Mesmo sem impedimentos , APPAD tem o título de utilidade pública negado pela Câmara
Integrantes do Movimento LGBT avaliam como positivo o resultado com apenas cinco votos de diferença – Em setembro, Curitiba vai sediar a primeira Parada Latino-Americana
“Nós consideramos esse momento uma vitória. Por dois dias os parlamentares debateram o tema. E para nós, a argumentação dos vereadores favoráveis ao projeto teve um nível político de países de primeiro mundo. Infelizmente, a decisão final é que continua nos classificando como subdesenvolvidos. Mas foram poucos votos de diferença”. A fala de Márcio Marins, presidente da Associação Paranaense da Parada da Diversidade, expressa a opinião de várias outras lideranças do movimento social de Curitiba. A declaração foi dada logo após a finalização da votação do Projeto de Lei para concessão do título de Utilidade pública à APPAD.
Com uma diferença de cinco votos (18 contrários e 13 a favor, fora as abstenções), contabilizados pelos próprios integrantes do movimento, o PL foi a primeira negação a um título de utilidade pública da história da Câmara Municipal de Curitiba, de acordo com as falas dos vereadores.
Estiveram presentes na sessão os seguidores do Pastor Valdemir Soares, a maioria jovens evangélicos com camisetas da igreja. Do outro lado, cidadãos integrantes dos mais diversos movimentos sociais de defesa dos direitos humanos de mulheres, negras(os), da infância e adolescência e de representantes dos segmentos de lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e travestis. Representando outras instâncias do legislativo, esteve presente o deputado federal Doutor Rosinha e a APPAD também recebeu o apoio da senadora Fátima Cleide, presidente da Frente Parlamentar LGBT. O executivo municipal foi representado pela assessora do vice-prefeito Luciano Dutti, Valderez Hallu, e a coordenadora municipal DST/AIDS, Mariana Tomás, e o movimento social pela Terra de Direitos, Cebrapaz, Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/AIDS, Sismuc, Coped, entre outros. Também estava presente o presidente da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais, Toni Reis, que antecipou a informação sobre a realização, em setembro desse ano, da primeira Parada Latino-Americana e Caribenha em Curitiba, durante o 5ª Conferência Internacional da Ilga-LAC (Internacional Lesbian, Gay, Bisexual, Trans and Intersex Association – para América Latina e Caribe).
“São pessoas com direitos iguais. Votar contra é preconceituoso, anti-ético e anti-social. Isso é importante para que a gente possa viver bem numa mesma sociedade” – Lindaci Rodrigues de Souza Soares, 49 anos, mãe, educadora e dirigente do Sindicato dos Servidores Municipais de Curitiba
Os argumentos do vereador Algaci Túlio, favoráveis ao projeto, embasaram-se em documentos como a Bíblia, a Constituição Brasileira e Paranaense e nos princípios da Revolução Francesa de Igualdade, Fraternidade e Liberdade. Indignado, disse que o projeto não está sendo votado por critérios legais, e sim religiosos. “Não estamos debatendo a essência do projeto, estamos aqui por conta de alguns devido às suas convicções religiosas”, esclareceu. De bancada distinta, mas com opinião convergente, o vereador Pedro Paulo argumentou que a APPAD “é uma instituição que tem um trabalho reconhecido na área de DST/AIDS”.
“Eu avalio isso como o retrato cruel da ‘vida como ela é’. Os religiosos fundamentalistas estão avançando em diversos segmentos e impondo princípios dogmáticos, que ferem, na maior parte das vezes, muitos cidadãos e cidadãs LGBT. Precisamos de uma ação rápida para forçar o legislativo e executivo a funcionar pelo princípio laico. Aquela sessão traduz aquilo que nós sofremos no dia-a-dia” – Igo Martini, presidente do Centro Paranaense de Cidadania (CEPAC).
Direitos Humanos: Essa também foi a argumentação de Renata Bueno. “Eu quero debater tecnicamente o direito das pessoas. O Direito é claro quando estabelece liberdade de expressão e respeito. Eu quero defender os direitos humanos”, disse durante a plenária. E a ação da APPAD, de acordo com o parlamentar Jair César, é uma iniciativa voltada para a saúde, que presta serviços importantes para a sociedade curitibana e defende os homossexuais. Para a autora do projeto, professora Josete “se não passou, foi preconceito. Não há justificativas”, lamentou.
