Pressionados pela grave crise fiscal, governadores cobram do Palácio do Planalto uma ajuda emergencial da União para terminar o ano e conseguir pagar o 13º salário dos servidores públicos. Pelo menos três estados — Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Rio Grande do Norte — estão com sérias dificuldades para honrar essas despesas. Outras unidades da federação também enfrentam problemas e já tiveram de atrasar ou parcelar salários nos últimos meses. As informações são de Martha Beck e Bárbara Nascimento n’O Globo.
É o caso, por exemplo, de Minas Gerais e do Distrito Federal. Um dos principais argumentos apresentados pelos governadores é que o não pagamento do benefício causaria uma onda de pessimismo no país, pois a gratificação contribui para movimentar a economia no fim do ano. Eles alegam que isso teria impacto negativo para os setores de comércio e serviços.
Integrantes da equipe econômica reconhecem o drama dos estados, mas afirmam que não há como colocar mais dinheiro nas mãos dos governadores, pois o problema é estrutural. Eles afirmam que o caminho a seguir é implementar programas de ajuste fiscal que reequilibrem as contas regionais. Os estados, por sua vez, rebatem que esse tipo de ação não resolverá as dificuldades até o fim de 2016.
Panorama das contas
As 22 medidas fiscais anunciadas pelo Rio de Janeiro na sexta-feira, como aumento da contribuição previdenciária de servidores, cortes de secretarias, cargos comissionados e programas sociais, por exemplo, começarão a ter efeito a partir de 2017. Segundo o secretário de Fazenda do estado, Gustavo Barbosa, o resultado desejado só virá a partir de 2022.
Técnicos da área econômica ouvidos pelo GLOBO elogiaram o pacote do governo fluminense e disseram que, pela primeira vez, o estado “está pagando o ônus político do ajuste”. Eles lembram que a União também está com problemas para fechar suas contas e que transferir recursos ou dar aval do Tesouro Nacional a mais empréstimos para governadores sem condições financeiras é “prejudicar o global em detrimento de alguns”.
SOLUÇÃO POLÍTICA NÃO ESTÁ DESCARTADA
Mesmo assim, interlocutores do governo federal afirmam que o Planalto está sensível às demandas e que “uma solução política não está descartada”. O formato dessa saída não está definido. As propostas dos governadores são as mais variadas. Um grupo defende até mesmo um socorro do BNDES para quem precisar de ajuda para quitar o 13º salário.
Uma dificuldade, porém, é que o banco de fomento não pode emprestar recursos para financiar despesas de custeio. A ideia é que os empréstimos do BNDES fossem usados para pagar despesas de capital (como a dívida externa tomada para investimentos) e, assim, desonerar os tesouros estaduais para pagar os servidores. Seria uma nova edição do Programa Especial de Financiamento (PEF), mecanismo usado em 2009 e 2011 para socorrer estados.
Procurado, o BNDES disse desconhecer qualquer solicitação nesse sentido, mas afirmou que, como órgão de governo, está aberto a estudar alguma solução, “desde que inserida na política econômica global do governo”.
No Rio Grande do Sul, um dos lugares onde a penúria fiscal é mais grave, os salários vêm sendo parcelados desde fevereiro, e não se sabe como será possível pagar o 13º salário — que tem um custo de R$ 1,3 bilhão. De acordo com a Secretaria de Fazenda gaúcha, o estado vem buscando saídas para reforçar o caixa e pede à União um ressarcimento por investimentos realizados em rodovias há quase 30 anos, o que poderia render R$ 2 bilhões.
O Rio também tem um sério problema de curto prazo no pagamento dos salários. No estado, houve mudanças no calendário de pagamento dos servidores por causa da falta de receitas. Mesmo assim, houve atrasos a partir de junho, o que levou a um arresto nas contas do estado. Segundo a Secretaria de Fazenda do Rio, neste momento, os servidores do Executivo estão recebendo de acordo com o calendário, mas não houve dinheiro no Orçamento para pagar os salários do Judiciário.
