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Loucuras de inverno

Ademar Traiano

As manobras do PT para tentar libertar Lula ou, ao menos, mantê-lo na mídia, atingiram um nível inédito de insanidade no último domingo. Um habeas corpus, feito sob medida para cair nas mãos de um desembargador simpático à causa, provocou o que a presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), Laurita Vaz, descreveu como um “tumulto processual, sem precedentes na história do Direito brasileiro”.

A crise do final de semana teve como protagonista o desembargador Rogério Favreto. Ao ocupar o comando do TRF4, na condição de plantonista, decidiu libertar Lula. Favreto possui um longo histórico de ligações ideológicas, pessoais e profissionais com o PT. Foi filiado 19 anos e só deixou o partido para atender a um imperativo legal. Nomeado desembargador por Dilma Rousseff, em 2011, desfiliou-se para poder tomar posse. Com esse histórico lançou-se a uma cruzada louca para colocar Lula em liberdade.

Para conceder seu habeas corpus, Favreto insurgiu-se solitário contra decisões colegiadas do Tribunal a que pertence. Afrontou decisão do STJ e até do pleno do Supremo Tribunal Federal, que já havia recusado habeas corpus a Lula. Atropelou todas essas instâncias e determinou a soltura imediata do ex-presidente. Sua urgência era tamanha que dispensou o exame de corpo de delito. Tudo isso sob a alegação de um urgente “fato novo”.

O suposto “fato novo”: a pré-candidatura de Lula a presidente. Lula é candidato, ou pré-candidato, a presidente desde 1989, quase 30 anos. Segundo Favreto, no entanto, Lula, preso, condenado em segunda instância, portanto inelegível, teria se convertido em “pré-candidato” e não teria, na condição de presidiário, isonomia com os demais postulantes ao cargo. Se encontra impedido de participar de entrevistas, sabatinas, fazer selfies e outros eventos facultados aos candidatos que não cumprem pena. Logo, cabia soltá-lo às carreiras. Um dos mais bizarros episódios da história do Direito.

As manobras do PT encontraram forte resistência. Do juiz Sérgio Moro, do relator da Lava Jato no TRF4, desembargador Gebran Neto, do presidente da Corte, Thompson Flores. Elas foram fulminadas de vez pela presidente do STJ, Laurita Vaz. Ainda que a “intentona do plantonista” tenha fracassado, o episódio que paralisou o Brasil por horas, com ordens e contraordens de soltura, só serviu para aprofundar o desgaste das nossas instituições.

Tumultuar o ambiente político, colocar o líder da seita petista de novo em evidência, mais que uma improvável libertação para valer, parece ter sido o principal objetivo da série esdrúxula de manobras jurídicas. Se Lula fosse solto, ainda que por algumas horas, poderia para gerar imagens e fazer declarações. Nas contas tortas do PT, ainda que não tenha colocado o pé fora da cadeia, a manobra teria sido vitoriosa por provocar desgaste do Judiciário e, supostamente, reforçar a narrativa fantasiosa de que Lula seria um “preso político”.

A situação de Lula dificilmente vai mudar, como nota editorial da Folha de S. Paulo. “Salvo algum casuísmo jurídico extremo, a estratégia não tornará Lula elegível, esteja preso ou solto”. Mas não se pode subestimar os desgastes por que passam as instituições brasileiras. O preço dessa fatura, cedo ou tarde vai chegar.

Editorial do Estadão aprofunda essa crítica. “A tentativa de membros do PT de obter ilegalmente a soltura do seu cacique Lula da Silva evidenciou desespero e irresponsabilidade, além de completo menosprezo pelo Estado de Direito. Ao longo do domingo passado, os brasileiros observaram, atônitos, uma manobra canhestra que, não fossem a prudência da Polícia Federal, que não deu cumprimento a uma ordem manifestamente ilegal, e a prontidão de alguns membros do Judiciário, que afinal desfizeram os atos de um desembargador desatinado, poderia ter conduzido o País a uma confusão maior do que a já reinante”.

O PT ficou visivelmente eufórico em colocar seu cacique de novo no centro das atenções, ainda que ao custo de desgastar, ainda mais, nossas instituições. É preocupante pensar, do que seria capaz caso voltasse ao poder. O partido de Lula demonstrou, mais uma vez, que não se detém diante de nada.

Ademar Traiano é deputado estadual, presidente da Assembleia Legislativa e vice-presidente do PSDB do Paraná