O Minha Casa Minha Vida injetou bilhões neste segmento, mas continuaram problemas como baixa qualidade dos imóveis e falta de infraestrutura
Já era tempo de o poder público, em todos os níveis, haver aprendido a maneira de formular e executar programas habitacionais eficientes para famílias de baixa renda. Mas erros se sucedem, principalmente na qualidade dos imóveis, falta de infraestrutura e na localização dos projetos, quase sempre distantes de tudo — devido ao preço baixo dos terrenos, é certo.
Essas mazelas já haviam sido identificadas em governos do extinto Estado da Guanabara, nas gestões de Carlos Lacerda (1960-65) e Negrão de Lima (1965-70), época das remoções de favelas da Zona Sul para áreas distantes, na Zona Oeste.
As remoções eram inevitáveis, pela degradação de bairros como Botafogo, Lagoa e Leblon, para citar os casos mais gritantes, e também devido às condições insalubres e de insegurança das favelas. Mas a transferência de milhares de pessoas para a então longínqua Zona Oeste (Cidade de Deus, Vila Kennedy), sem transporte público, saneamento etc. reproduziu o modelo de guetos sul-africanos. E suspender as remoções apenas preservou problemas, que explodem hoje por todos os lados.
A inflação — mortal para qualquer financiamento de longo prazo, como o habitacional — ressurgiu no final da ditadura militar, inviabilizando o Sistema Financeiro de Habitação e o BNH. Houve avanços na faixa de classe média, mas se mantiveram as dificuldades para famílias de renda mais baixa.
Depois do Plano Real, com a inflação domada, voltaram as condições macroeconômicas para a retomada do financiamento de moradias populares. Desde a estabilização, o programa mais importante é o Minha Casa Minha Vida. Lançado pelo governo Lula em 2009, já movimentou R$ 388,8 bilhões, dos quais 21,4% (R$ 83,4 bilhões) para a faixa de famílias com renda mensal de até R$ 1,8 mil, em que o imóvel é quase integralmente subsidiado com dinheiro público, pagando os compradores prestações de até 15% da renda familiar, por uma década.
Mas faltam recursos para esta faixa de renda, os mais pobres, segundo revelação de reportagem do GLOBO. Dados obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação revelam que, de janeiro a outubro do ano passado, apenas 0,5% dos R$ 56,7 bilhões movimentados pela MCMV, ou R$ 279 milhões, atenderam ao contingente de até R$ 1,8 mil de renda mensal.
E com a recessão do biênio 2015/2016, o déficit habitacional, que foi estabilizado durante alguns anos na faixa de 5,5 milhões a 6 milhões de moradias, certamente aumentou. Deve-se ainda considerar o efeito brutal do desemprego sobre a renda das famílias, incapazes de arcar com qualquer nova despesa.
Questões conjunturais referentes à renda das famílias somam-se aos problemas de sempre, que se eternizam, conforme mostrado na reportagem: imóveis de baixa qualidade, insalubres, sem acesso fácil aos serviços urbanos usuais, como escolas, postos de saúde, transporte público. Parece lógico que a velha equação da habitação para famílias pobres requer uma solução multidisciplinar, que contemple a solução de questões em todas essas áreas.
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