Estradas: Modelo de concessão favorece empresas e penaliza cidadãos
O modelo de concessão de rodovias à iniciativa privada – concebido e implantado a partir da década de 90, durante a onda privatista dos anos FHC – penaliza os usuários, encarece a produção, favorece práticas de superfaturamento e não permite um efetivo controle sobre os custos das empresas, além de desconsiderar completamente o impacto causado pelas praças de pedágio nas economias locais e na vida das pessoas que moram no entorno das estradas privatizadas.
Estas foram algumas constatações da primeira mesa de debates do seminário “O PT e as Concessões Rodoviárias”, que teve início na manhã desta quinta-feira (21), em Brasília, e é organizado pela Secretaria Nacional de Movimentos Populares e pelo Setorial Nacional de Transportes, o encontro.
O seminário, que continua à tarde, reúne aproximadamente 40 pessoas de 10 Estados e acontece na sede do PT nacional.
Na abertura, o secretário de Movimentos Populares, Renato Simões, lembrou que o encontro tem por objetivo subsidiar a direção do partido sobre o tema, enquanto Rômulo Orrico Filho, coordenador do Setorial de Transportes, destacou a importância de se aprofundar as políticas públicas para o setor.
A primeira mesa teve como palestrante principal Adalberto dos Santos, integrante da Secretaria de Fiscalização de Desestatização do TCU (Tribunal de Contas da União). Também falaram os deputados estaduais Raul Pont (RS), Tadeu Veneri (PR) e Antonio Mentor (SP), além de Guarulhos (SP), Elói Pietá.
Custo social e econômico
O representante do TCU fez várias críticas ao modelo de regulamentação das concessões, criado no final dos anos 90. Segundo ele, o principal problema está na ausência de mecanismos que permitam a revisão periódica dos parâmetros de reajustes dos pedágios.
“Essa é uma questão crucial”, afirmou. Segundo ele, até hoje as empresas concessionárias, na hora de definir a tarifa, não levam em conta, por exemplo, o tráfego real das estradas, mas aquele que foi projetado na época das assinaturas dos contratos.
Da mesma maneira, os novos investimentos, quando existem, são projetados com base na proposta original, “geralmente maiores do que o custo atual do mercado”.
Também permanecem inalteradas as taxas de retorno do investimento previstas no momento da concessão – que chegam, de acordo com ele, a 25%. Santos disse que nas condições atuais da economia – e após uma década de iniciada a concessão – não faz sentido a manutenção de taxas tão elevadas.
A título de comparação, o representante do TCU lembrou que uma revisão promovida pelo governo Lula este ano – no que se refere à concessão de novos trechos – derrubou a taxa de retorno para 8,95%.
Tais falhas, aliadas a precários estudos técnicos e econômico-financeiros na hora de fundamentar as licitações, levam a problemas como superfaturamento de insumos e investimentos, repasses indevidos à tarifa de pedágio, fraudes, desperdício de recursos e baixa qualidade dos serviços.
“Isso tudo tem um alto custo social e econômico”, concluiu.
Péssimo negócio
Para o deputado estadual Raul Pont (RS), o atual modelo de concessão é um “péssimo negócio” para o usuário do sistema e as economias locais e beneficia apenas os consórcios de empresas concessionárias.
No Rio Grande do Sul, segundo ele, a taxa de retorno das empresas chegou a 46% acima da inflação. “Isso nada mais é do que transferir renda do usuário para o processo de capitalização do setor privado”, afirmou.
Pont relatou problemas causados à economia do Estado após a privatização das estradas locais, feita por pólos ainda no governo do peemedebista Antonio Brito (1995-1998), de maneira que os pedágio acabaram onerando as regiões produtivas. “Além disso, as concessões não previam ampliação das rodovias e ainda foram financiadas com dinheiro do banco estadual”, comentou.
O deputado destacou também os problemas criados para as populações locais, que passaram a pagar para circular de uma cidade a outra e, às vezes, até dentro do próprio município.
A situação mais grave, segundo ele, é a de Viamão, onde se iniciou um movimento de desobediência civil em que moradores passam em comboio pelas praças de pedágio sem pagar a tarifa. “Algumas pessoas foram proibidas de circular na rodovia, o que é um absurdo”, disse.
Para ele, a “dessintonia” entre o que as empresas arrecadam e o que volta para a população decorre do modelo de concessão, da falta de fiscalização e do comprometimento da imprensa com as empresas, que estão entre os maiores anunciantes dos veículos de comunicação no Rio Grande.
Cidadãos sitiados
Tadeu Veneri e Antonio Mentor também falaram dos lucros “exorbitantes” das empresas – em São Paulo, segundo Mentor, as concessionárias tiveram um retorno financeiro 147% acima da inflação – e dos problemas causados às cidades e às populações locais.
“No Paraná, há praças de pedágio dividindo regiões hortifrutigranjeiras, o que impacta a vida das pessoas e muda a relação de produção”, disse Veneri.
Ele afirmou ainda que é comum as concessionárias trabalharem para impedir a criação ou manutenção de rotas alternativas, que permitem à pessoa se locomover sem pagar pedágio e são garantidas por lei.
“Qual alternativa nós damos ao cidadão para que se mantenha o direito de ir e vir?”, perguntou.
Para Antonio Mentor, isso gera problemas sociais “gravíssimos” porque leva ao impedimento de trocas econômicas, culturais, esportivas, educacionais e profissionais.
“A maioria dos cidadãos das regiões metropolitanas são sitiados por praças de pedágio”, disse o deputado paulista, que acusou as concessionárias de financiarem a implantação de pedágios em vias municipais, “estabelecendo um verdadeiro cerco”.
Mentor também criticou o modelo adotado por sucessivos governo do PSDB em São Paulo – que acabou servindo de “laboratório da privatização” para os demais Estados. “É um modelo de capitalismo sem nenhum risco, onde as receitas das concessionárias são verdadeiras caixas-pretas”, afirmou.
Autoritarismo
O prefeito Elói Pietá, de Guarulhos, lamentou o fato de as comunidades locais nunca serem chamadas para as discussões relativa aos processos de concessão. “Não existe processo participativo”, avaliou.
Ele ressaltou que o problema se dá tanto na relação com as empresas como com os órgãos governamentais. “É um processo autoritário”, concluiu o prefeito, cuja cidade é cortada por várias rodovias, entre elas a Presidente Dutra.
O seminário continua agora à tarde com as seguintes mesas:
O PAC e as Concessões Rodoviárias.
Expositores: Jose Augusto da Fonseca Valente (Secretário Política Nacional de Transportes/MT);e Mauricio Muniz (Casa Civil). Coordenação da mesa: Deputado Federal Décio Lima (CVT)
O PT e as Concessões
Expositor: Romulo Orrico Filho – COPPE/UFRJ. Debatedores: Keiji Kanashiro – Consultor de Transportes; Carlos Zaratini – Deputado Federal (CVT); Eloi Pietá – Prefeito de Guarulhos; e José Airton Cirilo – Deputado Federal (CVT). Coordenação da mesa: Jilmar Tatto (CVT) Deputado Federal.
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