Editorial, Estadão
Na quinta-feira passada Lula da Silva foi se queixar à ONU de que está sendo perseguido no Brasil pelo juiz Sérgio Moro. Se tivesse esperado mais algumas horas, poderia ter incluído na reclamação o juiz substituto da 10.ª Vara Federal do Distrito Federal, Ricardo Leite, que teve a ousadia de, na sexta-feira, transformá-lo em réu por tentativa de obstruir investigação da Lava Jato. O chefão do PT perdeu, assim, uma excelente oportunidade de enriquecer a fabulação apresentada à Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas e ao mundo, de que está sendo vítima de uma conspiração da Justiça brasileira e outras forças do mal para impedir seu retorno à Presidência da República em 2018. O ex-presidente que logrou a proeza de conciliar a condição de protetor universal dos fracos e oprimidos com a de amigo do peito de banqueiros, empreiteiros e oportunistas de outras extrações, foi pego de surpresa por sua estreia na condição de réu, mas tentou disfarçar fazendo troça: “Se o objetivo é me tirar de 2018, isso não era necessário. A gente poderia escolher outro candidato”.
Pelo andar da carruagem, Lula pode ir preparando novos habeas corpus preventivos como o que tentou criar à custa da ONU, bem como outras tiradas de pretenso humor para mostrar que nada o faz perder a pose, porque a denúncia do juiz de Brasília que o tornou réu pode ser a primeira de uma série que faria jus a sua bem-sucedida carreira de chefão da quadrilha que nos últimos anos se dedicou a assaltar os cofres públicos como nunca antes na história deste país.
O exemplar trabalho de investigação criminal simbolizado pela Operação Lava Jato está na iminência de corrigir a enorme injustiça cometida pelo julgamento do mensalão. Naquela época, colocou-se na cadeia apenas o estado-maior do escândalo de corrupção, poupando-se o verdadeiro chefe da quadrilha, que passou a dedicar-se a projetos mais ambiciosos, como o petrolão.
Se existe hoje alguma unanimidade entre os brasileiros, é a de que a corrupção é o maior problema do País, até porque está na raiz do descontrole das contas públicas que precipitou a recessão econômica com todas as nefastas consequências sociais. A corrupção, que era renitente, mas episódica, atingiu nos governos petistas nível sem precedentes. A Lava Jato o comprova.
Mas é a corrupção dos valores políticos, imposta pelo populismo irresponsável do lulopetismo, a razão principal do desastre que o País vive. Com seu verbo fácil e sedutor embalado pelo marketing social de programas de grande apelo popular, mas, como restou provado, sem sustentabilidade econômica, Lula conseguiu por alguns anos manter a pose de campeão das causas populares e vender no exterior a versão de que tinha acabado com a fome e as desigualdades no Brasil.
Megalômano e, como tal, apegado às aparências – marca inconfundível do populismo –, Lula dedicou-se à construção de um país à sua imagem e semelhança: um gigante com pés de barro. Avesso ao estudo, ao qual jamais se dedicou, guiou seus passos pela intuição e sensibilidade, que deram substância a sua condição de político esperto, e transferiu para seus principais programas de governo os valores que cultivou ao longo de sua formação.
Como líder sindical, aprendeu que não é o entendimento, mas o confronto, que garante conquistas. E passou a aplicar esse princípio vida afora, dividindo o País entre “nós” e “eles”.
Como presidente, enquanto tecia uma teia de relacionamentos que viriam a pavimentar sua própria escalada social, Lula tratou de oferecer aos brasileiros de baixo poder aquisitivo aquilo que entendia que eles mais precisavam: crédito farto e fácil. Quando a farra acabou, os “milhões de brasileiros que ascenderam à classe média” se deram conta de que haviam comido todo o peixe e não sabiam como pescá-lo.
Por esse crime Lula já está pagando com a vertiginosa queda de seu prestígio popular. Pelos previstos na lei penal, terá que se haver com a Lava Jato.
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