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Empreiteiras investigadas doaram a partidos R$ 484,4 milhões nas eleições

Empreiteiras investigadas doaram a partidos R$ 484,4 milhões nas eleições

Os principais grupos empresariais do país, citados em investigações da Operação Lava-Jato, doaram, juntos, pelo menos R$ 484,4 milhões a políticos – a paranaense Gleisi Hoffmann (PT) aparace na lista – e partidos nas eleições do ano passado. Odebrecht, OAS, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão, UTC, Camargo Corrêa, Galvão, Engevix, Mendes Junior e Toyo Setal fizeram depósitos polpudos na conta de políticos e direções partidárias por meio de suas subsidiárias, empresas cujas ações são controladas pela matriz principal do grupo. No caso de Odebrecht e Queiroz Galvão, o cálculo também levou em conta quantias repassadas por empresas cujos grupos têm participação de 30% a 54% nas controladas. As informações são d’O Globo.

Esse formato de doação diluída entre vários braços de uma empresa — previsto em lei e detalhado na prestação de contas feita ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) — dificulta o rastreamento do montante total que o grupo doou na campanha. É comum, por exemplo, que o nome de empresas controladas não tenha nenhuma relação com o da holding — caso da Braskem ou da Usina Eldorado, subsidiárias da Odebrecht, da HM Engenharia e Construções, do grupo Camargo Corrêa, ou da Cosima, que pertence ao grupo Queiroz Galvão.

Ainda que os negócios das empresas de um mesmo grupo possam atuar em esferas totalmente diferentes, com interesses difusos — a Odebrecht, por exemplo, citada pelo Ministério Público Federal como uma das participantes do cartel que fraudava licitações da Petrobras, tem empresas de construção e de produção de etanol —, os maiores grupos do país possuem certa unidade gerencial.

— Há casos em que as unidades de negócio têm autonomia suficiente para decidir (para quem doar). Mas a maior parte das empresas (investigadas) são empresas com características de certa unidade gerencial, então é possível sugerir que a holding estava absolutamente ciente do que estava sendo doado por cada uma das subsidiárias. Algumas são empresas onde existe um controle familiar, isso sugere que de fato havia algum grau de programação entre o que acontecia na holding e nas diversas subsidiárias — explica Paulo Furquim, professor de economia e negócios do Insper e ex-conselheiro do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

Para Sérgio Lazzarini, professor de administração e negócios do Insper, o mecanismo de doação das empresas brasileiras ajuda a desvincular dos grupos os altos valores doados. É uma forma, segundo ele, de desviar o foco das empresas:

— Doar por subsidiárias ajuda a deixar as doações menos “escancaradas”, sem conexão direta ao grupo. Pode ser também uma forma de captar recursos internos vindos de negócios múltiplos. Por exemplo, múltiplos negócios do grupo podem estar interessados nos benefícios trazidos por conexões (com) políticos. Assim, cada negócio pode contribuir para doações que reforcem o grupo como um todo.

Citados em depoimentos do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, pelo menos 16 dos 28 políticos que teriam sido delatados por Costa, segundo o jornal “O Estado de São Paulo”, receberam dinheiro das empreiteiras investigadas pela Lava-Jato. Quem encabeça a lista é o senador Delcídio Amaral (PT-MS), derrotado na disputa ao governo do Mato Grosso do Sul, que recebeu R$ 9,7 milhões dos grupos Engevix, OAS, UTC e Queiroz Galvão. O senador foi responsável pela indicação do ex-diretor da área Internacional da estatal, Nestor Cerveró, preso na última quarta-feira. Henrique Eduardo Alves (PMDB-AL), presidente da Câmara, também derrotado na disputa pelo governo de Alagoas, recebeu R$ 9 milhões dos grupos Galvão, OAS, Odebrecht e Queiroz Galvão. Lindbergh Farias (PT-RJ), que acabou em terceiro no páreo fluminense, recebeu R$ 2,8 milhões de OAS, Queiroz Galvão e UTC. Outros candidatos que receberam altas quantias foram Gleisi Hoffmann (PT-PR), de R$ 1,8 milhão, Benedito de Lira (PP-AL), R$ 1,7 milhão, o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB-RJ), R$ 1,4 milhão, e o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB-PE), R$ 1,1 milhão.

Paulo Furquim explica que as subsidiárias podem ter interesses independentes das holdings, o que influenciaria o destino das doações feitas por elas. Mas que as doações “ilegítimas”, feitas já com algum tipo de acordo para receber um benefício em troca, costumam interessar mais ao grupo e menos às subsidiárias.

— Quanto mais “ilegítima” (a doação), mais tende a ser interesse do grupo e menos das unidades separadas. As unidades têm interesses econômicos diferentes, mas a relação do grupo é uma relação com o político, um favorecimento num nível mais generalizado, às vezes em coisas que vão acontecer na legislatura e que nem são possíveis de antecipar. O financiamento mais preocupante é o do grupo principal, da holding. Até porque ela é dona de interesses tão variados abaixo dela que é difícil ter uma plataforma que se alinhe com algum governante específico.

Maior doador das eleições de 2014, só o grupo Odebrecht, por meio da holding e de várias controladas, doou pelo menos R$ 113 milhões. O grupo OAS desembolsou ao menos R$ 99,7 milhões; o Andrade Gutierrez, R$ 97 milhões; o Queiroz Galvão, R$ 74,3 milhões; o UTC, R$ 52,7 milhões; o grupo Camargo Corrêa, R$ 19,8 milhões; o grupo Galvão, R$ 14,6 milhões; oEngevix, R$ 10 milhões; o Toyo Setal, R$ 2,4 milhões, e o Mendes Junior repassou R$ 200 mil a políticos e partidos.

Levando em conta as doações a políticos que concorreram às eleições do ano passado, a soma dos partidos que mais receberam dinheiro desses grupos foram PT (R$ 123,5 milhões), PSDB (R$ 63,7 milhões), PMDB (R$ 58,6 milhões), PSB (R$ 29,8 milhões) e DEM (R$ 18,2 milhões).

Para Furquim, o financiamento de campanhas eleitorais feito por empresas deveria ser proibido, já que é orquestrado por pessoas físicas dentro de uma organização estruturada. Ex-conselheiro do Cade, ele afirma que a possibilidade de essas empresas firmarem acordos de leniência com a Justiça no âmbito da Lava-Jato é “praticamente zero”:

— As empresas não fazem parte do processo político, que é um processo de pessoas. Quem tem interesse são os participantes da empresa, funcionários e acionistas. O problema da pessoa jurídica é que ela é um conjunto muito grande de pessoas. É uma coordenação hierárquica, indesejável no sistema político.

— O histórico dessas empresas de construção é de não firmar esses acordos de leniência, nenhum foi feito até agora no âmbito do Cade. Nesse caso (da Operação Lava-Jato), a probabilidade é quase zero — completa.