Editorial, O Globo
Do ponto de vista dos empresários e consumidores, 2014 é um ano que já acabou. Resta, agora, esperar pelas eleições de outubro e seus desdobramentos
A última tentativa do governo de reanimar a economia, por meio da prorrogação do IPI reduzido sobre veículos novos e móveis, foi mais do mesmo. Atendeu a pedidos, principalmente do setor automobilístico, em mau momento, muito em função da crise argentina. Pode evitar que o esfriamento das vendas aumente, mas não resgatará as montadoras das dificuldades. As famílias estão endividadas e apenas uma minoria troca de carro todo ano.
Há tempos se sabe que o ciclo de crescimento econômico puxado pelo consumo se esgotou. E só os investimentos serão capazes de acelerar as engrenagens da produção. O governo sabe disso, tanto que, passando por cima de preconceitos ideológicos, atrai o capital privado para projetos de infraestrutura.
Elevar, portanto, a indigente taxa de investimentos — de 18% do PIB, quando são necessários 25% — implica fazer muito mais do que propagandear a vontade de fazê-lo, e não apenas na infraestrutura. É preciso, nos termos de Adam Smith, atiçar o “instinto animal” do empreendedor, para que ele decida correr riscos e investir. Mas, sem confiança, ele não se moverá. Como já não se move.
Acreditar no futuro, próximo e distante, é vital para decisões de consumo e investimento. E consumidor e empresário não estão de bom humor. Segundo a Fundação Getúlio Vargas, o índice de confiança do consumidor, em maio, caiu 3,3%, maior queda desde agosto de 2011, quando a retração atingiu 5%. O indicador se encontra próximo do nível do final de 2008, momento em que o mundo era tragado pelo buraco negro da crise financeira deflagrada a partir dos Estados Unidos.
Para o consumidor, preocupa a persistência de uma inflação elevada, na faixa superior aos 6%, muito acima da meta de 4,5%, por leniência do governo. O empresário, por sua vez, tem várias preocupações. Diante do evidente fracasso da política do “novo marco macroeconômico” — câmbio desvalorizado, juros baixos e gastos públicos em alta —, é lógico que empresas repensem planos de crescimento, engavetem projetos.
Outro fator negativo é a insegurança jurídica, agravada pelo estilo mais intervencionista do governo Dilma Rousseff, do qual a grande mostra é a desestabilização financeira do setor elétrico, devido a uma medida provisória baixada para cortar o custo da energia em 20%. A redução da conta de luz virou arma eleitoral, e se converte num bilionário “esqueleto” fiscal, pois o Tesouro tem financiado os rombos no sistema.
Para agravar temores, o governo deixa claro, de forma implícita, que não conseguirá cumprir a meta fiscal de superávit de 1,9% do PIB sem recorrer a receitas extraordinárias e, é provável, novas doses de contabilidade criativa. Não se confia mais na contabilidade pública.
Sendo assim, do ponto de vista da economia e dos negócios, 2014 é um ano que já acabou. Trata-se, agora, de esperar as eleições de outubro e desdobramentos.
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