Adalberto Vera
Revista Ideias
Nunca antes na história deste país, para usar o mote preferido do ex-presidente Lula, houve uma queda de popularidade como a de Dilma Rousseff. Não há precedente de uma queda tão abrupta da popularidade de um presidente quanto a experimentada por Dilma Rousseff em apenas três semanas.
A velocidade da queda da popularidade da presidente Dilma tem sido 3 vezes mais rápida do que foi a vivida por Luiz Inácio Lula da Silva entre agosto e setembro de 2006, por causa do Mensalão. É 3,8 vezes mais intensa do que a de Fernando Collor após o confisco da poupança, e 4,5 vezes mais acelerada do que a de Fernando Henrique Cardoso após a desvalorização do real no começo de 1999.
Em nenhum período da história do Brasil desde março de 1986, quando há o primeiro registro de pesquisa de avaliação presidencial, um governante do País perdeu tantos pontos de popularidade em tão poucos dias. É um recorde.
Não significa que a presidente Dilma esteja tão impopular quanto tornou-se, por exemplo, FHC após desvalorizar o real, ou Sarney e Collor ao final de seus mandatos. Nem que sua queda foi maior que a deles. Dilma ainda tem saldo positivo de cinco pontos no Datafolha. Por outro lado, é cedo para saber se o mergulho de sua popularidade chegou ao fundo do poço. Só novas pesquisas dirão se a queda persiste.
A causa da queda recorde da popularidade de Dilma é econômica. Os protestos de rua serviram apenas para catalisar uma insatisfação mais profunda e que pode ser aferida pelo mergulho de outro indicador: o que mede a confiança do consumidor. O Inec (Índice Nacional de Expectativas do Consumidor) registrou em junho sua maior queda desde a crise de 2009.
Esse índice reflete um aumento do pessimismo dos brasileiros em relação à inflação, ao desemprego e ao poder de compra. O Inec mostra uma mudança da percepção das pessoas quanto ao que está acontecendo com sua renda pessoal e, pior para Dilma, quanto ao que elas acham que vai acontecer com a própria renda no futuro.
Percepção popular
Pois, pois, diz um analista experiente que é como se a percepção popular tivesse demorado seis meses para registrar o que mostravam os indicadores objetivos de desempenho da economia desde o final do ano passado. A pressão da economia sobre a opinião pública foi aumentando ao longo desse tempo e, como uma avalanche que cai de repente, acabou liberada de uma vez só pelos protestos de rua.
Mais do que os números, o problema de Dilma é a tendência que eles apontam. A presidente, que durante dois anos e meio se beneficiou da inércia positiva do fim do governo Lula, agora luta contra ela. O sentimento popular embutido nas pesquisas é um desejo de mudança – algo oposto ao que elegeu Dilma em 2010.
Pesquisa Datafolha para a eleição do próximo ano mostra que a intenção de voto na presidente Dilma Rousseff (PT) caiu 21 pontos em três semanas. Marina Silva, que tenta viabilizar o seu partido Rede Sustentabilidade, foi a que mais subiu: sete pontos. Aécio Neves (PSDB) cresceu três pontos e Eduardo Campos (PSB) oscilou um ponto para cima.
Nos dias 6 e 7 de junho, Dilma tinha 51% das intenções de voto e venceria a eleição presidencial no primeiro turno. Agora, ela tem 30% e disputaria o segundo turno com Marina, que passou de 16% para 23%, aponta o Datafolha. Aécio cresceu de 14% para 17% e permanece em terceiro. O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, passou de 6% para 7%.
A pesquisa eleitoral reflete a queda acentuada de popularidade da presidente após os protestos que tomaram as ruas do País. Outra pesquisa de opinião realizada pelo Datafolha mostra que a aprovação da presidente caiu quase pela metade após as manifestações, de 57% para 30%. O total dos que consideram a gestão da petista ruim ou péssima subiu de 9% para 25%. De 0 a 10, a nota média da administração Dilma caiu de 7,1 para 5,8.
A queda da popularidade de Dilma foi considerada pelo instituto a maior redução de aprovação de um presidente entre uma pesquisa e outra desde o plano econômico do ex-presidente Fernando Collor de Mello, em 1990, quando houve o confisco da poupança.
Nada a comentar
O Palácio do Planalto não comentou oficialmente a pesquisa Datafolha que mostrou queda de 27 pontos na popularidade de Dilma Rousseff, mas interlocutores da presidente avaliam que não há motivos para pânico. De acordo com eles, o levantamento foi feito durante o período dos protestos em diversas cidades e levou em consideração o emocional da população. A presidente Dilma almoçou domingo (30/06) com os ministros Aloizio Mercadante (Educação), Helena Chagas (Comunicação Social) e Paulo Bernardo (Comunicações).
