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O adeus de Very Well

Alan Marques/Folhapress / José Henrique Nazareth, o “Very Well”, de 78 anos: ele ganhou o apelido ao arriscar-se no inglês com jornalistas estrangeiros

da Gazeta do Povo

De 1961 até hoje, já passaram pelo Planalto 11 presidentes. Dilma Rousseff agora é a 12.ª inquilina do palácio. Nesse período, o país foi uma democracia. Virou uma ditadura com o golpe de 1964. Redemocratizou-se. E, por meio de eleições, redescobriu o que é a alternância pacífica de poder. Dificilmente alguém conseguiria estar perto do poder com governos tão diferentes. O servidor José Henrique Nazareth, o “Very Well”, de 78 anos, teve esse privilégio. Foram 51 anos de trabalho ininterrupto no Palácio do Planalto e uma coleção de “causos” para contar. Uma trajetória que ele decidiu encerrar no fim do mês passado para aproveitar a aposentadoria.

Very Well começou a trabalhar no Planalto como contínuo, em 1961, no governo de Jânio Quadros. Nas cinco décadas de serviço público, chegou ao posto de secretário do Comitê de Imprensa da Presidência. Foi lá que conquistou o apelido pelo qual é conhecido.

O jeito expansivo e alegre do mineiro de Brazópolis cativava os jornalistas. E, sempre buscando ser simpático com os correspondentes estrangeiros que buscavam notícias dos presidentes brasileiros, ele se arriscava a falar inglês. “No Comitê, sempre vinha muito jornalista americano, italiano, gente de tudo quanto é lugar. E eu sempre gostei de servir, oferecia cafezinho, um ‘coffee’, e acabava aprendendo alguma coisa: ‘How are you? Fine, thank you’,”, explica Nazareth. Assim, acabou virando o Very Well (“muito bem”, em inglês).

Jango, o favorito

De todos os presidentes que viu passar pelo Planalto, Very teve mais contato com João Goulart, pois trabalhou como contínuo de seu gabinete. Jango também foi seu presidente “favorito”. “Ele era demais”, diz o servidor, elogiando a simpatia de Jango. Segundo Very, Jango era generoso. “Pediam muito apartamento para ele [era o atrativo do governo para trazer servidores para a nova capital]. Ele não negava. Quando tinha, dava.”

Very estava trabalhando no dia do golpe militar que derrubou Jango. E, apesar da simpatia que nutre pelo presidente derrubado, ele evita falar sobre a ditadura. “Converso sobre os militares outro dia “, diz. Ainda assim, contou um “causo” que revela um lado menos duro daqueles anos de chumbo. Já no governo do sisudo marechal Castelo Branco, Very trabalhava na secretaria particular do Gabinete Civil quando foi surpreendido durante um cochilo na hora do almoço pelo próprio presidente. “Quando vi o presidente ali, levei um susto. Ia sair correndo, mas ele não brigou. Disse ‘Calma, rapaz’, e me deu um tapinha nas costas.”

Lula, o mais aberto

Dos 12 presidentes que passaram pelo Planalto no período da carreira de Very Well, apenas um o recebeu para uma conversa mais longa: Luiz Inácio Lula da Silva, que reservou 30 minutos na agenda para receber o servidor. Segundo Very, os presidentes, em geral, sempre “se fecham” e não dão muito papo para os funcionários subalternos. Lula, diz ele, era o mais aberto e o que mais recebia servidores.