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Eles não se emendam – Editorial Estadão

Os partidos políticos estão se mobilizando para sensibilizar a Justiça Eleitoral a aceitar o dinheiro do Fundo Partidário como meio para quitar as multas que lhes foram impostas por mau uso desse mesmo fundo. Não contentes em malversar os recursos públicos a eles destinados pelo Fundo Partidário, esses partidos agora pretendem driblar sua responsabilidade atribuindo ao contribuinte a obrigação de lhes financiar a multa devida por seu péssimo comportamento. 

O argumento para tão espantosa demanda é que os partidos, em resumo, estão sem dinheiro. Desde que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o financiamento eleitoral não poderia mais ser feito por empresas, mas apenas por pessoas físicas, as agremiações partidárias vêm encontrando dificuldades para fechar suas contas. O dinheiro fácil das grandes companhias, que fez a alegria daqueles que transformaram a política em negócio, estava destruindo a essência da democracia – afinal, o cidadão nada podia, com seu voto, diante do imenso poder de persuasão das grandes empresas, especialmente das empreiteiras. Foi contra isso que agiu o Supremo, para impedir que os partidos se transformassem de vez em meras subsidiárias dessas empresas.

Perdidos diante dessa nova realidade, os partidos, em lugar de pensar em estratégias para convencer seus eleitores a financiá-los, continuam a torcer para que o erário lhes venha em socorro. Dizendo esperar que o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, tenha “sensibilidade para entender o momento”, o deputado Alex Manente (SP), da direção nacional do PPS, explicou que, em razão da crise econômica, “temos muita dificuldade para que filiados façam doações, mesmo que pequenas”. O presidente do DEM, senador José Agripino (RN), por sua vez, disse que “estabeleceu-se um impasse” e que, “se as multas forem pesadas, elas serão impagáveis”.

Para o deputado Lúcio Vieira Lima (BA), da Executiva Nacional do PMDB, a decisão do Supremo a respeito das doações para os partidos obriga a Justiça Eleitoral a mudar também as regras para o pagamento das multas. “Não foram os partidos que mudaram a regra, mas o STF. Logo, a regra para multas precisa mudar também. Se não temos recursos próprios, vamos pagar como? Não somos empresa, não temos receita própria”, disse Vieira Lima. Ora, esse dilema não existiria se, em primeiro lugar, os partidos não tivessem usado o dinheiro do Fundo Partidário para pagar jatinhos e caipirinhas, razão pela qual foram multados.
Para Vieira Lima, o Fundo Partidário “é a receita da democracia”. Com esse raciocínio, os deputados querem fazer acreditar que a democracia, em si, depende do Fundo Partidário, o que é um absurdo. O Fundo Partidário é essencialmente antidemocrático, pois obriga os contribuintes a colaborar para a manutenção de partidos com os quais não têm nenhuma afinidade. Esse fundo só existe porque os partidos são hoje incapazes de se apresentar como representantes do eleitor comum, do qual deveriam vir, por livre vontade, os recursos que lhes assegurassem a existência. Assim, em vez de lutarem para se tornar partidos políticos de verdade, as atuais agremiações empenham-se em encontrar maneiras cada vez mais criativas de manter sua relação de dependência com o dinheiro público.

É nesse contexto que surgiu também a ideia de um “Fundo Especial de Financiamento da Democracia”, incluída na proposta de reforma política relatada pelo deputado Vicente Cândido (PT-SP). “A democracia tem seu custo”, argumentou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Não há dúvida que a atividade partidária, especialmente as campanhas eleitorais, tem um custo, mas esse custo havia atingido um nível tal que não podia mais ser bancado senão com o dinheiro de empresas. Agora sem esses recursos, os partidos podem optar por fazer campanhas mais baratas e mais próximas dos eleitores, sem a caríssima infraestrutura marqueteira que foi paga com dinheiro sujo por diversos partidos. O que não podem é continuar a acreditar que, façam o que fizerem, serão sempre credores compulsórios dos cofres públicos.

Editorial Estadão