Editorial, Folha de S. Paulo
A recessão fez aumentar ainda mais a vantagem salarial dos trabalhadores do setor público em relação aos da iniciativa privada. Como os primeiros gozam de ampla proteção contra o desemprego, a iniquidade se agrava.
De acordo com o IBGE, o salário médio do funcionalismo elevou-se em 1,5% acima da inflação em 2016, para R$ 3.199 mensais; no mesmo período, os trabalhadores celetistas amargaram queda de 1,3% em seus rendimentos, de R$ 1.952 em média.
Função e formação explicam parte da disparidade —como o nível médio da qualificação profissional na administração pública tende a superar o do setor privado, é natural que as remunerações mostrem diferença.
Não resta dúvida, entretanto, de que os servidores federais, estaduais e municipais beneficiam-se, a um só tempo, de um regime de trabalho privilegiado e da leniência dos governantes diante de suas demandas corporativas.
A estabilidade no emprego, só ameaçada em casos muito peculiares, funciona como um seguro vitalício contra a perda de renda. Tal seguro deveria vir acompanhado de contrapartida: a princípio, seria lógico que funcionários estáveis ganhassem menos que os demais, em casos de qualificação e responsabilidades comparáveis.
Como se sabe, não é o que ocorre na prática. No serviço público encontram-se lobbies poderosos, seja pela capacidade das categorias de prejudicar serviços essenciais à população, seja pelo acesso a esferas estratégicas como a tributária, a policial e a judicial.
Recorde-se que, no ano passado, em plena agenda de duros ajustes orçamentários, o governo Michel Temer (PMDB) concedeu reajustes generalizados ao funcionalismo; nos Estados e municípios, as despesas com pessoal frequentemente estouram os limites legais.
O resultado é um poder público caro e improdutivo. A carga de impostos consome um terço da renda do país, proporção inusitada para uma economia emergente; só a folha de pagamentos equivale a cerca de 13% do Produto Interno Bruto, enquanto os gastos totais ultrapassam os 40%.
Ainda assim, acumulam-se deficiências em áreas fundamentais como saúde, educação e segurança, nas quais o Brasil coleciona resultados inferiores aos de países com dispêndios menores.
Impõem-se, por isso, tanto um endurecimento da legislação que restringe a expansão da folha quanto uma revisão da garantia da estabilidade, ressalvadas carreiras típicas de Estado. Tais reformas justificam-se não apenas pela busca de produtividade mas também pela correção de injustiças.
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