Administração pública
Elevado número de cargos em comissão facilita o nepotismo
Excessos são registrados nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Governo federal tem 20,5 mil comissionados contra 9 mil nos EUA
Rhodrigo Deda
O fim do nepotismo no país só vai ocorrer com o corte no elevado número de cargos comissionados na administração pública brasileira. Essa é a avaliação de especialistas, consultados duas semanas depois da publicação da Súmula Vinculante n.º 13 do Supremo Tribunal Federal, que impede a contratação de parentes de autoridades em cargos comissionados. Para demonstrar o exagero na administração pública brasileira, basta comparar o número de funcionários comissionados dos Estados Unidos, estimado em nove mil, com o de cargos de confiança existentes no governo federal do Brasil, cerca de 20,5 mil.
Os excessos também estão nos governos estaduais. Nas prefeituras, quanto menor a cidade maior a proporção dos cargos de confiança em relação ao total de funcionários municipais (veja matéria ao lado). Mesmo com a proibição do nepotismo, autoridades públicas vêm tentando driblar a decisão do STF.
“É difícil acabar com o nepotismo, o que temos mesmo de fazer é diminuir substancialmente o número de cargos comissionados”, afirma o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Airton Mozart Valadares Pires. Segundo ele, será um tiro mortal para o nepotismo cruzado se os cargos de livre nomeação forem reduzidos em mais de 50% em toda a administração pública. “Há um excesso de postos, que servem para apadrinhamento político. Esses cargos devem ser preenchidos principalmente por funcionários de carreira (que tenham passado em concurso público)”, afirma Valadares.
Para o presidente da AMB o problema atinge também os Poderes Legislativo e Judiciário. “Há um abuso de cargos comissionados em todos os três poderes.” De fato, informações repassadas pelo Senado e pela Câmara Federal demonstram que, no setor administrativo das duas casas legislativas, funcionários comissionados são respectivamente 45% e 27% do total (ver quadro). Além dos comissionados empregados na área administrativa, senadores e deputados federais recebem verba indenizatória para contratação de auxiliares. O mesmo ocorre nas Assembléias Legislativas dos estados e Câmaras dos municípios.
Falso problema
Para o diretor da organização não-governamental Transparência Brasil, Cláudio Abramo, o nepotismo é um falso problema quando se observa o elevado número de cargos comissionados. Segundo Abramo, estimativas da entidade mostram que o poder das autoridades públicas brasileiras para nomear funcionários não é comum em países desenvolvidos. “O Estados Unidos tem uma estrutura pública muito maior que a brasileira e possui somente 9.051 cargos de confiança, já na Alemanha e na França, são aproximadamente 500. Na Inglaterra há cerca de 300.”
Outra diferença administrativa entre o Brasil e os Estados Unidos, segundo Abramo, é que todas as nomeações feitas no governo federal americano precisam ser validadas pelo Congresso.
Abramo explica que é por meio de cargos comissionados que os governantes brasileiros podem comprar apoio de partidos políticos. Para ele, é preciso criar mecanismos institucionais que reduzam o poder de nomeação dos governantes, instituindo critérios de mérito e de concursos internos para posições de direção e chefia, que requerem elevada qualificação profissional.
O professor José Matias Pereira, do curso de Administração da UNB, entende que — à exceção dos agentes políticos (ministros, secretários estaduais e municipais), que são necessários — os cargos de confiança geram distorções no funcionamento do Poder Público. Segundo Pereira, a livre contratação traz ineficiência para a administração pública, além de aumentar as chances de corrupção. “Eles não tem compromisso com a máquina pública, diferente do que ocorre com os concursados.”
Para comprovar que há um excesso de cargos em comissão no país, Pereira da um exemplo: “Na Inglaterra, o ministro só nomeia o seu secretário particular. Abaixo dele, todos os servidores são de carreira.”
Essas diferenças entre países desenvolvidos e o Brasil, segundo o cientista político Ricardo Oliveira, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), mostra o atraso cultural do País. “Há uma correlação entre cargos comissionados e nepotismo. Cortando-se os cargos elimina espaço para contrataçaõ de parentes e clientelismo.”
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