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Brasiguaios não devem ter medo, diz Lugo

Brasiguaios não devem ter medo, diz Lugo

Favorito na disputa presidencial no Paraguai, ex-bispo de esquerda traz discurso moderado para encontro com Lula hoje

Candidato diz que ameaças contra produtores rurais brasileiros são intriga e que questão de Itaipu só será tratada após as eleições

FÁBIO VICTOR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O Fernando Lugo que chega hoje a Brasília para se encontrar com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva é um candidato de discurso mais moderado do que aquele que tem se apresentado como um esquerdista determinado a confrontar o "imperialismo brasileiro". Em entrevista à Folha, o ex-bispo católico paraguaio, favorito nas eleições do próximo dia 20, revela cautela ao falar sobre a revisão do Tratado de Itaipu (sua campanha defende que o Brasil pague mais pela energia que compra do vizinho e sócio) e promete que não vai expropriar terras dos "brasiguaios", hipótese defendida por integrantes da megacoalizaão de 20 movimentos e partidos que lhe sustenta, a APC (sigla em espanhol para Aliança Patriótica para a Mudança). Ele falou à Folha por telefone anteontem à noite.

FOLHA – Qual o objetivo central de sua visita ao Brasil?
FERNANDO LUGO –
Já visitamos outros países da região e solicitamos também um encontro com o presidente do Brasil, pois queremos ter uma visão do Mercosul em perspectiva. Agradecemos a gentileza do presidente Lula, que se dignou a nos receber, e vamos a um encontro em primeiro lugar de cortesia, de conhecimento, sem uma agenda própria. Para trocar idéias, mas sobretudo como candidato, pois é isso que sou.

FOLHA – Um boletim de sua campanha disse que o sr. viria lembrar a Lula da "dívida histórica" do Brasil com o Paraguai. Poderia explicar?
LUGO –
Não, não, já disse que vamos sem agenda, que vamos abertos. Não somos chefes de Estado e não temos possibilidade de definir agenda ou falar de dívida histórica.

FOLHA – Ainda que não trate disso com Lula, é um tema de campanha. O que diz, como candidato, sobre a dívida histórica?
LUGO –
Quando estivemos na Argentina e no Uruguai, políticos reconheceram que há uma dívida histórica com o Paraguai. O mesmo disseram alguns intelectuais brasileiros, como [o escritor Júlio José] Chiavenato [autor de "Genocídio Americano – A Guerra do Paraguai"] e [o sociólogo] Emir Sader, que estiveram aqui no Paraguai num simpósio. Que há uma dívida histórica da guerra da Tríplice Aliança [Guerra do Paraguai, 1864-1870], quando três países se uniram quase para fazer o Paraguai desaparecer do mapa. Essa é a dívida histórica, que a Argentina, inclusive o presidente Kirchner, admitiu. Mas não quero nem recordar, quero olhar para o futuro.

FOLHA – O tema Itaipu será abordado na visita?
LUGO –
Volto a repetir: eu vou como um cidadão paraguaio candidato a presidente, não tenho intenção de colocar uma agenda. Agora, quando formos governo, aí sim, será outro status, como chefe de governo poderemos fazer uma agenda sobre temas que tocam ao Mercosul e ao Paraguai.

FOLHA – Caso o sr. seja vitorioso e volte como chefe de Estado: sua campanha fala na revisão do preço que o Brasil paga pela energia de Itaipu não-usada pelo Paraguai, e o Brasil diz que não há o que negociar. Como resolver esse impasse?
LUGO –
É um tema que não podemos tratar pelo telefone. Isso merece sentarmos com técnicos, juristas e políticos/diplomatas, porque cremos que há razões jurídicas, políticas e técnicas a serem postas na mesa para uma discussão.

FOLHA – Outra questão polêmica é a dos milhares de brasileiros que vivem no país, os "brasiguaios". Os produtores rurais temem que uma vitória sua resulte em expropriação. O que o sr. tem a lhes dizer?
LUGO –
É um medo infundado, sem nenhuma argumentação. Os brasiguaios terão todas as garantias de meu governo de permanecer no Paraguai com suas terras, pois a experiência histórica já lhes garante isso. Trata-se de uma propaganda do Partido Colorado, então metem medo nos chamados brasiguaios -que são só chamados, porque já são paraguaios, têm filhos e raízes aqui.

FOLHA – Qual a participação do governador Roberto Requião (Paraná) em sua campanha?
LUGO –
Nenhuma.

FOLHA – O secretário [de Comunicação de Requião] Aírton Pissetti participa da campanha?
LUGO –
Com algumas idéias e sugestões, a título pessoal.

FOLHA – Mas houve contribuição financeira de Requião?
LUGO –
Absolutamente negativo. Nem um cruzeiro [risos].

FOLHA – O PT intermediou sua visita ao Brasil. Qual…
LUGO –
[Interrompendo] Não, nós fizemos a solicitação através da Embaixada do Brasil.

FOLHA – Um integrante de sua campanha disse que foi por meio de Valter Pomar, secretário de relações internacionais do PT…
LUGO –
Valter Pomar esteve no fórum onde estiveram Chiavenato e Sader. Mas fizemos os trâmites através da embaixada.

FOLHA – Qual o papel do PT e de movimentos como o MST na sua campanha?
LUGO –
Dentro da coligação há 20 organizações sociais, de camponeses, trabalhadores, nove partidos políticos, da direita à esquerda. Alguns movimentos da APC têm relação com o PT ou com o MST, mas não a campanha.

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