faz no Brasil e em países menos desenvolvidos.

 

Qual a posição do Brasil e do Rio Grande do Sul em termos de estradas pedagiadas?Severo: Nos Estados Unidos, 0,2% das estradas são pedagiadas. Na Europa, 0,4%. Na América Latina, 7,3%. No Brasil, temos 5,6% da malha rodoviária pedagiada, e no Rio Grande do Sul, 23,2%, uma coisa completamente despropositada. É absurdo o que o corre no Estado. Está se penalizando a economia e a sociedade com pedágios de vias simples, situação que não ocorre no exterior. Não há dúvida que temos um excesso de pedágios. Em segundo lugar, não se atende aos interesses dos usuários. Ninguém olha os contratos das concessionárias, que não estão fazendo o que se comprometeram fazer. Quebraram os contratos há muito tempo. As estradas da Serra são um exemplo disso.

 

Na quebra de contrato colocada pelo senhor, o governo poderia romper com as concessões sem pagar indenizações milionárias?

Severo: É possível se fazer ações judiciais sobre outros aspectos. Em nenhum momento, até onde sei, invocou-se a questão do Código de Defesa do Consumidor. Os contratos do Rio Grande do Sul são explícitos quanto à aplicação da lei de defesa do consumidor. Então, todo o aumento de tarifa sem causa, justificada sob o ponto de vista do consumidor, é ilegal. Todos os usuários precisam começar a andar com o Código de Defesa do Consumidor em mãos e ir para a Justiça para corrigir essas tarifas, que são absurdamente altas. O fato de as concessionárias não terem feito serviços que se comprometeram e manterem tarifas e reajustamento abusivos já são motivos de caducidade dos contratos. A questão é que o governo não se resolveu para ouvir os usuários.

 

Onde estaria a falha dos governantes para corrigir essas distorções?

Severo: Na fiscalização. O que falta até hoje é governo, independentemente de partidos. Os pedágios não são fiscalizados adequadamente pelo Daer (Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem) e pela Agergs (Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados ao Rio Grande do Sul), e as revisões de tarifas são um verdadeiro espanto. As pagas hoje são maiores do que o contrato previa. As estradas se mantiveram com o traçado original, sem duplicação e outras obras importantes. O muito que fizeram foram manutenções.

 

Uma ação de governo mudaria o cenário?

Severo: Os governos não têm cuidado dos interesses da sociedade. Se quisessem, seria diferente. As cidades de Caxias do Sul e Viamão são duas exceções positivas no Estado, que têm se mantido atuantes na discussão das questões envolvendo pedágios. Os deputados do Rio Grande do Sul não prestam atenção nas questões de interesse dos usuários. Não falo isso de hoje. Tenho falado desde o início desses processos, tanto que o governo federal já começa a reconhecer os apontamentos feitos por nós sobre as concessões rodoviárias de estradas federais. Hoje, o governo federal tem licitações para entregar a concessão de 3,1 mil quilômetros de estradas federais à iniciativa privada e 634,4 quilômetros na Bahia por meio da PPPs (parcerias público-privadas). Essas questões estão em discussão.

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