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In vino veritas – Artigo Mary Zaidan

 

In vinoDois dias antes do primeiro turno das eleições presidenciais de 2002, Luiz Inácio Lula da Silva experimentou um prazer raro: bebeu um Romanée-Conti 1997, um dos vinhos mais caros do mundo, presente do marqueteiro Duda Mendonça. Um mimo como tantos outros que Lula já aceitara – e continuou aceitando depois de eleito -, provavelmente custeado pela propina que irrigou o caixa dois de sua campanha. 

Lula ainda não tinha chegado ao Planalto, o que aconteceu dois meses e meio mais tarde. A comemoração antecipada se deu pelo desempenho que tivera no debate da TV Globo, do qual também participaram José Serra, Ciro Gomes e Anthony Garotinho.

Passados 15 anos, nem o Romanée-Conti, que custou R$ 6 mil à época (hoje, raridade vendida a mais de R$ 40 mil), resistiu ao tempo: a garrafa vazia tomada por Lula, exibida como troféu na elegante Osteria Dell’Angolo, em Ipanema, foi furtada em 2009. Garotinho e Duda há muito se enrolaram com a Justiça, Ciro já anunciou que receberia a turma do juiz Sérgio Moro à bala e Lula se afunda na lama a cada frase de delatores.

Advogados do ex-presidente, notas do Instituto Lula e do PT, tentam fazer crer que delações e depoimentos que envolvam o nome dele são tirados a fórceps. A força-tarefa da Lava-Jato e Moro seriam torturadores que extraem dos detidos o que querem ouvir.

Emílio Odebrecht, que expôs sem qualquer cerimônia as facilidades que obteve nos governos petistas e o caráter de bon vivant do ex, mentiu. Marcelo Odebrecht, que aportou mais de R$ 700 milhões ao PT e aliados, também mentiu. O amigo Léo Pinheiro, dono da OAS, inventou que Lula pedira para que ele destruísse provas de dinheiro repassado ao PT.

As mentiras que forçaram os delatores a dizer não parariam por aí. As luxuosas reformas do tríplex do Guarujá e do sítio de Atibaia não foram feitas sob a orientação da mulher de Lula, Marisa Letícia, e muito menos para agradá-lo. As empreiteiras investiram em projetos, engenharia, materiais e obras sem motivo algum. Talvez para agradar ao proprietário de fachada do sítio ou então para aumentar o valor de venda de um apartamento que a OAS nunca pôs à venda.

E, daqui a alguns dias, ao que tudo indica, o país pode conhecer as falácias que o ex-ministro Antonio Palocci tem a acrescentar no rol dos que mentem para se livrar da cadeia.

Mas se tudo é invencionice quando Lula é o acusado, vira verdade quando os alvos são os “golpistas” Michel Temer, ministros e políticos do PMDB e do PSDB. Chega a ser patético.

Mesmo sem sustentação lógica, esse continuará a ser o discurso.

Paralelamente, os fiéis a Lula contam com a própria Lava-Jato e seus delatores para enfiar mais gente no lamaçal, ampliando a sensação de que Lula, ainda que esteja enrolado, é só um entre centenas.

Querem fazer crer que ele estaria podre como os demais – ou até menos.

A redução de 14 pontos percentuais na rejeição a Lula na última pesquisa Ibope, em que aparece com 30% de votos consolidados para 2018, prova que a tática está dando certo.

Ainda há muita água para correr debaixo da ponte e também muita lama para mexer no curso da água até 2018.

Resta ainda saber se Léo Pinheiro apagou rastros, eliminando parte do entulho que pode enterrar de vez qualquer pretensão de Lula.

Hoje, sabe-se que o Romanée-Conti 1997 não foi exceção, e sim a regra.

Mary Zaidan / O Globo