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Em sua posse na ABL, FHC diz que democracia no país está em crise

Folha de S. Paulo

Na cerimônia de posse mais concorrida dos últimos anos na Academia Brasileira de Letras, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, 82, assumiu ontem a cadeira nº 36, sucedendo a João de Scantimburgo (1915-2013), com um discurso no qual apontou as insuficiências da democracia no Brasil.

Entre os convidados estavam o ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello, o cantor Gilberto Gil e os principais nomes do PSDB: o governador Geraldo Alckmin (SP), o senador Aécio Neves (MG) e o ex-governador José Serra (SP).

“Fernando Henrique não é um escritor, é um professor que tem uma obra muito importante, impecável do ponto de vista intelectual, com todas as condições de integrar a Academia”, disse Serra. “Foi uma belíssima escolha, ele tem uma contribuição efetiva a dar, é um sociólogo, um homem internacional, um humanista”, afirmou Mello.

O evento aconteceu no salão nobre do Petit Trianon, o prédio histórico que serve de sede para a Academia, no centro do Rio. Vestindo o fardão de acadêmico, o ex-presidente iniciou seu discurso falando sobre a “importância dos rituais”, como aquele de que tomava parte, e fazendo referência a sua mulher, Ruth Cardoso (1930-2008).

Seguindo a praxe, Fernando Henrique também homenageou cada um dos ocupantes da cadeira 36, como o poeta Afonso Celso (1860-1938) e o filósofo José Guilherme Merquior (1941-1991).

Na segunda metade de sua fala, FHC repassou sua trajetória e suas ideias: “Desenvolvimento, democracia, liberdade e igualdade eram e continuam a ser nossa obsessão. A esses objetivos dediquei meus esforços como intelectual e tentei alcançá-los em minha prática política”.

O ex-presidente elogiou os avanços democráticos das últimas décadas, mas afirmou que ainda falta “alma democrática” aos cidadãos: “Nossa cultura de favores e privilégios, de retraimento da responsabilidade pessoal e atribuição de culpa aos outros, principalmente ao governo e às coletividades, desobriga o cidadão a fazer sua parte, a sentir-se comprometido”.

O novo acadêmico fez ainda referência aos protestos de junho. “A ampliação da democracia e da liberdade de informação choca-se com as insuficiências da República. À inadequação das instituições acrescenta-se sua desmoralização, agravada por episódios de corrupção. Esboça-se entre nós, como em outros países, uma crise da democracia representativa.”

Ao fim do discurso, FHC assinou o livro de posse e recebeu os tradicionais adereços que compõem o figurino da ABL: o colar com uma medalha, entregue por Nélida Piñon; o diploma, entregue pelo historiador José Murilo de Carvalho, e a espada, dada por Eduardo Portella –que substituiu na função o decano da ABL, José Sarney.