Cristina Rios, Gazeta do Povo
Sem alarde, o consórcio Dominó Holding, sócio privado da Sanepar, reduziu sua participação na empresa de água e saneamento do Paraná. Em uma operação concluída no fim do mês passado e que incluiu a saída dos fundos de pensão da holding, o grupo diminuiu de 30,2% para 12,16% sua presença no capital total da companhia. Do capital com direto a voto, a Dominó passou de 39,7% para 24,7% da Sanepar.
Com a mudança, o governo do estado aumentou ainda mais sua força na empresa, que já havia crescido com a renegociação do pacto de acionistas no ano passado. Sua participação no capital votante da Sanepar passou de 60% para 74,97%.
O negócio foi possível graças à troca de ações entre os sócios da Dominó. Foram convertidas 57,8 milhões de ações ordinárias em ações preferenciais (sem direito a voto), que foram distribuídas entre os acionistas, reduzindo o capital social da holding.
No novo arranjo, a Copel, que detinha 45% do capital da Dominó passou a ter 49%. A Andrade Gutierrez Concessões, que detinha 27,5%, assumiu o controle do consórcio, com 51%.
Fundos
Os fundos de pensão, representados pela Daleth Participações, que detinha 27,5% da Dominó – saíram do grupo e passaram a ter uma participação direta, com 8,3% do capital total da Sanepar. A Daleth reúne fundos de pensão de empresas públicas, como BNDES, Copel, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil, dentre outras.
Por estar em período de silêncio, devido a uma nova operação na Bolsa de Valores, a Sanepar não comenta a mudança. Mas fontes que acompanharam as negociações dizem que no futuro a tendência é que a Daleth seja desmembrada e cada fundo fique com sua cota isolada. A intenção é mirar o lançamento de ações que a empresa planeja fazer para aumentar seu capital. O objetivo é ter apenas ações preferenciais, de maior liquidez, e reduzir custos com as taxas de administração pagas à Daleth. Dessa forma, os fundos também ficariam livres para aumentar ou diminuir sua participação na estatal de saneamento no momento da emissão das ações.
Com a conversão das ações de ordinárias para preferenciais, a Copel também passou a ter uma participação direta na Sanepar de 7,63%, além da que possui via Dominó.
Administração
Apesar da modificação acionária, não deve haver nenhuma mudança na administração da companhia. A Dominó precisa ter pelo menos 10% do capital votante da Sanepar para garantir seus direitos no pacto de acionistas.
Essa é a segunda mudança envolvendo a relação do sócio privado e a Sanepar em menos de um ano. Em agosto do ano passado, um novo pacto de acionistas, que substituiu o de 1998, assinado pelo então governador Jaime Lerner, fez com que o grupo perdesse poder de veto nas decisões da empresa. A Dominó manteve o poder de indicar posições-chave na gestão da empresa, como os diretores superintendente, financeiro e de operações. Mas o diretor financeiro passou a ter que ser um funcionário de carreira da Sanepar e os nomes precisam ser aprovados pelo Conselho de Administração.
Novas ações serão lançadas até setembro
O aumento de capital da Sanepar, que será feito pelo lançamento de um novo lote de ações preferenciais (sem direito a voto) no mercado, deve ser realizado dentro de seis meses. Em março, a operação foi aprovada na Assembleia Legislativa. O projeto autoriza um aumento de capital da empresa para até R$ 4 bilhões. Hoje, está em R$ 2,5 bilhões.
Um dos objetivos é usar o montante captado para investir em projetos, principalmente na rede de esgoto. No ano passado, a empresa investiu, no total, R$ 800 milhões.
Observação
Nos bastidores, a empresa vem observando o mercado de ações para ver qual o melhor momento para lançar os papéis no mercado. Apesar da melhora nas últimas semanas, ainda pairam dúvidas sobre a recuperação do mercado acionário nos próximos meses. Embora exista o prazo de seis meses desde a decisão para lançar as ações, a empresa pode renovar o pedido junto à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e adiar o projeto para 2015.
Com o lançamento, a Sanepar passa a integrar o nível 2 de governança da Bovespa, que dá maior poder aos minoritários e coloca a empresa nas mesmas condições de acesso ao mercado de capitais de empresas como Sabesp (SP), Copasa (MG) e Copel.
No primeiro trimestre de 2014, a Sanepar obteve receita líquida de R$ 639,9 milhões, 15% mais do que no mesmo período do ano passado. O lucro líquido subiu 18,26%, para R$ 119,2 milhões na mesma base de comparação. A empresa reajustou sua tarifa em 6,9% no período.
Estado travou queda de braço com consórcio
A relação entre Sanepar e seu sócio privado foi marcada por turbulências, especialmente durante a gestão do ex-governador Roberto Requião. O acordo de acionistas entre o governo e a Dominó foi criado na gestão Jaime Lerner, em 1998. Na época, o consórcio privado passou a ter 39,7% do capital da Sanepar e tinha como acionistas o grupo francês Vivendi (atualmente Sanedo), a Andrade Gutierrez Concessões, a Opportunity Daleth e a Copel.
Quando Requião assumiu o governo, em 2003, a relação entre os sócios estremeceu. O então governador tentou de várias formas anular o poder do sócio privado. A primeira vez foi com o rompimento do acordo de acionistas. Sem sucesso, promoveu um aumento de capital, operação suspensa judicialmente. Em paralelo, promoveu o congelamento das tarifas de água e saneamento, o que desagradou aos sócios privados.
Justiça
A medida deu origem a um imbróglio judicial que envolveu, segundo estimativas, R$ 1 bilhão em pedidos de indenização da Dominó contra o governo. Em 2008, a Copel comprou a parte dos franceses, se tornando a principal acionista da Dominó, com 45%.
Em 2013, o governo Beto Richa e a Dominó celebraram um novo acordo de acionistas, que colocou fim às ações judiciais. E em abril desse ano, a saída dos fundos de pensão promoveu mais uma mudança na Dominó, que reduziu sua participação no capital da Sanepar.
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