A melhoria da eficiência do SUS poderia resultar numa economia de 16,5% nos gastos em saúde nos próximos 12 anos e será fundamental para garantir a sustentabilidade do sistema em um cenário desubfinanciamento e envelhecimento populacional.
A conclusão vem de análise do Banco Mundial que aponta que, se o país mantiver o atual cenário de gastos em saúde (R$ 295 bilhões/ano), atingirá R$ 701 bilhões em 2030. Com mais eficiência, as despesas cairiam para R$ 585,4 bilhões (R$ 115,6 bilhões a menos).
As projeções foram apresentadas em evento do Conass (Conselho Nacional de Secretários da Saúde), em Brasília, que reuniu gestores e pesquisadores do Brasil, Reino Unidos, Canadá, Portugal e Costa Rica para discutir o futuro dos sistemas universais de saúde.
Todos defendem a saúde como direito universal, mas nos outros países há definições do que será ofertado pelo setor público. Na Inglaterra, por exemplo, assistência dentária é contratada por fora. O setor privado funciona como complementar ao público.
Em todos os sistemas universais, clínicos gerais ou médicos de família são a porta de entrada única para o sistema. “Não há hipótese de o cidadão acessar direto especialistas e hospitais. A maioria procura o serviço de saúde com queixas que podem ser resolvidas na atenção primária”, explica Thomas Hone, pesquisador do Imperial College London, que falou sobre o sistema de saúde britânico (NHS).
No Brasil, há falta de integração da atenção primária com a média e alta complexidade (especialistas e hospitais), gerando sobreposição de ofertas e ineficiência.
Segundo o economista Edson Araújo, responsável pela área de saúde, nutrição e população do Banco Mundial, quanto mais eficiente for a atenção primária, melhores serão os resultados da média e alta complexidade no SUS.
Entre as razões está o fato de que só chegariam aos especialistas e aos hospitais os casos mais complexos (estima-se em 20% das demandas).
Projeções do Banco Mundial dão conta de que a atenção primária no Brasil tem potencial de aumentar em 98% o número de consultas por profissionais da saúde não médicos (enfermeiros, por exemplo), e em 63% o de médicos.
Para Renato Tasca, coordenador da Opas (Organização Pan-americana de Saúde) no Brasil, a ineficiência também é resultado da falta de acesso que ainda se vê no país.
”Sem acesso, não se diagnostica ou se mantém o diabetes e a hipertensão sob controle, gerando amputações e necessidade de hemodiálise. Se conseguirmos trabalhar com mais valor à atenção, conseguiremos um sistema mais eficiente.”
Segundo Araújo, outro fator de ineficiência no SUS é o grande número de hospitais de pequeno porte: 80% deles têm menos de cem leitos. Podem render votos aos políticos, mas não são resolutivos. “Não têm escala, não conseguem atrair profissionais qualificados ou ter tecnologias necessárias, o que expõe os pacientes a riscos”, diz Araújo.
Um estudo mostra que a taxa de mortalidade hospitalar depois de cirurgia cardíaca em hospitais maiores, com grande volume de procedimentos (mais de 600 por ano), é inferior à dos que fazem menos de 150 cirurgias anuais (6% contra 9%).
O caminho seguido por alguns estados para ampliar o acesso e melhorar a eficiência da média e da alta complexidade tem sido a criação de redes ou consórcios de saúde, onde municípios se cotizam para manter um hospital ou policlínica de especialidades.
Na Bahia, grupos de 20 cidades, em média, se uniram ao governo estadual para ter hospitais regionais e policlínicas que atendem 18 especialidades médicas. O estado entrou com 40% do custeio, e os municípios, com 60%, rateados proporcionalmente ao número de
habitantes.
“Foi possível comprar equipamentos e contratar profissionais, com piso mais produtividade, o que permite que eles ganhem salário de mercado”, diz o secretário da Saúde da Bahia, Fábio Vilas-Boas. Para o secretário do Distrito Federal, Humberto da Fonseca, as contratações de pessoal por administração direta são outro entrave para o aumento da eficiência no SUS.
Países como Portugal, Canadá e Costa Rica têm avançado em modelos que remuneram o profissional por desempenho e produtividade.
“Aqui a gente não consegue fazer uma gestão eficiente de pessoas com o regime jurídico do servidor público. Temos um absenteísmo enorme.”
Para ele, a lei 8.666 [de licitações e contratos] também é ultrapassada e inadequada. “50% das nossas licitações são desertas [não aparece interessados] ou fracassadas, a maioria porque temos que contratar micros e pequenas empresas. Para a compra de remédios e material médico-hospitalar isso não funciona.”
Outro problema, segundo Fonseca, é a dificuldade de atrair bons gestores para a administração pública. “Tenho um hospital com 700 leitos, 3.400 servidores. Como você consegue contratar um diretor para ganhar R$ 5.000, ter que administrar essa estrutura e ainda responder a dez ações do Ministério Público todos os dias?”, questiona.
De acordo com Gastão Wagner, presidente da Abrasco (associação de saúde coletiva), o SUS é o único sistema em que os cargos de gestão são por indicação política, outro fator que compromete a eficiência.
Fernando Cupertino, assessor para relações internacionais do Conass, diz que as PPPs (parcerias público-privadas) e as OSs (Organizações Sociais) podem contribuir para a melhoria do SUS. “Mas é preciso que elas sejam sistematicamente avaliadas.”
Para o sanitarista Eugênio Vilaça, a sustentabilidade do SUS depende de aumento do gasto público em saúde, hoje bem distante das cifras dos países ricos. “O nosso é indecentemente pobre.”
SUS, 30 ANOS
R$ 295 bilhões
é quanto o Brasil gasta por ano com o SUS
75% dos brasileiros
dependem do sistema público (150 milhões de pessoas)
11,7% dos gastos
do país são com saúde, contra uma média mundial de
6,8%, segundo a OMS
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