Brasil quer antecipar pagamentos de Itaipu para ajudar o Paraguai
Objetivo é atenuar a crise no Paraguai e tentar convencer o governo a desistir da ideia de mexer no Tratado de Itaipu
Christiane Samarco e Denise Chrispim Marin
Estado de S. Paulo
A uma semana da visita oficial ao País do presidente paraguaio, Fernando Lugo, o governo brasileiro prepara um pacote de ajuda para tentar demover o vizinho da ideia de mexer no Tratado de Itaipu. Pela principal medida em estudo, o Brasil ajudaria a reforçar o caixa do governo paraguaio, antecipando a compra da energia excedente da usina hidrelétrica. Essa proposta, na visão de setores do Planalto, pode evitar o aprofundamento da crise política paraguaia.
A oferta não contempla a demanda do Paraguai de reajuste de preço e de mudança no Tratado de Itaipu, mas tem como vantagem imediata a geração de receita suficiente para o governo paraguaio aplicar em programas sociais que possam, em curto prazo, contornar a atual debilidade política da gestão de Lugo.
O pacote de ajuda será apresentado a Lugo durante sua visita de Estado, no dia 7 de maio. Uma outra proposta está em estudo e vai ser discutida em uma reunião técnica no próximo dia 5, em Brasília: fazer uma elevação substancial no pagamento adicional pela energia cedida pelo Paraguai. Em janeiro passado, o Brasil propôs a duplicação do valor – dos atuais US$ 105 milhões para US$ 215 milhões ao ano. Na ocasião, o Paraguai desconsiderou a oferta.
Além desses recursos emergenciais, o governo brasileiro insistirá em sua oferta de janeiro, orientada para projetos de infraestrutura e de desenvolvimento econômico do país vizinho. Esse pacote envolve a criação de um fundo binacional para alavancar programas no Paraguai e a abertura de uma linha de US$ 1 bilhão no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para financiar obras, entre as quais a construção das pontes entre Porto Murtinho (MS) e Canelo Peralta e entre Foz do Iguaçu e Presidente Franco. Também consta do pacote a linha de transmissão da energia de Itaipu a Assunção, obra de cerca de US$ 450 milhões, e mais 13 projetos de cooperação brasileira no país vizinho.
O Paraguai rejeitou todo esse pacote, no último dia 30 de março, por meio de nota endereçada ao Itamaraty. Esse rechaço à oferta brasileira deu-se oito dias antes de o escândalo da paternidade de Lugo vir à tona e abalar a sustentação política de seu governo. Colaboradores do presidente Lula avaliam que, na próxima semana, Lugo desembarcará em Brasília suficientemente enfraquecido para acolher uma proposta melhorada do governo brasileiro, mesmo que distante de sua demanda maximalista.
No Planalto e na base aliada, avalia-se que Lugo não pode mais tocar seu governo com base em discursos ideológicos e precisa mostrar resultados de gestão para o eleitorado. A arrogância paraguaia, que marcou as negociações anteriores com o Brasil, deverá desaparecer. Mesmo assim, auxiliares de Lula temem que prevaleça a noção de política exterior vinculada à hegemonia da esquerda na América do Sul, defendida por Marco Aurélio Garcia, assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais, e uma avaliação mais catastrófica do cenário político paraguaio, respaldada pelo Itamaraty. Tais linhas, advertem esses políticos, poderiam levar o governo brasileiro a ceder mais do que deveria ao Paraguai.
Nas três rodadas de negociação que ocorreram desde a posse de Lugo, em agosto de 2008, o Paraguai insistiu na reabertura do Tratado de Itaipu, para acabar com a cláusula que obriga o país a despejar a energia que não utiliza no sistema brasileiro. A alegação de Assunção se baseia na possível venda de eletricidade à Argentina e ao Chile, a preços de mercado – apesar da inexistência de rede de transmissão para esses vizinhos. Nas quatro rodadas, a resposta brasileira foi negativa. Uma virada nessa posição tenderá a gerar um estresse entre o governo e o Congresso – até mesmo com a base aliada, como indicou o senador Aloizio Mercadante (PT-SP), presidente da representação brasileira no Parlamento do Mercosul.
"O caminho racional é sermos parceiros. Mas o Tratado de Itaipu é inegociável", afirmou o senador. "Mesmo que o governo quisesse, e não o quer, não há possibilidade de repactuar o Tratado porque o Congresso não aprovaria."
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