Estudo da UFPR indica que juízes paranaenses buscam a solução para o caso concreto, dentro daquilo que eles entendem como Justiça, para depois encontrar o Direito
por Sandro Moser, na Gazeta do Povo
Sentenças baseadas na interpretação das teorias jurídicas ou com fundamentos nas circunstâncias do caso concreto? Convicções pessoais dos magistrados influem nas decisões a ponto de extrapolar os limites da legislação? Afinal, como os nossos juízes têm decidido? No debate entre pesquisadores, advogados e magistrados, há pontos de vista bem diferentes e conclusões conflitantes.
No meio acadêmico, há quem perceba tendência de uma inversão da lógica do Direito nas sentenças proferidas pelos juízes atualmente, em que o critério pragmático de seletividade decisional tem prevalecido. Estudo elaborado por pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) indica que os juízes paranaenses julgam muito mais baseados em critérios de conveniência extraídos do caso concreto, em vez de utilizar a teoria ou um critério geral.
“Em vez de alguns julgadores buscarem o Direito para encontrar a solução, eles buscam a solução – dentro daquilo que entendem como Justiça – para depois buscarem o Direito”, constata o professor de Direito Constitucional da UFPR, Emerson Gabardo, um dos pesquisadores envolvidos no estudo.
Para Gabardo, entre os magistrados há uma busca da sentença que faça Justiça no caso concreto, em detrimento de decisões que procurem justificar teorias doutrinárias. A mesma constatação é feita na prática diária por advogados que percebem que alguns entendimentos de tribunais variam de caso para caso, de julgador para julgador, e, em alguns casos, de dia para dia. “Um mesmo relator em casos análogos foi capaz de aplicar duas teorias diferentes para a resolução do mesmo problema, sem nem ao mesmo mencionar que houve mudança de entendimento”, disse um advogado, que pediu para não ser identificado.
Decisões que levam muito mais em conta as circunstâncias do caso concreto no convencimento dos magistrados são, explica Gabardo, em parte, influenciadas pela “mudança de paradigma” das teorias do chamado neo-constitucionalismo ou pós-positivismo, que abrem as possibilidades hermenêuticas do magistrado fazendo com que os princípios constitucionais também funcionem como regras. “Antes haviam padrões mais bem estabelecidos e a vinculação formal à lei era um mecanismo de segurança jurídica importante.”
Para ele, atualmente os juízes estão muito mais preocupados, conscientemente ou não, a fazer a justiça conforme seus próprios critérios subjetivos. “É paradoxal, mas a abertura para os princípios acaba acarretando uma ampliação da influência da consciência na decisão. Formalmente a decisão é objetiva, materialmente não. Isso já acontecia no auge do positivismo, mas de forma muito mais tímida e controlável”, compara.
Insegurança
Esta amplitude aumentada das possibilidades da sentença, no entanto, é motivo de preocupação para uma ala mais conservadora da advocacia. “Temos hoje quase 16 mil juízes, cada um com formação ou convicção pessoal diversa. Ao se permitir várias interpretações cria-se uma insegurança muito grande”, avalia o advogado Ives Gandra Martins Júnior.
O advogado e pesquisador da Escola Superior da Magistratura do Rio Grande do Sul João Gabriel Figueiró Salzano defende que para a decisão judicial não se configurar em arbitrariedade é necessário que nas sentenças constem os fundamentos que levaram o juiz a escolher aquela opção (dentre as opções contidas na lei), bem como os fundamentos que levaram o juiz a rejeitar outro tipo de alternativa.
“A fundamentação se configura como meio de controle da atuação do juiz em seu poder discricionário”, explica. Ele vê como “anacrônica” a ideia de que se esperava do juiz um distanciamento do conflito submetido à sua apreciação, “como se o resultado final do processo pudesse prescindir da atuação mais efetiva e direta desse sujeito da relação jurídica processual.”
Volume de processos prejudica análise
A avalanche de processos em todas as esferas do Judiciário é outro fator que pode influenciar na qualidade das sentenças produzidas no Brasil. De acordo com o Anuário da Justiça 2012, o Poder Judiciário conta em todo país hoje, em todos os graus de jurisdição, com cerca de 80 milhões de feitos em tramitação. A demanda faz com que os magistrados atuem pressionados na tentativa de atingir as metas de eficiência estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Nestes casos, a falta de tempo pode prejudicar a análise de todos os aspectos legais e materias dos julgados.
Acredito não ser possível um Magistrado julgar o processo apenas pelo seu ideal, deixando de lado o que dita a lei e o direito. Pois, nem sempre nosso pensamento de hoje é o mesmo pensamento que teremos amanhã.No caso em pauta, poderá ocorrer que o Magistrado julga o processo hoje de uma forma e uma solução que amanhã, ele muda o pensamento ou o seu conhecimento e vai perceber que aquele seu julgamento anterior, à seu próprio ver, foi julgado erradamente ou sem a Justiça ele mesmo acreditou existir.
Acho que o Juiz DEVE julgar cada caso, conforme a lei atual e o direito existente.