Gazeta do Povo
O botão da calça pula. Está no chão. Olho ao redor, ninguém viu. Será? Meus olhos seguem pelas páginas da revista, mas não leio nada. Uma mulher sorri para mim, no anúncio que promete eliminar até 10 quilos do corpo em um mês. O plano com quatro refeições diárias custa R$ 450. “O que o nosso bisavô e a nossa bisavó que fugiram da Europa em ruínas e sem comida diriam? Pagar para perder peso?”
Interrompi uma vocação de fumante em 2009 e recuperei o fôlego. E o paladar também. Desfilo no Parque São Lourenço, na Vieira Souto, na Travessa Tupinambá e na Praça Benedito Calixto com esses 25 quilos que não tinha. Correr, eu corro. Caminho. Bebo água. Faço abdominais. E evito alface, outros verdes e a balança. Conheci Paranavaí, a cidade poesia do Brasil, terra do Amauri Martineli, conhece? Voltei encantado. Com o talento dos declamadores. E com uma calça nova que comprei em um shopping. A que eu vestia rasgou. Meu corpo está em expansão.
“Será que o programa funciona? Tem motivadores, assessoria nutricional e promessa de emagrecimento descontraído.”
O Roberto Gomes diz que estou parecendo o Antonio Maria. Abro um sorriso. Caminhamos pela Rua Cecília Meirelles. Pergunto se faz tempo que acompanha o que escrevo. Ele desconhece a minha prosa. O Roberto não se refere ao estilo que imagino ter, que poderia se aproximar – em um desejo delirante de minha parte – do cronista que namorou a Danuza Leão. “Você está com a silhueta do Antonio Maria, Marcio. É um dublê físico perfeito daquele imenso mulato genial”, comenta, já no café do MON, o autor do romance O conhecimento de Anatol Kraft.
“Reparei que um renascentista curitibano, que canta, dança, estrebucha no palco e ainda escreve, esse mesmo sujeito faz continuamente referência à comida. Se eu o conhecesse, o cumprimentaria da seguinte maneira: como vão? Ele é muitos, não é possível dizer apenas ‘como vai?’. E, em todas as áreas nas quais atua, menciona alimentos. Sempre.”
Não sei se alguém repara na minha expansão corporal. Eu reparo. Tenho a impressão de que não há mais controle. Ou há? Fato é que mudei todo o guarda-roupa. Nada que era antigo serve mais. Aquela camiseta com um poema do Paulo Leminski ficou pequena. Também deixei no passado o par de sapatos que me levava até auditórios para eu aplaudir toda apresentação. E abandonei as calças que escondiam minhas pernas nos shows de rock and roll.
“Talvez eu tenha de entrar em dieta, dispensando canapés, videoclipes lançados diariamente, churros, manifestos audiovisuais, lamentos no Facebook, rolmops, teorias de Vladimir Propp e outras sobremesas. Algo me diz que, daqui para a frente, é melhor dizer ‘não, obrigado’. Talvez todos os dias.”
Ou quase.
Deixe um comentário