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Na marcha dos invisíveis

por Márcio Renato dos Santos

O meu tataravô abandonou a Europa e, durante a viagem de navio, enunciou algo que passou de avô para mãe e chegou até os meus ouvidos: “Não quero que ninguém da família volte para aquele lugar [a Europa]. Passei fome lá. A vida de vocês será nesse mundo novo”.

Meu passaporte é quase virgem. Mas as páginas de Enrique Vila-Matas me transportam para a Espanha. Balzac me revela a França. Conheço até a asiática Rússia, não devido aos vermelhinhos daqui, mas nas 2.528 páginas de Guerra e Paz. Estou satisfeito. Deixo a vaga em hotéis, restaurantes e filas no continente europeu para os mais animados.

A minha avó Francisca viveu 95 anos e, antes do penúltimo suspiro, me revelou: “Marcio, o segredo da longevidade é não fazer nenhum exercício físico. E comer todo dia três colheradas de açúcar”. Respeito a orientação dos antepassados, e nem cogito desobedecer. Caso contrário, uma maldição se deflagrará e posso vir a sofrer um AVC, um infarto ou, ai de mim, sair pedalando por aí.

Não é necessário se ausentar de Curitiba e, de avião (de bicicleta?), atravessar o Atlântico para, enfim, descobrir que a Europa é diferente daqui. As baitacas que aqui chalreiam não chalreiam como lá. Chalreiam? Lá, o mundo é outro. Sim, aqui não é lá.

Basta ler dois, três, quatro romances para se dar conta de que o homem e a mulher são os mesmos, lá e cá. É a ficção, talvez mais que o deslocamento físico, que pode iluminar. Tudo. Os hooligans e os intolerantes de lá não diferem tanto dos prepotentes e dos equivocados de cá. Sigo, seguirei sedentário em Curitiba, e pelo interior do Paraná. Não gostaria de impor o meu comportamento e as minhas opções para outras pessoas.

Faz sete dias que querem que eu circule com martelo e foice, ou melhor, de selim e guidão em punho. Também pretendem mostrar como são cosmopolitas ao citar cases de sucesso de Londres, Copenhague e Estocolmo – exemplos de lá que poderiam ser implementados aqui. Ninguém respondeu se é possível sair do Sítio Cercado e pedalar 17 quilômetros até o Centro de Curitiba e, depois do trabalho, ativar sobre duas rodas de volta para casa – entre outras questões. Os sofistas só querem, com retórica vazia, a polêmica pela polêmica e – pior – linchar quem tem outro ponto de vista.

Vocês vão por ali? Não, obrigado. Pedestre, vou por aqui. Inclusive, a desviar de algumas Marchas, da Marcha do Orégano e da Marcha das Piriguetes. Tem alguém capitalizando em cima desses ativistas inoperantes e movimentos sociais inócuos. Vou sozinho. Na marcha dos invisíveis. Tchau!