Eliane Cantanhêde
A Turquia, um dos países mais fascinantes do mundo, sofre um real golpe de estado: tanques nas ruas, soldados e policiais guerreando, civis recrutados, centenas de mortos, tudo empurrando o país para tempos nebulosos e atraindo recriminações internacionais. Como o Brasil, o país foi ao céu e desceu ao inferno, mas por motivos bem diferentes. Só por má informação ou má-fé tentariam usar a ruptura democrática lá para reavivar a tese do golpe cá. Um golpe militar é o oposto de um impeachment institucional.
De comum, foi-se o tempo em que um orgulhoso Brasil e uma Turquia com prestígio político em alta se deram as mãos para um salto ousado: a mediação, em 2010, entre Irã e o mundo desenvolvido, na busca de uma solução para o programa nuclear iraniano. A ONU jogou um balde de água fria na articulação (para mais tarde patrocinar um acordo semelhante), mas Brasil e Turquia pelo menos tinham espaço para agir. E agora, o que sobrou do orgulho e da pretensão de ambos?
E o mundo rico não está melhor. A França acaba de cometer uma indiscrição, ao dizer publicamente que o Estado Islâmico preparava um atentado contra a delegação francesa na Olimpíada do Rio, esquecendo-se de avisar ao principal interessado: o governo brasileiro. E, enquanto se preocupava com o Brasil, o inimigo dormia ao lado.
País símbolo de liberdade, igualdade e fraternidade no mundo moderno, a França acaba de sofrer dois dos mais cruéis e covardes atentados, um em Paris, com 129 jovens mortos, e outro agora em Nice, exatamente na festa do 14 de julho, matando mais de 80 jovens, velhos, adultos e crianças. No mínimo, a inteligência e as forças militares e de segurança francesas estão levando um banho (de sangue) do Estado Islâmico e até de malucos que podem ou não agir por grupos terroristas ou crenças desvirtuadas. Mas ela não está sozinha.
O que dizer do 11 de Setembro, que atingiu as Torres Gêmeas, o coração e a alma da maior potência mundial? E do ataque a uma casa noturna LGBT em Orlando, também nos EUA, que pode ter sido um ato solitário ou uma ação coordenada com o terrorismo internacional?
Também não podem atirar a primeira, nem a segunda, nem a terceira pedras contra as mazelas brasileiras a Bélgica, a Indonésia, o sofrido Paquistão e a pouco conhecida Burkina Faso, todos eles alvos de atentados que mataram e feriram centenas de pessoas neste ano, que mal chegou à metade. A própria Turquia não passou incólume a isso. Foram dois atentados graves desde janeiro, um em Ancara, assumido por um grupo curdo radical, outro no aeroporto da linda Istambul, atribuído ao EI.
Ao largo do terrorismo, vieram o Brexit, que jogou a União Europeia e o Reino Unido no escuro, e ameaça Donald Trump, que está empatado com Hillary Clinton nos EUA, para confirmar que o mundo anda mesmo de pernas para o ar, com excesso de ataques terroristas e uma dramática falta de grandes líderes. Trump, Berlusconi, Sarkozy?! Portanto, calma lá antes de falarem mal do Brasil.
O Brasil deixou até de ser “o país do futebol”, voltou a ser o dos tiroteios urbanos, baías contaminadas, zika, dengue, chikungunya e H1N1 e ganhou um acréscimo: o campeão da corrupção – pelo menos até que os demais deflagrem também suas Lava Jatos. Só falta a Olimpíada atrair um inédito ataque terrorista. Mas quem mesmo pode atirar a primeira pedra? Aliás, se depender dos órgãos de inteligência dos países ricos, é melhor a gente rezar. Ou chorar.
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