Editorial, Gazeta do Povo
Se confirmadas, denúncias de que depoentes da CPI da Petrobras tinham acesso antecipado às questões mostram que não há limites para o esforço de esconder a verdade sobre a estatal
A julgar por um vídeo a que teve acesso a revista Veja, estão chegando a um nível quase inacreditável as tentativas de impedir que o Brasil conheça os bastidores de negócios desastrosos da Petrobras, como a compra da refinaria de Pasadena, além de denúncias de superfaturamento na Refinaria Abreu e Lima, de pagamento de propina a funcionários da empresa e de falta de segurança em plataformas da estatal. A gravação, da qual foram divulgados alguns trechos, mostra uma reunião em que funcionários da Petrobras discutem perguntas e respostas dos depoimentos de figurões da empresa na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga a estatal no Senado. O teor do vídeo indica que não apenas os depoentes estariam tendo acesso antecipado às perguntas, como também estariam sendo orientados a combinar as respostas para evitar possíveis contradições.
A conversa envolve José Eduardo Barrocas, chefe do escritório da Petrobras em Brasília, e Bruno Ferreira, advogado da estatal. Um terceiro integrante, que a Veja não havia identificado, é Leonan Calderaro Filho, chefe do departamento jurídico do escritório da Petrobras em Brasília, segundo o jornal O Estado de S.Paulo. Os participantes da reunião ainda citam a presidente da Petrobras, Graça Foster; o ex-presidente da estatal José Sérgio Gabrielli; o ex-diretor Nestor Cerveró (que vem levando a culpa pelo relatório falho que teria induzido o Conselho de Administração a autorizar o negócio de Pasadena); o senador Delcídio Amaral (PT-MS); um assessor especial da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, Paulo Argenta; um assessor da liderança do PT, Carlos Hetzel; e um assessor da liderança do governo no Senado, Marcos Rogério.
O Estadão apurou que a reunião gravada ocorreu em uma sala que integra o gabinete de Graça Foster em Brasília. Segundo um funcionário da estatal entrevistado pelo jornal paulista, as perguntas seriam elaboradas por servidores do PT, e Barrocas seria o responsável por buscar o conteúdo na liderança do Senado. Depois disso, seria a vez de discutir as respostas – a gravação foi feita na véspera do depoimento de Cerveró.
A Petrobras, diante das denúncias, informou, em nota, que promovia “simulações de perguntas e respostas” baseando-se nos planos de trabalho das CPIs, publicados no site do Senado. De fato, é comum que pessoas que serão entrevistadas ou prestarão depoimento passem por tais sessões, em que seus advogados ou assessores preveem as questões que podem surgir e avaliam as respostas dadas, sugerindo correções para que o depoente ou entrevistado não se coloque em situações difíceis. Mas a transcrição da conversa sugere muito mais que isso: os participantes dizem acreditar que Cerveró já teria recebido as perguntas, discutem qual o meio mais seguro de enviá-las, se por fax ou e-mail, e falam até em um “gabarito” digitalizado e enviado para Graça Foster.
O governo fez o possível e o impossível para desmoralizar as CPIs da Petrobras. Foram manobras atrás de manobras, como as tentativas de bloquear sua instalação e, depois, de transformar a investigação em uma “CPI de Tudo”, incluindo nela temas completamente desconexos com o único propósito de atingir a oposição. Por fim, vendo como inevitável a criação das comissões, o governo decidiu aparelhá-las, sufocando a minoria oposicionista, colocando gente sua nos postos-chave e garantindo momentos vergonhosos, como o depoimento de Graça Foster à CPI mista, em que o relator Marco Maia (PT-PR) gastou três horas fazendo 139 perguntas absolutamente inofensivas à presidente da Petrobras. Se confirmadas, as denúncias de que os depoentes tinham acesso prévio às perguntas que seriam feitas na CPI mostram que o governo pode se portar de forma ainda mais baixa, realmente “fazendo o diabo”, na consagrada expressão da presidente Dilma Rousseff. Agir assim é desprezar instrumentos democráticos como a CPI, desprezar o próprio Congresso Nacional e desprezar todo o povo brasileiro, que tem o direito de saber como uma empresa que é patrimônio público está sendo levada ao buraco por uma administração inepta.
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