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Nova conjuntura, nova CPI

Nova conjuntura, nova CPI

Editorial, Estadão

Menos de dois meses depois de duas comissões de inquérito destinadas a investigar o escândalo da Petrobrás terem terminado em pizza no Congresso Nacional, abrem­-se agora perspectivas mais promissoras de que os parlamentares consigam finalmente usar as ferramentas legais de que dispõem para cumprir sua missão constitucional de fiscalizar o governo. Na quinta­-feira foi criada na Câmara dos Deputados uma nova Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) com a mesma finalidade. E a oposição está coletando assinaturas para criar no Senado uma comissão mista (CPMI) de senadores e deputados com igual objetivo.

A CPI da Câmara pode ser considerada o primeiro efeito prático da condução à presidência da Casa de um parlamentar que, apesar de pertencer ao maior partido aliado do governo petista, o PMDB, é considerado “inimigo” por Dilma Rousseff, que contra sua candidatura mobilizou todo o poder de fogo do governo, numa desastrada operação. A instalação da nova CPI da Petrobrás decorreu naturalmente da nova conjuntura de maior autonomia política que a falta de habilidade da presidente da República contribuiu decisivamente para criar no Parlamento, em particular na Câmara dos Deputados.

O presidente Eduardo Cunha não fez mais do que, como prometera, dar curso a um processo regimental deflagrado no momento em que a oposição obteve assinaturas suficientes ­ 182, sendo 52 delas de deputados da base governista ­ para formalizar o pedido de instalação da CPI. E o mesmo deverá ocorrer brevemente no Senado. Não é com isso que Dilma e o PT sonham, mas é o que mais convém à institucionalidade democrática.

A possibilidade de que as novas CPIs produzam contribuição mais importante para a apuração do maior escândalo de corrupção da história da República resulta do fato de haver, dois meses depois de terminados os trabalhos das comissões anteriores, dois importantes fatores novos a condicionar o momento político.

Primeiro ­ como ficou claro com a esmagadora vitória de Eduardo Cunha na Câmara e a inesperadamente disputada eleição de Renan Calheiros no Senado ­ a qualidade da relação do Parlamento com o Executivo mudou sensivelmente, seja porque nesta nova legislatura o perfil dos parlamentares é mais conservador, seja porque Dilma Rousseff continua demonstrando uma rara incompetência para conquistar a confiança e o apoio até mesmo daqueles que teoricamente seriam seus aliados mais próximos. Assim, fica mais difícil manter a pizzaria do Congresso funcionando.

Além disso, desde dezembro a ação conjunta da Polícia e do Ministério Público federais nas investigações da Operação Lava Jato, bem como o desenvolvimento desse trabalho no âmbito do Judiciário, evoluíram a ponto de estimular na opinião pública o sentimento de que, como ocorreu no caso do mensalão, haverá condenação dos envolvidos: funcionários da estatal, intermediários, operadores e agentes públicos, especialmente políticos. E os parlamentares são normalmente muito sensíveis à direção do vento.

Por outro lado, não se pode deixar de levar em conta que muitos senadores e deputados têm, eles próprios, o rabo preso nas investigações em curso. Destes, certamente, não se poderá esperar grande entusiasmo numa apuração rigorosa dessa farra da propina. Eles tenderão a se afastar da maioria, assim que os fatos que os incriminem começarem a ser divulgados.

Cabe observar ainda que o clima predominante no Congresso no fim do ano passado, ainda sob o efeito da reeleição da presidente da República, desencorajou a oposição a cogitar da cobrança das responsabilidades políticas de Dilma Rousseff pelas desventuras da Petrobrás. Afinal, ela era presidente do Conselho de Administração da estatal por ocasião da controvertida compra da Refinaria de Pasadena e foi ela mesma, já como chefe do governo, que levou a crise para dentro do palácio ao alegar que a decisão da compra fora tomada pelo Conselho com base num relatório “falho e incompleto” da diretoria da Petrobrás. Sem falar nas decisões administrativas que causaram milionários prejuízos à estatal.A fragilidade política de Dilma certamente estimulará a oposição a jogar mais pesado ­ e os aliados pouco comprometidos a abandonar o barco enquanto é tempo. Pois assim é a natureza dos homens.