No caso do 13º, o governo está fazendo uma análise para saber como quitar a conta. O Rio só conseguiu pagar a segunda parcela do 13º dos servidores relativa a 2015 no primeiro semestre de 2016. O pagamento foi dividido em cinco vezes. As despesas com salários somam R$ 2,1 bilhões por mês. Ainda assim, o secretário da Fazenda do estado, Gustavo Barbosa, diz que não há intenção de pedir empréstimo ao BNDES para equacionar a crise. Ele lembra que o Rio não pode contratar novas linhas de crédito porque desrespeitou o limite de endividamento previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal.
No Rio Grande do Norte, há atrasos nos salários, e o secretário de Fazenda do estado, André Horta, afirmou que o 13º depende de quanto será repassado aos governos regionais pelo programa de repatriação de recursos e de receitas adicionais que estão sendo buscadas. Ele explicou que a frustração de receitas no Rio Grande do Norte chega a R$ 800 milhões, sendo que a repatriação deve render R$ 300 milhões. Ou seja, ainda ficam faltando R$ 500 milhões para fechar as contas.
A repatriação, que rendeu R$ 50,9 bilhões à União, será partilhada com estados e municípios. A equipe econômica alega que apenas o que foi obtido com Imposto de Renda (IR) deve ser dividido, o que equivale a R$ 12,7 bilhões. No entanto, 12 estados procuraram o STF para pedir que o valor arrecadado com a multa também seja dividido com os governadores.
Em Minas Gerais, outro estado com sérias dificuldades fiscais, os salários superiores a R$ 3.000 que equivalem a 25% dos funcionários, têm sido parcelados desde fevereiro. Em relação ao 13º, o estado só deve anunciar no fim deste mês a forma de pagamento deste compromisso.
ESPÍRITO SANTO: PAGAMENTO DILUÍDO NO ANO
O Distrito Federal informou que não há salários atrasados, mas que a conta do 13º vai depender da arrecadação até o fim do ano. “O fluxo de caixa capaz de garantir o cumprimento dessas obrigações da forma como ocorreu nos meses anteriores depende do comportamento da arrecadação daqui para frente”, informou a Secretaria de Fazenda do Distrito Federal. A secretária de Planejamento do Distrito Federal, Leany Lemos, afirma que o governo local fez um duro programa de ajuste fiscal ao longo de 2015, o que incluiu a redução de secretarias e o corte de 4.000 cargos comissionados. Mesmo assim, o déficit fiscal no ano passado foi de R$ 2,5 bilhões e está estimado em R$ 1,4 bilhão para 2016.
Já a Secretaria de Fazenda da Bahia informou que os salários estão em dia, mas que há um desafio para assegurar, a cada mês, a regularidade dos pagamentos. O estado já deixou de receber só este ano, do Fundo de Participação dos Estados (FPE), cerca de R$ 520 milhões. Este valor se soma a R$ 1,05 bilhão em perdas com o FPE no período 2013-2015.
“Apesar dos esforços para compensar essas perdas com a arrecadação própria e o controle dos gastos e de estar entre as unidades que vêm mantendo em dia o pagamento de servidores e fornecedores, o governo baiano não está imune aos problemas que vêm ocorrendo em outros estados”, informou a secretaria baiana.
Os estados de Santa Catarina, Pará e Espírito Santo garantem que têm pago a folha em dia e que conseguirão honrar o 13º sem a necessidade de parcelamentos. No caso do estado do Sul, metade desta folha (de aproximadamente R$ 780 milhões) foi antecipada em julho. Todos eles, no entanto, reforçam que estão com o caixa apertado e que só conseguirão pagar a conta porque fizeram um esforço de contenção de gastos ao longo do ano.
O secretário da Fazenda do Espírito Santo, Paulo Roberto Ferreira, explica que o estado paga o 13º salário na data de aniversário do servidor, o que dilui o pagamento. Fica acumulada em dezembro apenas a parcela que envolve comissionados, temporários e servidores que ingressaram no ano corrente, estimada em R$ 44 milhões (10% da folha).
— O cobertor está curto. A questão é que fizemos o dever de casa e, por isso, vamos conseguir pagar os salários em dia. O ano de 2016, pelo menos, está equacionado — disse o secretário.
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