Juízes requisitados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para trabalhar como auxiliares dos ministros da Corte recebem auxílio-moradia em seus locais de origem e, ao serem transferidos para Brasília, acumulam o benefício com diárias no valor de R$ 4.200 por mês por estarem fora de suas cidades. Uma resolução do próprio STF, de número 413, publicada em outubro de 2009 e atualizada pela última vez em 2015, estabelece que tem direito a receber diárias quem não optar pelo auxílio-moradia do STF. O texto, no entanto, é omisso em relação ao fato de os juízes já receberem o benefício em seus tribunais originais. Na prática, o que predomina é o acúmulo dos dois auxílios e um aumento nos ganhos gerais dos magistrados. As informações são de Cleide Carvalho, Gustavo Schmitt e Laila Mouallem n’O Globo.
O Globo levantou o pagamento de diárias feitos a 18 juízes a serviço do STF entre janeiro e outubro de 2017, período disponível para pesquisa no site do tribunal. Chama a atenção o pagamento de diárias a dois magistrados emprestados pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) — Hugo Sinvaldo Silva da Gama Filho, cedido ao gabinete do ministro Alexandre de Moraes, e Pedro Felipe de Oliveira Santos, do gabinete do ministro Luiz Fux. Como o TRF-1 fica em Brasília, nenhum dos dois precisou se deslocar de sua cidade de origem para servir ao Supremo. Ainda assim, os dois aparecem no site do STF como beneficiários da ajuda de custo — R$ 27,5 mil (em outubro de 2016) e R$ 28,9 mil (em janeiro de 2017), pela ordem — normalmente paga a magistrados que mudam de domicílio.
O TRF-1 confirmou ainda que paga auxílio-moradia aos dois magistrados cedidos ao STF. Procurados, os dois juízes não foram localizados. O Globo fez questionamentos aos 18 magistrados auxiliares no STF, mas apenas Bruno Jacoby de Lamare, do gabinete do ministro Luiz Fux, respondeu. Segundo ele, o pagamento de diárias pelo STF é compatível com o recebimento do auxílio-moradia na origem porque não se limita a ressarcir despesas de aluguel ou hospedagem:
— Leva-se em consideração a elevação geral de custo de vida que é inerente ao fato de se ser obrigado a residir provisoriamente em um estado diverso do de origem, o que contempla despesas que excedem o necessário para custear o pagamento do aluguel.
Segundo ele, além de continuar a custear o imóvel em sua cidade de origem, há outras despesas extras.
— O plano de saúde a que tenho acesso pelo vínculo na origem (incluindo dependentes) não possui convênio com nenhum estabelecimento de saúde de fora do Rio Grande do Sul. Logo, todas as despesas com saúde em Brasília são custeadas de forma particular, sem prejuízo da necessidade de manutenção do custeio do plano na origem, sob pena de desfiliação e perda de carência — acrescentou.
Lamare afirmou ainda que o magistrado arca com as despesas de deslocamentos para compromissos institucionais em seus locais de origem.
Questionado sobre o pagamento de diárias a quem já recebe auxílio-moradia no tribunal de origem, o STF informou que os juízes auxiliares recebem diárias pelo fato de estarem exercendo suas atividades fora da comarca de origem.
Embora vincule o pagamento de diárias ao não recebimento do auxílio-moradia, a Resolução 413 não afirma expressamente que elas servem para pagamento de hospedagem. Trata apenas como “indenização de despesas extraordinárias” relativas ao exercício da função, abrindo brecha para mais um recebimento extra dos magistrados, que têm direito ainda a ajuda de custo para se mudar para Brasília e diárias de deslocamento a serviço, quando ocorrer.
As normas internas do STF contrastam ainda com a situação dos juízes de todo o país, que recebem auxílio-moradia mesmo se forem donos de imóvel na cidade onde trabalham. A Resolução 413 é mais dura. Determina que o benefício a juízes auxiliares só pode ser pago se o juiz ou seu cônjuge ou companheiro não for (ou tiver sido nos últimos 12 meses antes de sua designação) “proprietário, promitente comprador, cessionário ou promitente cessionário de imóvel no Distrito Federal”, nem de lote edificado. É preciso ainda que não haja imóvel funcional disponível e que nenhuma outra pessoa que com ele resida receba o benefício.
Em março, deverão ser julgadas pelos ministros da Corte as ações sobre o benefício, pago aos juízes desde 2014 graças a uma liminar do ministro Luiz Fux. Logo em seguida à decisão de Fux, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) regulamentou a concessão de auxílio-moradia aos procuradores da União e dos estados, num efeito cascata
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