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O golpe das refinarias do Dr. Costa

O golpe das refinarias do Dr. Costa

Claudio Dantas, IstoÉ

Como o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, solto na semana passada, planejava criar quatro refinarias de papel e captar mais de R$ 1 bilhão para, depois, negociá-las no mercado financeiro

Dois meses antes de ser preso pela Polícia Federal na Operação Lava-Jato, o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa articulava um golpe para captar mais de R$ 1 bilhão num prazo de dois anos. O plano era criativo. Vendendo sua afamada influência na Petrobras, Costa alardeava em reuniões com políticos e empresários do setor que criaria quatro pequenas refinarias de petróleo em posições estratégicas ao lado de campos de exploração da estatal no continente. Ele dizia se tratar de um negócio bom para ambas as partes. Sem precisar transportar o óleo desses campos de baixa produção para refinarias distantes, a Petrobras economizaria em logística. Costa, com seus eventuais parceiros, além de embolsar bilhões de reais, entraria num nicho de mercado restrito com possibilidade de revender o combustível refinado de volta a Petrobras.

Ao investigar o caso, porém, a Polícia Federal passou a desconfiar que tudo nessa operação seria um teatro. Primeiro porque os investigadores descobriram que um dos parceiros de Paulo Roberto Costa na empreitada era dono de uma empresa de energia que aplicou golpe semelhante, criando usinas eólicas de fachada, depois de captar recursos públicos e privados. Além disso, a PF afirma não ter encontrado indícios de que a presidente da Petrobras, Graça Foster, tivesse demonstrado qualquer intenção de dar aval à parceria acalentada por Costa. Com isso, a PF suspeita que as refinarias de Costa serviriam de fachada para o esquema de lavagem de dinheiro comandado pelo doleiro Alberto Youssef.

Os indícios do golpe surgiram com a apreensão, na residência de Costa, dos contratos das minirrefinarias, de termo de associação a um exclusivo fundo de investimentos e de planilhas que indicam o pagamento de comissões a executivos ligados ao projeto. Pela papelada apreendida, Costa negociava a instalação de quatro refinarias nos Estados de Sergipe, Ceará, Alagoas e Espírito Santo. O projeto começou no ano passado e as refinarias já tinham nome e orçamento padrão – Refinaria Sergipana, Capixaba, Alagoana e Cearense. Cada uma custaria em torno de R$ 120 milhões por módulo, com produção de 5 mil barris/dia e expectativa de rentabilidade de R$ 480 milhões. O maquinário seria importado da China ou dos Estados Unidos.

Todas estas unidades pré-moldadas ficariam ligadas a uma empresa “guarda-chuva”, a Refinaria de Petróleo do Brasil (REF Brasil), em sociedade com a mulher de Paulo Roberto Costa, Marici Costa.

Apesar do desinteresse da Petrobras, segundo a PF, Costa seguiu em frente com o projeto e, em 13 de janeiro, assinou memorando de entendimento com o governador de Sergipe, Jackson Barreto (PMDB), para criação da Refinaria Sergipana. Houve até um ato público para comemorar as tratativas. No mesmo mês, Costa negociou a instalação de uma refinaria no Espírito Santo com o secretário de Desenvolvimento do Estado, Nery de Rossi, um ex-colega da Petrobras, e em Alagoas com o secretário de Planejamento local, Luiz Otavio Gomes, ex-assessor de PC Farias, o tesoureiro do ex-presidente Fernando Collor.

Uma análise da complexa engenharia financeira montada por Youssef feita pela PF, à qual ISTOÉ teve acesso, sugere, no entanto, que o objetivo principal de Costa seria negociar o ativo das refinarias no mercado. “Tudo indica que o plano era apenas criar um ativo de papel para ser revendido a empresas parceiras, como empreiteiras, e negociá-lo também no mercado financeiro, captando recursos públicos e privados que depois seriam enviados a empresas offshores sediadas em paraísos fiscais”, explica um dos investigadores.

Para chegar a essa conclusão, a PF se baseou nos contratos sociais dos projetos de refinarias de Costa. Nos contratos, a administração geral das refinarias é compartilhada entre Costa e o empresário Francisco José Machado de Sant’Anna, um dos donos do grupo Energio Energias Renováveis. O outro dono da Energio é Rubens Andrade, sócio do doleiro Alberto Youssef na CSA Finance Project.

Ao se debruçar nas contas da Energio, a PF descobriu que a empresa, antes do projeto das refinarias, montou esquema parecido no setor de energia eólica. Criou 40 usinas “de prateleira”, obteve em tempo recorde as licenças de operação para várias delas junto à Aneel e, mesmo sem apresentar os documentos requeridos por lei, conseguiu a inclusão dos projetos no regime de incentivos fiscais do governo federal por meio de portaria assinada pelo secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Zimmermann. Com as licenças em mãos, a Energio fechou acordos de venda de energia futura com a Câmara de Comércio de Energia Elétrica (CCEE).

Mesmo sem ativos de garantia, conseguiu ainda um empréstimo de R$ 433 milhões junto ao Banco do Nordeste (BNB), além de enquadramento de financiamento de outros R$ 525 milhões na SUDENE (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste). Apesar do dinheiro em caixa, a Energio não construiu as centrais eólicas, da mesma maneira que, conforme suspeita a PF, as refinarias de Costa não sairiam do papel. Embora não tenha levantado as usinas, os projetos da Energio interessaram à Queiroz Galvão, que não só adquiriu as centrais como os contratos de venda de energia, por um montante de R$ 200 milhões, pagos em parcelas. O negócio teve aprovação do CADE. A Queiroz Galvão, no entanto, também não concluiu as obras das centrais eólicas, que deveriam ter ficado prontas em 2012. A PF suspeita que o dinheiro entregue pela Queiroz Galvão à Energio possa ter abastecido o esquema de Alberto Youssef e contas bancárias de políticos envolvidos. Dois representantes da Queiroz Galvão foram arrolados no inquérito da Lava-Jato.

Outro elo entre as refinarias de papel de Costa e a Energio seria o fundo de investimentos TOTEM FIRF. No balanço da empresa, a PF encontrou milhões em recursos aplicados neste fundo. Curiosamente, o fundo TOTEM também aparece como “investidor” do projeto de minirrefinaria do Ceará, ao lado da Energio. Segundo a PF, há um padrão de atuação do grupo. Seus sócios estão sempre ligados a corretoras de valores, fundos de investimento com operação offshore e holdings de administração de bens, uma teia que mescla operações absolutamente legais com outras duvidosas.