Provável adversário da presidente Dilma Rousseff nas eleições de 2014, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) afirmou que a queda da popularidade da presidente mostrada na pesquisa Datafolha é um reflexo de uma insatisfação dos brasileiros com a classe política em geral. Num tom cauteloso, Aécio declarou, por meio de nota, que a população está reagindo à falta de respostas efetivas aos problemas enfrentados ao longo de anos e que o quadro deve ser analisado com humildade e responsabilidade por todos.
Líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (SP) disse que a queda na aprovação da presidente (a avaliação positiva do governo caiu 27 pontos) indica que chegou a hora de ela começar a governar. Já o presidente do PT, Rui Falcão, avalia que a popularidade poderá ser recuperada porque a população aprova as medidas que vêm sendo tomadas.
É incrível, inacreditável, mas o PT, antes de ser golpeado pela pesquisa Datafolha, parecia estar conseguindo verter a seu favor a repulsa das ruas aos seus métodos e modos.
Como em um passe de mágica, a marquetagem oficial transformou as manifestações de milhões contra governos, políticos, os péssimos serviços públicos e a corrupção em um plebiscito que ninguém pediu e que só serve à presidente Dilma Rousseff e ao seu partido.
Com treinada desfaçatez, dizem que a consulta popular para a reforma política atende ao clamor das ruas – uma voz muda que só o Planalto ouviu.
O arcabouço para convencer as ruas que elas querem o que elas não pediram foi montado com tal requinte que até a pisada na bola da presidente, que se embananou ao lançar uma inconstitucional Constituinte exclusiva, pouco atrapalhou.
Na versão corrigida, Dilma, em sua extrema bondade, reservou ao eleitor o papel de protagonista. Ele poderá indicar o que prefere entre cinco questões que não frequentam os ônibus abarrotados ou as filas do SUS que o sacrificam no dia a dia. Isso no prazo recorde de dois meses. Uma maravilha da democracia moderna.
Conchavos de gabinete
Como as ruas não são mais suas, o PT decidiu atrair a juventude aliada para os gabinetes. Na quarta-feira (26/06), o ex Lula reuniu-se com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, a União da Juventude Socialista, o Levante Popular da Juventude e o Conselho Nacional da Juventude.
No dia seguinte, a mídia governista estampou: “Lula assume papel decisivo na organização das manifestações em todo o país” (Correio do Brasil). Nem o Pravda faria melhor.
Na sexta-feira (28/06) foi a vez de Dilma recebê-las. Agregou ao grupo de Lula a Pastoral da Juventude, a Marcha das Vadias e as ex-combativas UNE e Ubes.
“Houve um consenso em torno da proposta de reforma política por meio de plebiscito”, disse a secretária nacional da Juventude Severine Macedo, como se esse fosse o eixo dos protestos que tomaram conta do País.
Como os blogueiros pagos deixaram Dilma e o PT na mão, o governo correu para anunciar uma plataforma virtual, apelidada de Observatório Participativo, a fim de marcar presença nas redes sociais. Dificilmente conseguirá êxito também nessa rede, mas garantirá mais alguns empregos para a turma aliada.
Todos reconhecem – PT, Dilma e seu marqueteiro de estimação também – que as manifestações passam longe de uma consulta popular sobre reforma política.
A voz das ruas exige transporte público de qualidade, saúde e educação no padrão Fifa. Reivindica o fora Renan Calheiros, cadeia para os mensaleiros. Quer a Papuda para calar corruptos. E o PT sabe disso. Por isso mesmo prefere enganá-la.
E a economia não vai bem, todos sabem. Ou melhor, sentem no bolso. Às voltas com inflação em alta, fuga de capitais e lentidão na realização de investimentos, o Brasil é o país que teve a segunda mais baixa variação do Produto Interno Bruto (PIB) entre as nações da América Latina no ano passado: apenas 0,9%, último entre os que apresentaram crescimento e à frente apenas do Paraguai, que apresentou queda de 1,2% no PIB em 2012. Os dados são da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) que fez um ranking com 20 países da região.
Além do PIB foram analisadas também as taxas de inflação desses países. A brasileira, de 5,8%, no ano passado, foi a sexta mais alta da região, abaixo de parceiros latinos como a Venezuela, a Argentina e o Uruguai, que em 2012 registraram taxas de 19,5%,10,8% e 7,5%, respectivamente.
Não muda o estilo
Num dos muitos encontros políticos do “pacto nacional” que prometera na TV dias antes, a presidente Dilma Rousseff aceitou receber para uma conversa, no Palácio do Planalto, os presidentes das principais centrais sindicais do País. Não houve papo. Dilma defendeu, por 40 minutos ininterruptos, a proposta que sacudira o Brasil nos últimos dias: uma reforma política com participação popular.
