A posse do novo presidente do Paraguai, Fernando Lugo, deve ser celebrada hoje como um marco, representando o fim de 62 anos de hegemonia do Partido Colorado.
A mudança, que traz a expectativa de uma renovação política duradoura, ainda se cerca, no entanto, do fantasma do anacronismo. Lugo venceu numa campanha eleitoral marcada por um forte discurso populista, de viés antibrasileiro, que levou o ex-bispo a utilizar a bandeira da "soberania energética" e o questionamento dos contratos estabelecidos em Itaipu.
De fato, a maior usina hidrelétrica em operação no mundo torna-se alvo automático para a demagogia ideológica e as promessas de redenção financeira, pois tem um peso enorme se comparada à pequena economia paraguaia. A empresa binacional ostenta um patrimônio avaliado em US$ 60 bilhões, quase três vezes o PIB do país vizinho.
Passado o momento de euforia eleitoral, espera-se que a paixão dê lugar ao pragmatismo. A posição brasileira de não rever as tarifas pagas pela energia excedente de Itaipu -que o Paraguai se obrigou a vender ao Brasil, até 2023, para arcar com o custo de instalação da usina- assenta-se num tratado internacional com 35 anos de existência.
Descartadas modificações nesses contratos, pode-se abrir uma outra pauta de negociações entre Brasil e Paraguai, muito mais promissora. Entra em cena o apoio brasileiro, de preferência no âmbito do Mercosul, a um plano para incentivar investimentos no país vizinho.
O Brasil pode fornecer, com transparência, meios que capacitem o Paraguai a explorar melhor seu potencial econômico. Exemplo evidente é a linha de transmissão de alta-tensão para levar a energia de Itaipu até Assunção. Por conta de carências desse quilate, o Paraguai deixa de utilizar essa enorme vantagem energética para atividades que multipliquem a renda, o emprego e o bem-estar social.
As relações entre Brasil e Paraguai, se forem encaminhadas nesses termos, vão beneficiar de modo duradouro os dois lados da fronteira.
editorial da Folha de S. Paulo desta sexta-feira, 15
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