O Globo
Na sessão do Congresso iniciada na noite desta terça-feira e que varou a madrugada desta quarta-feira, os parlamentares mantiveram vetos presidenciais para evitar forte impacto nas contas públicas, como o veto presidencial às mudanças no cálculo do fator previdenciário e o que garante isenção de PIS/Cofins para óleo diesel.
A mudança no fator previdenciário era um dos pontos que mais preocupava o governo já que, se derrubado, poderia aumentar as despesas do Regime Geral da Previdência Social em R$ 883 bilhões até 2050. Já as alterações sobre a tributação ao óleo diesel poderiam gerar um impacto de R$ 64,6 bilhões até 2019, segundo cálculos do Ministério do Planejamento.
O texto que flexibilizava o fator previdenciário, aprovado como emenda a uma das Medidas Provisórias do ajuste fiscal, estabelecia a regra “85/95”, que permite a aposentadoria integral quando a soma da idade e do tempo de contribuição atingir 85 no caso das mulheres ou 95 anos para os homens. Para compensar o veto, Dilma enviou ao Congresso uma Medida Provisória com uma regra de progressividade para o cálculo das aposentadorias, baseada na mudança de expectativa de vida.
O veto mais polêmico, ao reajuste do Poder Judiciário, ainda não foi analisado.
A manutenção dos vetos foi uma vitória para o governo, que até a segunda-feira tentava adiar a votação, temendo ser derrotado. Somente na manhã desta terça-feira o governo mudou sua estratégia de adiamento e decidiu enfrentar a questão no plenário à noite. Encorajada pela sinalização positiva da bancada do PMDB na Câmara e temendo uma piora no quadro que levou o dólar a disparar, Dilma entrou em campo pessoalmente para evitar uma derrota do governo e acionou seus ministros para que telefonassem aos parlamentares não só da base, mas também da oposição, apelando pela manutenção dos vetos.
Aos parlamentares com quem conversou, a presidente disse estar preocupada com a alta do dólar, que ontem passou de R$ 4, a maior cotação da história do Real. Disse também, segundo relatos feitos ao GLOBO, que tem preocupação com novos rebaixamentos do grau de investimento do Brasil por outras agências de risco. A alguns parlamentares, a presidente disse que a derrubada dos vetos causaria uma situação de extrema dificuldade para o país. Foram analisados 32 vetos. O rombo calculado pelo governo em caso de derrubada era de R$ 127,8 bilhões.
Segundo líderes aliados, que consideravam arriscada a votação, Dilma ligou para o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para dizer que o melhor seria enfrentar de uma vez a questão no Congresso. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), esteve com Dilma no início da tarde desta terça-feira e passou a defender a votação dos vetos presidenciais à noite. Mais cedo, antes do encontro com Dilma, Renan havia defendido o adiamento. Ele se reuniu com os líderes aliados e contava com a fidelidade dos senadores para manter os vetos mais importantes.
— Se houver uma maioria que desfaça qualquer possibilidade de desarrumar ainda mais a economia, acho que pode apreciar — afirmou.
A derrubada do veto ao aumento dos servidores do Judiciário causaria um rombo de R$ 36,2 bilhões em quatro anos. O reajuste médio é de 56%, mas pode chegar a 78,56% em alguns casos. Dilma chegou a telefonar para uma senadora da oposição, Ana Amélia (PP-RS), para pedir ajuda. Mas, acabou ouvindo um “não”. A senadora disse à presidente que havia assumido um compromisso com o Judiciário e que não seria coerente manter o veto ao aumento salarial para a categoria. Ana Amélia disse, porém, que poderia avaliar sua postura em relação aos demais vetos presidenciais.
A presidente argumentou, segundo relato de um senador que conversou com ela, que é preciso suspender a onda de notícias negativas e manter o veto ao projeto que reajustou os salários do Judiciário. Além da preocupação com a alta do dólar, a manutenção do veto, segundo Dilma, fará com que ela viaje aos Estados Unidos, amanhã, “mais tranquila”, e o governo consiga “respirar” em meio à crise.
O senador Blairo Maggi (PR-MT), um dos parlamentares que recebeu telefonema da presidente, chegou a aconselhá-la a trabalhar pelo adiamento da votação. O senador alertou Dilma de que o governo “estaria acabado” se perdesse a votação.
Ao longo do dia, ficou claro que a tendência dos parlamentares, tanto na base, quanto na oposição, era de manter os vetos. Pesou nos cálculos oposicionistas a perspectiva de poder em um futuro próximo e o tamanho do problema que o próximo governo poderia herdar com a derrubada dos vetos.
— Eu defendia antes que os vetos fossem derrubados para acabar logo com esse governo. Mas agora acho que o governo está tão perto de acabar, que estou achando melhor manter esses vetos para não comprometer quem vier depois — explicou um senador da oposição.
PMDB GARANTIU 45 VOTOS
Além do veto presidencial ao projeto que garante reajustes aos servidores do Judiciário, outros vetos também preocupavam o governo. Entre eles, o veto à extensão do reajuste do salário-mínimo a todos os benefícios do INSS, ou seja, aos aposentados e pensionistas; o que garante isenção de Imposto de Renda a professores para a compra de livros didáticos (impacto de R$ 16 milhões até 2019), entre outros.
A garantia da bancada do PMDB na Câmara de que ao menos 45 deputados do partido votariam a favor da manutenção dos vetos encorajou a presidente a defender a análise imediata. O apoio foi conseguido a partir do compromisso de Dilma de nomear dois deputados da bancada para a Esplanada dos Ministérios. O líder do partido, Leonardo Picciani (PMDB-RJ), que vai levar a Dilma hoje as indicações de nomes para compor o ministério no âmbito da reforma administrativa, deixou claro que as mudanças que estão sendo promovidas no governo servirão para conquistar os votos necessários para manter os vetos.
— É fundamental que a reforma ministerial sirva para isso. Ela está sendo feita com dois objetivos. O primeiro é cortar gastos. O segundo é reorganizar a correlação de forças dentro da base de apoio do governo — disse.
No início da tarde desta terça-feira, o líder do governo, José Guimarães (PT-CE), esteve com Leonardo Picciani para definir a manutenção da sessão. Até a noite de segunda-feira, líderes aliados contabilizavam apenas 200 dos 257 votos necessários para manter os vetos. Nenhum dos líderes arriscou dizer que o governo teria o número de votos suficientes para evitar a derrubada dos vetos, mas defenderam que o melhor neste momento é encerrar de uma vez a questão.
— É melhor vencermos logo essa agonia. Passamos por dias de muita instabilidade, o país não suporta mais aumento de despesas. Qualquer passo em falso pode agravar ainda mais a situação. Até com a oposição precisamos dialogar. É fundamental manter esses vetos. Prefiro que o Congresso seja chamado a essa reflexão de uma vez — afirmou Guimarães.
Os servidores do Judiciário pressionaram os parlamentares a derrubar os vetos. Um grupo de servidores, que conseguiu senha e acesso à Câmara, fez uma espécie de corredor polonês na entrada do plenário da Casa. Entre os mais festejados pelos manifestantes estavam os senadores Paulo Paim (PT-RS), Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e Ana Amélia (PP-RS).
Já no lado de fora do Congresso, servidores do Judiciário ocuparam o gramado em frente à Câmara com vuvuzelas, bastões e piscando luzes dos celulares. Por alguns momentos, foi aberta uma grande faixa com a inscrição “impeachment”, depois fechada.
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