Em seguida, determinou que cada convidado teria apenas dez minutos para dizer o que pensava – mas nem tanto. Wágner Freitas, presidente da CUT, central ligada ao PT, queria falar. Até tentou, mas foi interrompido algumas vezes por Dilma.
No momento em que Dilma parecia hostilizar qualquer contribuição que destoasse do que ela, na verdade, já decidira, era inevitável para alguns dos presentes lembrar o pobre sindicalista Artur Henrique, ex-presidente da CUT. Em maio do ano passado, numa das raras vezes em que Dilma pediu a opinião dos sindicalistas para qualquer coisa, Henrique ousara criticar uma medida do governo. “Você está falando besteira, cala a boca!”, disse Dilma.
Desta vez, não houve grosseria. Mas sobrou rispidez – e constrangimento. No meio da reunião, um participante quis ir ao banheiro ao lado da sala, no 3° andar do Planalto. Um segurança aproximou-se, meio sem graça: “Amigo, não usa esse banheiro, vai no lá de baixo”. O sindicalista quis saber o porquê. “É que, quando dá descarga, a presidenta fica muito brava com o barulho”, disse o segurança.
À medida que a reunião transcorria, quando algum sindicalista ia ao banheiro, outro soltava a piada baixinho: “Ela vai meter o braço em você…”. Não demorou para que Dilma interrompesse a conversa. “Meu tempo acabou, meu tempo acabou, não dá mais para vocês falarem”, disse.
A reunião durara menos de duas horas. Os sindicalistas saíram do gabinete presidencial convencidos de que Dilma os despreza. Saíram, também, sem entusiasmo por qualquer pacto – e sem vontade de voltar. O estilo de governo e a personalidade de Dilma a afastaram do Congresso, das ruas e até do próprio PT. Sua reeleição está em risco?
Quem ganha com a queda de Dilma?
Dirigentes partidários e cientistas políticos estão prevendo uma grande renovação nas eleições de 2014. O sentimento que embalou os protestos afetará a todos. Mas os partidos sem identidade definida, marca reconhecida e militância sofrerão mais. A despeito da perplexidade geral, ficou claro que a rejeição aos governos, ao Legislativo e aos partidos é maior, e mais relevante, do que se imaginava.
Pela pesquisa, a presidente teria hoje 40% dos votos; a ex-senadora Marina Silva, 22%; o senador Aécio Neves, 20%; e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, 5%.
Mais uma vez, Marina surge como a grande beneficiária dos movimentos de contestação que ocorrem pelo País, pois, embora tenha sido senadora por 16 anos e fundadora do PT, ela não é percebida pela população como uma política profissional. Mas Marina tem também um lado evangélico que, segundo estudos recentes, foi decisivo na sua votação na campanha de 2010.
O professor Cesar Romero Jacob, diretor do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio, lançou recentemente o e-book Religião e Território no Brasil: 1991/2010, da Editora da PUC, trabalho que, ao analisar as transformações no perfil religioso da população brasileira, com o crescimento do número de evangélicos, pode ser útil para o entendimento do cenário eleitoral do ano que vem, considerando a participação crescente de pastores pentecostais na política.
Segundo Romero Jacob, o pluralismo religioso se consolidou no País, com a Igreja Católica perdendo 24 pontos percentuais. O número de católicos cai de 89% da população para 65% em 30 anos.
No mesmo período, os fiéis do conjunto de Igrejas Pentecostais passam de 3% da população, em 80, para 13% em 2010. “O Brasil deixou de ser um país de hegemonia católica para ser um país de maioria católica.”
Segundo o estudo, no Nordeste, em Minas Gerais e no Sul do Brasil, o percentual de católicos se mantém muito elevado, mas nas áreas de imigração para a fronteira agrícola e mineral do Centro-Oeste e Norte e na periferia das regiões metropolitanas os pentecostais crescem. “De um modo geral, diz Romero Jacob, nas áreas de expansão recente e, sobretudo, num certo caos social, o pentecostalismo se implantou.”
Essa seria a razão da participação de Marina Silva em cultos evangélicos para a coleta de assinaturas em apoio à criação do seu partido, a Rede, como seus militantes fizeram na Marcha para Jesus, em São Paulo.
Apesar de o livro se ater à questão religiosa, os mapas permitem algumas ilações políticas, uma vez que os pastores têm demonstrado certo controle sobre o eleitorado evangélico pentecostal.
Na política, na época da eleição de 2010, na análise de Romero Jacob, Marina conseguiu atrair os insatisfeitos com a campanha do Serra, os petistas insatisfeitos com os rumos do governo do PT, os evangélicos e até os verdes, que não têm uma expressão tão grande assim do ponto de vista eleitoral.
Mas o que parece agora, com dados novos, diz o professor da PUC, quando se analisa o mapa dos pentecostais e não determinados com o mapa da votação da Marina, “mesmo que não sejam exatamente iguais, têm pontos de contato muito nítidos”.
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