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Lançado há 40 anos, “The Dark Side Of The Moon” transformou o Pink Floyd em ícones do rock de arena

Daniel Solyszko
Do UOL

Formação clássica do Pink Floyd, com David Gilmour, Nick Mason, Roger Waters e Richard Wright.
Em março de 1973, o Pink Floyd lançava “The Dark Side Of The Moon”, seu oitavo álbum. Abandonando as longas passagens instrumentais de discos como “Obscured By Clouds”, o grupo se aproximava cada vez mais das estruturas da música pop convencional sem sacrificar seu estilo clássico. O disco também sinalizava a presença cada vez maior do baixista Roger Waters como compositor principal da banda.

O “fantasma” de Syd Barrett, fundador e vocalista original do grupo que havia saído em 1968 devido à uma série de surtos esquizofrênicos atribuídos ao consumo excessivo de LSD, está presente em toda a obra. Em “Brain Damage”, Waters busca uma identificação com o antigo amigo, então vivendo isolado com a família no interior da Inglaterra: “I’ll see you on the dark side of the moon” (“Eu vejo você no lado escuro da lua”), diz a letra, e no resto do álbum um dos temas mais recorrentes é justamente a loucura.

“On The Run”, uma das músicas mais curiosas do disco, é uma excursão pioneira pela música eletrônica, toda instrumental e repleta de efeitos sonoros. “The Great Gig In The Sky” conta com uma performance excepcional da vocalista Clare Torry, sem nenhuma letra, apenas diferentes entonações que se aproximam da soul music. “Money” é uma crítica ferrenha ao capitalismo desenfreado, retratando a alegria vazia por trás da aquisição frenética de bens de consumo.

Uma das características marcantes do disco é que, apesar da crítica aguda de letras como “Time” e “Breath” em relação à mediocridade e o vazio ideológico da sociedade britânica, há um forte senso de derrota presente à todo momento. A visão da loucura como uma válvula de escape justificável frente à um mundo injusto e incoerente parece indicar um certo conformismo. O tom geral é de melancolia e depressão, como um grande ressaca de toda uma geração onde se percebia que as ideias de maio de 68 pareciam não ter mais lugar. Isso fica particularmente claro no encerramento do disco, quando no final de “Eclipse” uma voz avisa, em inglês: “Não há lado escuro da lua realmente. Na verdade tudo é escuro”.

Nem por isso o disco deixou de ter um grande apelo. Se o grande público estava prestando ou não atenção nas letras é algo aberto à discussão, mas o fato é o que o Floyd entrava numa fase mais palatável para as massas, onde seu clima de calmaria viajandona desenvolvido nos anos pós-Syd atingia um alto nível de refinamento pop, e transformava o estilo da bandaem trilha ideal para o consumo de maconha pelo hippies da época. O disco se tornaria um dos grandes marcos do rock nos anos 70 e transformaria a banda, até então cultuada mas não popular, em um dos maiores símbolos do rock de arena.

Embora o valor do grupo tenha sido renegado pelo punk rock, o pós-hardcore norte-americano voltaria a descobrir o Floyd na medida em que o rock psicodélico dos anos 60 era redescoberto e passava a exercer grande influência na cena alternativa, cansada do pop superproduzido da época. Bandas como o Flaming Lips, que depois regravaria “The Dark Side Of The Moon” inteiro, surgiram nessa época e exemplificam bem como o PF passou a ser assimilado. Essa mesma influência podia ser percebida em algumas das bandas da cena “shoegazer” surgida na Inglaterra no final da década de 80 e começo da de 90.

Mas a grande revalorização do PF no Reino Unido se daria nas festas pós-rave que estouram no país no início dos anos 90. O que começou como pistas secundárias nas festas de música eletrônica que tocavam música “ambiente” para acalmar os frequentares logo virou uma cena própria batizada de “chill-out”. O Floyd, cujos discos eram tocados à exaustão nessas festas, logo passariam a influenciar artistas como The Orb, KLF e Ultramarine.

Após 40 anos, é possível ouvir o álbum com um distanciamento maior, e a impressão geral é de um disco de fácil audição, mas de impacto diluído. O Pink Floyd já tem seu nome garantido no panteão dos clássicos do rock, e hoje é consumido sem muita discriminação ao lado de qualquer outra banda, seja os Sex Pistols, The Who ou Nirvana. Fica o reconhecimento, mas perde-se muito do contexto histórico da banda.

“The Dark Side Of The Moon” virou referência e é citado por todos, mas poucos parecem perceber o disco pelo que ele realmente é: um longo lamento pelo fim dos ideiais de juventude e a aceitação amarga da idade adulta como um período de conformismo necessariamente obrigatório. Não por acaso, a banda ainda teria muitos hits e passaria a ser cada vez mais respeitada, mas nunca mais faria nada tão ousado musicalmente quanto a sua obra anterior.