“Há legalidade no processo. Se há legalidade, porque o veto? A única justificativa se funda em preconceito e em valores religiosos e não na crença aos direitos humanos e dignidade das pessoas. A sociedade precisa estar mais atenta para a forma como alguns parlamentares têm atuado quando representam segmentos religiosos”. – Marcilene Garcia de Souza, doutoranda em Sociologia pela UNESP – Universidade Estadual Paulista
Aos 21 anos, o músico Alex Almeida, de Curitiba disse que gosta de acompanhar os debates políticos. Ele é contra usar Deus na argumentação de propostas políticas. “E a Parada traz ganhos importantes para o turismo, saúde, direitos humanos e cidadania”.
“Todos nós somos contra excessos … Em nome da homofobia, Hitler matou milhares de pessoas. Isso parece justo? Não se constrói uma cidade com preconceito. Se constrói com solidariedade” – vereador Jair César.
Parada da Diversidade: “A parada é importante por que é um evento que dá visibilidade a vários segmentos da população que sofrem discriminação e violência o ano inteiro, por mais que uma parcela da sociedade insista em fingir que esses segmentos não existem”, explica Marins.
Hoje, a Parada defende a diversidade e reúne diversos segmentos constituídos por minorias que ainda precisam conquistar direitos básicos concedidos a qualquer cidadão. É o principal evento de diálogo do movimento LGBT e, desde 1969, as Paradas da Diversidade tem o objetivo de mobilizar positivamente a sociedade para essas questões, garantir respeito próprio e social além do reconhecimento dos direitos de todos os cidadãos.
“A Parada já está aprovada pela sociedade”, afirmou Algaci Túlio. A APPAD nasceu tendo na Parada sua principal atividade. Porém, de acordo com Márcio, com o tempo, a APPAD cresceu e passou a desenvolver outras ações relacionadas às temáticas da realidade LGBT. “E isso foi argumentado todo o tempo. Ainda assim, não queremos reduzir a dimensão e importância da Parada no mundo todo. Só tentamos mostrar que somos bem mais que isso”, finalizou. Quando aos excessos apontados pelos contrários ao PL, a melhor argumentação foi de Renata Bueno, que defendeu que a “ordem pública compete à autoridade policial”.
Para o vice-presidente do Conselho Permanente de Direitos Humanos do Paraná, Paulo Pedron, o desconhecimento da ação da APPAD limitou grande parte do debate ao direcionamento de verbas públicas para a Parada. “Isso mostra o nível do parlamento de Curitiba. Ficam discutindo dinheiro quando a questão é muito maior”.
Ao final, os seguidores do pastor cuspiram e rasgaram a bandeira com as cores do arco-íris estendida na frente da Câmara de Vereadores, de acordo com Georgete Bigfield.
Contatos:
APPAD – Associação Paranaense da Parada da Diversidade
Márcio Marins (coordenador): (41) 3222 3999 – ramal 23 ou (41) 9109 1950
[email protected]
Votação dos vereadores
Favoráveis
Algaci Tulio (PMDB)
Beto Moraes (PSDB)
Dona Lourdes (PSB)
Jonny Stica (PT)
Juliano Borghetti (PP)
Julião Sobota (PSC)
Julieta Reis (DEM)
Mario Celso Cunha (PSB)
Jair Cézar (PSDB)
Pedro Paulo (PT)
Professora Josete (PT)
Renata Bueno (PPS)
Tico Kuzma (PSB)
Contrários
Aladim Luciano (PV)
Caíque Ferrante (PRP)
Cantora Mara Lima (PSDB)
Celso Torquato (PSDB)
Denilson Pires (DEM)
Dirceu Moreira (PSL)
Emerson Prado (PSDB)
Felipe Braga Cortes (PSDB)
Francisco Garcez (PSDB)
João do Suco (PSDB)
Noemia Rocha (PMDB)
Odilon Volkmann (PSDB)
Omar Sabbag Filho (PSDB)
Paulo Frote (PSDB)
Roberto Aciolli (PV)
Serginho do Posto (PSDB)
Valdemir Soares (PRB)
Zé Maria (PPS)
Ausente ou abstenção
Aldemir Manfron (PP)
Jairo Marcelino (PDT)
João Claudio Derosso (PSDB)
Professor Galdino (PV)
Roberto Hinça (PDT)
Sabino Picolo (DEM)
Tito Zeglin (PDT)
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