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Casuísmo na segurança pública

“Os argumentos usados pelo ministro da Justiça para negar a cessão do delegado federal José Alberto Iegas à Secretaria de Estado da Segurança Pública não se sustentam” – trecho do editorial de hoje da Gazeta do Povo. Leia a seguir a sua íntegra.

Casuísmo na segurança pública

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, decidiu não permitir a liberação de José Alberto Iegas, chamado pelo governador Beto Richa para assumir a Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp). Iegas ocupa atualmente o cargo de diretor nacional de Inteligência da Polícia Federal (PF), e por isso precisaria de autorização do ministro para ser empossado no novo posto. A medida de Cardozo surpreendeu o governo estadual e contrariou inclusive uma informação dada pelo próprio Ministério da Justiça, que na manhã de segunda-feira havia dito à RPCTV que não havia obstáculo nenhum à posse de Iegas, bastando apenas a publicação da nomeação no Diário Oficial do Estado. Infelizmente, todas as circunstâncias que envolvem o caso – desde as alegações dadas por Cardozo a Richa até os precedentes abertos por situações semelhantes – permitem considerar a hipótese de que circunstâncias políticas tenham influenciado a decisão em relação ao Paraná.

A legislação, é verdade, não obriga o Ministério da Justiça a ceder quadros da Polícia Federal para ocupar cargos nas administrações estaduais; esta é uma prerrogativa do ministro. Mas, conforme a Gazeta do Povo mostrou em sua edição de ontem, outros 11 estados têm delegados da PF exercendo atualmente a função de secretários de Segurança Pública, como o Rio de Janeiro. Além disso, em ocasiões anteriores outros secretários estaduais e municipais foram cedidos pelo governo federal sem problemas, como os delegados federais Reinaldo de Almeida César Sobrinho (titular da Sesp entre 2011 e 2012) e Fernando Francischini (secretário Antidrogas de Curitiba entre 2008 e 2010). Ora, se a cessão foi feita em todos esses casos, por que negá-la justamente agora? É preciso haver isonomia na relação entre o governo federal e os estados.

Richa ainda contou à Gazeta do Povo que Cardozo mencionou uma “quarentena” para permitir a transferência de Iegas da PF para a Sesp, mas não citou prazos. O que existe, e está determinado pela legislação (no caso, a Lei 12.813/2013), é um período de seis meses entre o desligamento de um servidor federal de alto escalão e sua admissão na iniciativa privada. A quarentena, nesses casos, é importante para evitar que um funcionário leve informações privilegiadas que serão úteis a seu novo empregador – pensemos, por exemplo, no caso do ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles, que precisou passar por um ano de quarentena após deixar o BC, e ao sair dela assumiu a presidência do Conselho de Administração da holding que controla o frigorífico JBS. No entanto, a exigência de quarentena se aplica apenas à iniciativa privada, e não à administração pública. Alegar que Iegas precisaria passar pela quarentena por ser da área de Inteligência, como afirmou à Gazeta a senadora Gleisi Hoffmann, citando Cardozo, não faz o menor sentido. Que o governo do Paraná procure contar com a expertise de Iegas no ramo da segurança pública em nada prejudica a União.

O caso paranaense, no entanto, não é o primeiro envolvendo o ministro da Justiça e governos estaduais de oposição ao PT. Cardozo é um crítico frequente do governo de São Paulo (que, assim como o governo paranaense, nunca foi ocupado pelo PT e também é almejado nas próximas eleições). Em outubro de 2012, quando houve um surto de violência em São Paulo, ordenado de dentro de presídios, Cardozo afirmou que a Secretaria de Segurança Pública paulista havia rejeitado ajuda federal para lidar com a situação, embora o governo paulista tivesse enviado um ofício a Cardozo em junho daquele ano. Os ataques do ministro ao governo paulista se repetiram em 2013, durante as manifestações de junho.

É a segurança do paranaense que está em jogo, e a recusa do ministro da Justiça coloca cálculos eleitorais à frente dos interesses do cidadão. Iegas não apenas é qualificado para o posto, como também é um nome de consenso, apoiado pelas polícias e pelo Sindicato dos Delegados Federais no Paraná. Por isso, Richa tem razão em insistir no nome. Se Cardozo quiser seguir resistindo com os argumentos pouco convincentes apresentados até agora, deixará claro que, ao ignorar a isonomia, está apenas apelando ao casuísmo.