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O plano dos reféns de Lula

José Casado, O Globo

O Partido dos Trabalhadores definiu sua estratégia para a campanha presidencial de 2018: “Eleição sem Lula é fraude”. Com essas cinco palavras o PT traduz sua expectativa sobre a virtual interdição do ex-presidente, numa eventual condenação em segunda instância por corrupção e lavagem de dinheiro. O julgamento da apelação de Lula contra a sentença do juiz Sergio Moro está marcado para 24 de janeiro, em Porto Alegre.

No último fim de semana, em São Paulo, dirigentes do PT traçaram um projeto para 2018 baseado na ratificação da condenação.

A premissa do plano é a construção da imagem de Lula na campanha como vítima de um sistema judicial manipulado pela “elite” para “impedir o povo de elegê-lo mais uma vez”, descrevem documentos internos.

Refém de Lula, o partido resolveu:

a) questionar a legalidade da disputa sem a eventual participação do ex-presidente;

b) contestar a legitimidade do presidente escolhido numa eleição sem o candidato petista;

c) estimular o “voto de protesto” em candidato indicado por Lula, seu principal cabo eleitoral;

Ontem, o PT anunciou uma virtual intervenção nos 26 diretórios estaduais e do Distrito Federal. O comunicado foi cristalino: “Fica desde já estabelecido que toda e qualquer definição de candidaturas e política de aliança nos estados terá que ser submetida antecipadamente à Comissão Executiva Nacional.”

Apostando num cenário eleitoral convulsionado, o alto-comando petista julga conveniente se preparar para a “crescente agressividade”, como define. Sob estímulo do ex-capitão de Lula, José Dirceu, recolhido em Brasília depois de condenado à prisão no mensalão e na Lava-Jato, abriu-se espaço até para formulações sobre confronto à “alternativa fascista” nas ruas.

Antes da reunião em São Paulo, Dirceu evocou o estilo retórico do movimento estudantil dos anos 60: “A hora é de ação não de palavras, transformar a fúria e revolta, a indignação e mesmo o ódio em energia, para a luta e o combate.” O PT vai realizar um “dia de revolta” em Porto Alegre.

Para a campanha, a radicalização teria como protagonistas grupos de “reação”, discretamente organizados. A iniciativa avança sob uma justificativa partidária oficial: a de que a eleição, sem Lula, “poderá resultar em rebeldia popular” e “desobediência civil”.

O plano dos generais petistas guarda alguma coerência com a necessidade de manter alinhados os grupos que fracionam o PT, o PCdoB e o PSOL, e os pragmáticos PDT e PSB.

Sob esse arco-íris encontra-se parte substantiva dos 34% do eleitorado que indica intenção de votar em Lula — principalmente, como reação aos que se mantêm no outro extremo, com Jair Bolsonaro, com 19% da preferência, segundo o Datafolha. As mesmas pesquisas indicam média de 40% de rejeição a Lula há 12 meses seguidos.

Entre o ex-metalúrgico e o ex-paraquedista prevalece a maioria de 47% de eleitores insatisfeita e em busca de alternativa. Sua fragmentação pode levar a uma situação semelhante à do Rio, como tem repetido o ex-ministro Nelson Jobim aos clientes do banco BTG Pactual. Em 2016, Marcelo Crivella, ex-senador do PRB e ex-bispo da Igreja Universal, venceu Marcelo Freixo, do PSOL, apoiado por uma frente autodenominada de esquerda.