Editorial, Folha de S. Paulo
Por ampla maioria de votos (59 a 21), o Senado decidiu, na madrugada de quarta-feira (10), dar prosseguimento ao processo de impeachment contra a presidente afastada Dilma Rousseff (PT).
Se a notícia, a esta altura, fica longe de constituir surpresa, não deixa de ser digno de nota o fato de o resultado nessa etapa —correspondente à chamada pronúncia da ré— já superar o necessário para que, em votação definitiva, seu impeachment seja consumado.
Com efeito, na sessão final do veredito, prevista para o fim deste mês, o mínimo exigido constitucionalmente para a perda do cargo presidencial é de 54 votos, ou dois terços do total de senadores.
Nos bastidores do Planalto, trabalhava-se para que 60 senadores se manifestassem desfavoravelmente à petista. O cômputo dos votos correspondeu à expectativa, verificando-se apenas a abstenção protocolar de Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente da Casa.
Frustram-se as últimas tentativas no campo de Dilma para, se não reverter, ao menos protelar um desfecho que se sabe inevitável. Eram nulas as chances de entrar em consideração, por exemplo, o pedido de novas diligências, diante das notícias de que, numa delação premiada ainda por homologar, constaria o nome de Michel Temer (PMDB), hoje presidente interino, como envolvido em negociações irregulares com a Odebrecht.
Por certo, uma vez selado o destino do esquema petista, novas atenções e suspeitas se voltam a setores e partidos antes na oposição. Seria contudo irrazoável, ademais de inútil, a intrusão de tais elementos no impeachment de Dilma.
Mais uma vez, registre-se que todos os meios de defesa, mesmo os mais desesperados, foram assegurados à presidente afastada. Prevaleceu, em todo caso, a portentosa dimensão política da crise.
Ao longo de seus anos de governo, Dilma Rousseff não apenas desprezou qualquer possibilidade de diálogo com o Legislativo, mas também foi responsável pela condução desastrosa da política econômica. A motivação inicial de implementar medidas de estímulo ao crescimento cedo se transformou em imprevidência orçamentária, com vistas à reeleição.
Numa espécie de chantagem ideológico-marqueteira, a campanha petista de 2014 acenava com os fantasmas da fome e do desemprego, caso saísse vencedor um adversário seu. Recessão, desemprego e inflação sobrevieram, entretanto, como consequência da irresponsabilidade fiscal anterior.
Uma tripla falência —econômica, política e moral— encerrou o ciclo petista. O impeachment segue seu curso, enquanto a capacidade do governo Temer para dar conta das próprias fragilidades ainda toma tempo para ser testada.
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